Arquivo | 21-12-2011 11:39

Começou como empregado e hoje é o patrão

Começou como empregado e hoje é o patrão

Aos 60 anos o electricista de automóveis Manuel Martins, de Vila Franca de Xira, é o patrão de si próprio. Mas já houve um tempo em que trabalhava para os outros a ganhar oito escudos por mês - cerca de 4 cêntimos. Sempre adorou automóveis e hoje não se consegue separar deles.

Filipe MatiasA vida profissional de Manuel Gonçalves Martins, 60 anos, sempre esteve ligada à mecânica e à electricidade automóvel. Começou como empregado e hoje chegou ao estatuto de patrão, nada que o seduza. A sua verdadeira paixão é pelos carros e é neles que adora trabalhar. A sua profissão de sonho era ter sido mecânico, por isso considera um privilégio ser uma pessoa que faz aquilo que gosta.Nasceu em 1951 no concelho de Ourém e viveu até aos oito anos na aldeia do Reguengo, em Valada, concelho do Cartaxo. Aos oito anos veio viver para Vila Franca de Xira onde o pai era caseiro na Quinta do Paliarte. A chegada a Vila Franca foi encarada como uma aventura mas logo na escola primária surgiram problemas. A professora, que dava aulas perto do palácio do Farrobo, ia a pé todos os dias entre o centro da cidade e a escola, tomando percursos inclinados e alguns carreiros onde, de Inverno, a lama dificultava a passagem. “Para que os filhos da professora não se enlameassem para chegar à escola ela pedia aos alunos que os fossem buscar lá abaixo a Vila Franca e a trouxessem às cavalitas para a escola. Um dia recusei-me e desde esse dia ela marginalizou-me”, critica.Manuel Martins, dono de uma oficina de reparações eléctricas em automóveis em Vila Franca, começou a trabalhar aos 13 anos numa oficina da cidade, próxima da residencial Flora. “Naquele tempo eu queria ser mecânico e fui atrás desse objectivo. O meu pai foi lá pedir trabalho. Comecei por varrer a oficina mas ao fim de pouco tempo já tinha aprendido a cravar calços de travão. Fazia aquilo sozinho e ganhava uns 8 escudos por mês (4 cêntimos)”, recorda. Ao fim de pouco tempo o pai colocou-o numa oficina maior, em Alhandra, que prestava serviço, entre outros, à Companhia das Lezírias.“Entretanto arranjei lá um inimigo, uma pessoa que ganhou ciúmes à minha pessoa e um dia escondeu-me uma chave que eu precisava de usar para tirar um radiador de um Vauxhall Viva. Enquanto eu discutia com ele para me devolver a chave, aparece o filho do patrão. Quando eu estava a explicar o que tinha acontecido ele atira-me com a chave para me agredir. Eu desviei-me e lancei-lhe um martelo que tinha na mão. Nisto aparece o patrão e despediu-nos aos dois”, recorda.No mesmo dia, sem trabalho, Manuel Martins agarrou na bicicleta e, com 14 anos, pediu emprego noutra oficina de Vila Franca, a Progresso, onde passou a ganhar 15 escudos por dia (7 cêntimos). “Não só tinha sido despedido como depois ainda fui ganhar mais”, ironiza. Chegou a ajudante de reparação de bombas injectoras. O mundo dos automóveis deu uma reviravolta com a guerra do Ultramar. O pai de Manuel Martins usou uma cunha para colocar o filho nas Oficinas Gerais de Material Aeronáutico (OGMA) em Alverca e, com isso, fazê-lo evitar a guerra. Mesmo assim ainda fez uma comissão na Guiné onde passou uns meses a reparar viaturas da Força Aérea. Entrou em 1965 nas OGMA e saiu em 1975. Prestou serviço na área da electricidade de automóveis. “Era uma escola espectacular, as pessoas só não aprendiam nas oficinas se não quisessem. Houve gente como eu que saiu das oficinas com grandes conhecimentos”, revela.Como se ganhava pouco nas oficinas e Manuel já fazia uns biscates de electricidade de automóveis fora das OGMA lembrou-se de, com um familiar, montar um negócio próprio, que durou 7 anos. Em 1983 abriu por sua conta e risco a oficina que ainda hoje mantém. “Já cheguei a ter três empregados só que as coisas começaram a modificar-se e eles tiveram de ir embora. Somos amigos ainda hoje, sempre tivemos um bom relacionamento. Cada um deles tinha a chave da oficina e vinham cá quando queriam. Fui de empregado a patrão e hoje sou as duas coisas. Acho que ser empregado é bom porque não há preocupações, sobretudo com os ordenados”, defende.Para os jovens que hoje procuram trabalho Manuel Martins sugere força e determinação. “Não desistam e não desmoralizem. Infelizmente a maioria preocupa-se mais com o que vai receber do que com aquilo que vai fazer. Ninguém vem aqui a querer aprender, hoje em dia querem trabalhar e saber quanto posso pagar ao fim do mês”, lamenta.

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