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Uma viagem pelo oculto

Uma viagem pelo oculto

Sociólogo Garrucho Martins estudou o fenómeno de norte a sul de Portugal

Ir ao astrólogo ou à vidente é como ir a uma consulta de psiquiatria. Quem o diz é José Garrucho Martins, sociólogo de Almeirim, que fez a sua tese de mestrado sobre “As bruxas e o transe”.

O interesse sociológico da questão e o facto de em Portugal haver poucos trabalhos sobre o tema levou o sociólogo José Garrucho Martins, de Almeirim, a basear a sua tese de mestrado no estudo do fenómeno do sobrenatural. Durante alguns anos percorreu o país de norte a sul, presenciou práticas feitas por personagens, reais e ficcionais. É desse trabalho no terreno que nasce “As bruxas e o transe – dos nomes às práticas”, o livro que foi escrevendo e que saiu para as bancas em 1997.O objectivo foi tornar conhecido este tipo de práticas, que têm séculos de existência. Práticas que hoje em dia, na opinião de Garrucho Martins, têm uma maior visibilidade, talvez porque também cada vez mais gente está ligada a elas. “Hoje há mais praticantes do que havia há uns anos”.O que ainda ninguém sabe dizer é quantos praticantes é que existem em Portugal – “o que posso dizer é que há práticas deste tipo de norte a sul do país”. Práticas que são diferentes, relativamente aos métodos utilizados, consoante se está no interior do país ou no mundo urbano.“Os cartomantes e astrólogos, as práticas dos cristais e dos búzios e as técnicas de adivinhação são mais figuras do mundo urbano do que do interior rural”, refere o sociólogo, acrescentando que no que chamamos de sociedades campesinas há mais o conceito das “bruxas, videntes, as mulheres de virtude”.Há uma ligação muito forte entre a produção e o consumo das práticas. “Há práticas para todos os tipos de consumidores”, diz Garrucho Martins, adiantando que há consumidores que aderem mais facilmente a um tipo de práticas que a outros. “Há consumidores, um público mais escolarizado, que exige já outro tipo de justificações, que aproxime a prática a uma cultura mais racionalista e cientifica.Pelo contrário, o meio rural está mais ligado às videntes, às culturas populares, orais, sobrenaturais. Porque o aldeão aceita o que lhe dizem, não questiona o que lhe é apresentado.“Se quisermos comparar uma justificação da intervenção do sobrenatural através da ideia de mal com a intervenção de energias negativas, elas são idênticas, o mal e as energias negativas manifestam-se sensivelmente da mesma maneira”, diz Garrucho Martins acrescentando ser no entanto mais fácil e parece mais coerente falar de energias negativas para um público mais exigente e “do mal” para um público menos escolarizado. “A ideia é a mesma, as palavras é que mudam”.“Nas cidades os praticantes do oculto e do sobrenatural recorrem já às novas tecnologias, numa tentativa de adaptação aos tempos presentes e de dar, simultaneamente, uma credibilidade à prática, que não têm as outras nas aldeias ligadas à cultura oral”.Porque é que cada vez há mais pessoas que recorrem a este tipo de ajuda? O sociólogo refere que tem a ver com os modos de vida da sociedade contemporânea, a imprevisibilidade da via humana, o querer saber cada vez mais como vai ser o dia de amanhã. “Há algumas décadas atrás nascíamos e estávamos como que destinados a fazer determinado tipo de percursos, sem grandes problemas. Hoje não, as pessoas querem saber não só casos de saúde mas se as decisões que tomam sem grande informação, porque as coisas mudam permanentemente, se trazem vantagens ou são um risco.Em suma, se no mundo rural as pessoas recorrem a estas práticas para situações como a sua saúde, o amor, a infidelidade, no meio urbano a prática está cada vez mais “realista”, menos oculta e mais de adivinhação e aconselhamento. “É quase como ir ao psiquiatra”, diz Garrucho Martins.
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