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Dar vida à pedra

No atelier de escultura de Artur Branco

A pedra é a matéria prima do escultor Artur Branco e muitas vezes a sua fonte de inspiração. O escultor gosta de observar os pedaços de mármore, que busca cuidadosamente numa zona de riqueza geológica única, à espera que a obra surja primeiro na sua imaginação. É por isso que tem muitas peças inacabadas no atelier. Com os instrumentos que desenhou e mandou fazer em ferreiros antigos, Artur Branco vai esculpindo as pedras de cores fantásticas e desenhando traços de sensibilidade.

No atelier de Artur Vasconcelos Louro Branco, na Coutada de Cima, Abrã, Santarém, espalham-se várias esculturas em pedra. Nas peças em mármore desenham-se perfis femininos, um abraço, duas mãos.Na mesa construída pelo escultor pousa um cinzeiro e um porta canetas do mesmo material. É ali que o artista se refugia a tempo inteiro há quase um ano.O escultor, de 40 anos, prepara uma exposição numa das galerias do Parque das Nações, em Lisboa, onde irá mostrar os seus trabalhos em Março.É a figura da mulher/ mãe que mais o inspira. Os corpos nus entrelaçados também são retratados nas suas esculturas. Uma mão a dedilhar as teclas de um piano e um músico a tocar saxofone são imagens das esculturas, onde a beleza da natureza também está presente.Alguns dos trabalhos estão inacabados, mas já aconteceu terem sido compradas peças que Artur Branco ainda não considerava terminadas. “Não faço as peças de uma só vez. Tenho que ir voltando as peças. Tenho que ver o que a pedra me dá para conseguir trabalhar. Há peças que chegam a estar dois e três meses sem serem tocadas”, explica.Artur Branco aproveita a riqueza geológica da região como matéria prima para as suas obras. Uma parte do dia é ocupada a fazer “as buscas” para escolher a pedra que Artur esculpe apaixonadamente no seu atelier. Por vezes são os clientes que trazem as peças em bruto. O escultor tem produzido várias imagens de Cristo e de Santo António em pedra. As figuras religiosas são as mais vendáveis, mas Artur Branco quer começar a apostar sobretudo em peças inéditas. Ao contrário de alguns artistas que utilizam máquinas eléctricas para fabricar obras de arte, Artur trabalha manualmente com ferramentas que desenhou e que mandou fazer em ferreiros antigos da sua terra. Só usa a máquina quando é preciso cortar uma pedra mais difícil. “As ferramentas tradicionais dão um toque diferente à escultura. As máquinas eléctricas tiram sensibilidade”, garante.A célebre maceta portuguesa, os badames (formão comprido) e escopros (instrumento cortante) de dentes são alguns dos instrumentos utilizados no dia a dia pelo escultor. “São ferramentas tradicionais que já se usavam no tempo de Miguel Angelo”, lembra o escultor.A aquisição de ferramentas é a maior dificuldade do escultor. “Uma simples lima pode custar 150 euros”, exemplifica. Por vezes também é difícil encontrar pedras de qualidade para trabalhar.Aprendeu a técnica de trabalhar a pedra com um canteiro da terra, mas na escultura é autodidacta. A sua primeira peça foi a imagem de um Santo António que vendeu a uma senhora do Cartaxo.O escultor dedica-se a cada um dos trabalhos com muito empenho. Quase como se fossem seus filhos. “A minha melhor escultura são os gémeos”, garante. Os seus filhos, um menino e uma menina, são o seu grande orgulho do escultor. Foi por essa razão que há um ano deixou a oficina de cantaria e decidiu dedicar-se à escultura. Trocou as gravações em mármore pelos desenhos criativos esculpidos na pedra.O preço das suas peças varia consoante o tipo de trabalho e o tamanho. Confessa que não tem alma de vendedor e sabe que isso pode tornar-se num problema para a sua actividade.Os horários não existem para o escultor que só trabalha quando vem a inspiração. Chega a estar várias horas a olhar as pedras à espera que a obra surja primeiro na imaginação. “Tenho peças paradas quatro e cinco meses e de repente olho para as pedras e elas transmitem-me o que irei fazer.”A manhã e a tarde são aproveitadas para a busca. A noite é a melhor altura para criar. Na busca que faz pela terra à procura de pedras surgem peças de cores fantásticas em tons de rosa, lilás, amarelo, azul, branco e cinzenta. Muitas vezes a inspiração do escultor surge a partir da própria pedra. “A pedra é um mundo. A escultura nem sempre surge como queremos. Nunca sabemos o que está dentro da pedra”, exemplifica.Mas o trabalho tem que ficar ao seu gosto. “Se não tivesse amor para meter na peça voltava a fazer o que fazia até aqui”.O local onde está implantado o atelier também o inspira. “É aqui que tenho as águias, os pássaros e os montes e onde consigo criar descansado”, explica.O que mais lhe agrada no trabalho é a possibilidade de dar largas à imaginação. “Antes de esculpir já tenho a forma na cabeça”. Hoje o escultor trabalha uma pedra arredondada à espera que a forma da escultura lhe surja.Ana Santiago

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