Opinião | 27-02-2016 02:39

Tradição à mesa

“Cada vez mais todas as iniciativas que integrem e valorizem as tradições têm enorme aceitação e valor, pelo que, muito para além do comércio local, o comércio internacional deste tipo de produções têm-se revelado bastante promissor e pleno de potencialidades”

Quando vamos às compras em Santarém, Évora ou Lisboa todos compramos o mesmo. E em Milão, Cáceres ou Madrid não é muito diferente. Outro indicador é olhar para os caixotes do lixo de várias cidades: o lixo produzido é igual. Assistimos a uma globalização do consumo a vários níveis. À medida que os países da UE (e não só) convergem (não se sabe para onde), também os seus hábitos alimentares, a dieta e os padrões de consumo tendem a uniformizar-se. Todos (ou quase) entrámos no trilho do consumo global, dos produtos globais. Será que se perdeu a identidade? Estamos condenados a este caminho?

Todavia, felizmente, os consumidores, cada vez mais bem informados, começam a rejeitar este tipo de opção. Assim, os mercados alimentares dos países economicamente desenvolvidos estão a tornar-se cada vez mais segmentados e o próprio ato de compra converteu-se num ato cultural, cada vez mais exigente, refletindo uma crescente procura de singularização, especificidade e individualidade por parte do consumidor. Neste caso, perante um panorama de produtos lineares perfeitamente ordenados e homogeneizados do supermercado, o que pode fazer a diferença?

Nos produtos alimentares a diferença traduz-se em termos de qualidade. O que verdadeiramente pode fazer a diferença é uma maçã a saber realmente a maçã, um peixe que vem realmente do mar, uma sopa cujos legumes não foram pré-congelados, pré-cozidos e depois liofilizados, um enchido de porco que se alimentou de bolota ou um queijo feito de leite real em vez de um líquido branco dito pasteurizado. Todos percebem ao que me estou a referir e todos estão, cada vez mais, inconformados e recetivos a outro tipo de oferta.

Os atributos que conferem a esses produtos a dita qualidade repousam elementar e fundamentalmente na sua origem, tipicidade e genuinidade da produção; por isso se denominam por produtos alimentares tradicionais. Nesta categoria incluem-se quer os produtos totalmente artesanais, quer os produtos chamados certificados, que cumprem uma rigorosa regulamentação de produção, para que, num processo produtivo já semi-industrializado, se verifiquem as normas que vão conferir e manter a especificidade e características tradicionais. O produto tradicional representa a interface de contacto com uma ambiência humana e culturais ainda genuínas, a proximidade da natureza, a qualidade ambiental e a ruralidade em si. Já se pensou, seriamente, quanto vale tudo isto?

O conhecimento de todos estes pressupostos contribui para uma maior diversificação do consumo alimentar e adquire maior expressão quanto maior é o mercado. Cada vez mais todas as iniciativas que integrem e valorizem as tradições têm enorme aceitação e valor, pelo que, muito para além do comércio local, o comércio internacional deste tipo de produções têm-se revelado bastante promissor e pleno de potencialidades, desde que o produtor saiba responder ao leque de exigências específicas que se colocam neste sector de produção. Muito as nossas terras podem beneficiar se responderem afirmativamente a esta tendência.

Carlos A. Cupeto

Prof. Universidade de Évora

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