Opinião | 30-05-2019 15:00

Última Página: Deus, a Igreja e as mãos do diabo

Um padre ralha do cima do altar contra a pobreza e o Estado corrupto, mas depois reza umas missas pelos que morreram nos últimos dias e recebe os euros com as mãos do Diabo que foge aos impostos.

Na passada semana fui ver numa igreja património nacional um espectáculo de teatro. Como não consegui comprar bilhetes na internet fui mais cedo e comprei bilhete na entrada da igreja. O salvo conduto em troca de 15 euros foi um programa do espectáculo. Nem bilhetes nem factura e muito menos conversa já que a fila era grande e a bilheteira era improvisada.

A representação foi gira mas o espectáculo foi fraco. A igreja estava a abarrotar, o que quer dizer que a ideia da companhia de teatro foi boa e lucrativa.

O que não percebo é como nas igrejas tudo é permitido. Não há grupo de teatro neste país que não seja obrigado a ter uma bilheteira organizada. Vamos ver um espectáculo a uma igreja e a caixa registadora é uma caixa de papelão sem fundo.

Mas há mais: a Igreja em Portugal é um Estado à parte. Em quase tudo. Os padres das nossas freguesias são verdadeiros chefes de finanças. A troco de euros confessam, baptizam, casam, encomendam as nossas almas moribundas, rezam missas, enfim, a Igreja só não tem uma verdadeira Casa da Moeda para explorar os serviços que presta à comunidade. De resto é um negócio como não há outro no mundo; pelo que recebem dos baptizados, os padres passam uma factura numa folha de couve; pelo que recebem dos casamentos passam uma factura num papel pardo de jornal; pelo que recebem de todos os trabalhos religiosos os padres funcionam, pelo que sei como qualquer organização secreta que não é obrigada a cumprir a regras de um Estado de direito onde a grande maioria dos serviços paga IVA, e a grande maioria das empresas e dos portugueses que trabalham pagam impostos, sem poderem chiar quanto mais miar. Não sei nada do regime das caixas de esmolas mas gostava de saber porque imagino, só para dar um exemplo, quantos fios de ouro é que o Santuário de Fátima manda derreter para transformar o metal em “cacau”; tudo isto em nome do Senhor e da Senhora.

Não é novidade para ninguém que vivemos num mundo desigual; os grandes tubarões do nosso regime democrático almoçam todo os dias com os nossos ministros e os seus assessores. Alguns deles já foram governantes. Outros desempenham profissões como advogado ou consultor de empresas e são deputados na casa da Democracia como se vivêssemos ainda no tempo do Marquês de Pombal. O nosso Joe Berardo vai inaugurar mais dois museus pagos com dinheiro da Comunidade Europeia, para valorizar as suas colecções de arte. E no entanto tem empresas insolventes e nada é dele. José Sócrates passa pela vergonha de ter dado milhares de computadores às crianças portuguesas e o grande computador da sua vida de governante era o motorista João Perna.

Voltando à Igreja: não tenho nada contra os padres nem a organização religiosa. E admito que posso estar a tomar a nuvem por Juno em alguns casos. Mas tenho contra a sociedade injusta em que vivemos. Não aceito que um padre esteja do cimo do altar a mandar umas bocas contra a pobreza, e os políticos corruptos, e a seguir reze umas missas pelos que morreram nos últimos dias e depois receba os euros com as mãos do diabo que foge aos impostos. JAE

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