Opinião | 23-06-2010 16:35

Saramago e a loucura

Tenho fascínio pelo mundo secreto dos escritores e artistas em geral. Talvez por isso gosto, acima de tudo, de ler biografias muito mais do qualquer outro género literário. As biografias e os diários dão-nos a dimensão do ser humano ao mesmo tempo que nos revelam o artista. Em duas ou três centenas de páginas há quem nos revele de forma magistral aquilo que foi uma vida de 70 ou 80 anos. Sabendo que a vida está cheia de eternidades, quando se vivem as grandes alegrias e as grandes depressões, poder ter a história de uma vida num livro ou num filme é um dos milagres que eu mais agradeço.Quem um dia escrever a biografia romanceada de José Saramago terá mais material do que todos aqueles que, até agora, escreveram a biografia de outros grandes artistas que tiveram, como Saramago, a arte de construir uma Obra e a sorte de viverem muito tempo para a poderem consolidar junto do público e, em muitos casos, a poderem reescrever.O caso de José Saramago, que deu à literatura portuguesa o único Nobel, é um bom exemplo daquilo que vale a união entre dois povos. Em Espanha Saramago é tão lido como em Portugal. A sua morte foi tão sentida como em Portugal. Quem um dia escrever a sua história vai ter que falar da criança pobre que nasceu num pequeno povoado junto ao Tejo, num lugar onde “a terra é plana, lisa como a palma da mão”, e que a meio da vida conseguiu o que até hoje nenhum português havia conseguido: conquistar a Espanha e os espanhóis que foram sem sombra de dúvida os principais responsáveis pelo facto de Saramago ter chegado ao Nobel.José Saramago deixou aos seus leitores, aos estudioso da sua Obra e principalmente aos admiradores que o vão querer continuar a venerar, uma autêntica mina de ouro. Até na hora da sua morte Saramago consegui pôr o Vaticano a dizer que ele era um escritor maldito. Como toda a gente sabe os grandes génios da humanidade foram sempre condenados, em vida ou na hora da sua morte, como malditos ou loucos. Saramago não enlouqueceu mas soube lidar bem com a loucura daqueles que não foram tolerantes o suficiente para aceitarem a sua Obra e a influência que ela teve, e vai continuar a ter, nos espíritos maus cultos de todas as nações modernas e civilizadas.

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