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Comprar medicamentos sem nunca os ver

Comprar medicamentos sem nunca os ver

Maria do Céu Escudeiro é responsável pela aquisição de produtos farmacêuticos

A denominação “pomposa” de assistente administrativa principal dada pelo funcionalismo público esconde por detrás uma mulher que passa o dia a mexer em papéis para que aos doentes do Hospital Nossa Senhora da Graça, em Tomar, nunca falte um comprimido, um supositório ou uma injecção. Há anos que Maria do Céu Escudeiro Pereira Lopes é a interlocutora do hospital junto dos laboratórios farmacêuticos para garantir os medicamentos necessários.

“Verifico os stocks, faço a compras, dou procedimento aos concursos públicos para a aquisição dos medicamentos”, diz Maria do Céu Escudeiro, responsável pela compra dos medicamentos para o Hospital Nossa Senhora da Graça, em Tomar. Apesar da burocracia do processo, o sistema funciona bem - os farmacêuticos hospitalares fornecem-lhe a lista do que está em falta no armazém e Maria do Céu trata de abrir o processo negocial de compra.Em cima da mesa Maria do Céu Escudeiro tem uma pilha enorme de papéis. “E é todos os dias assim”, confirma. E não se pense que se faz um papelinho para cada medicamento – “se fosse assim não se fazia mais nada neste hospital”.Os medicamentos estão divididos por grupos terapêuticos e é por grupos que são geralmente adquiridos. A não ser um ou outro medicamento que tenha um consumo mínimo, esporádico. Esses compram-se directamente porque não compensa abrir concurso. Todos os dias se compram medicamentos, aliás, geralmente grande parte dos orçamentos dos hospitais vai exactamente para a aquisição de medicamentos. Há medicamentos que se consumem mais, como os analgésicos, outros, mais específicos, que têm uma saída menos regular.Os antibióticos e os medicamentos do foro oncológico são os mais caros. “Uma ampola para o HIV, o vírus que provoca o Síndroma da Imunodeficiência Adquirida, pode custar mais de 600 euros”, revela. Os doentes não têm a mínima noção do valor dos medicamentos que lhes é ministrado no hospital. “O hospital fornece medicamentos para pacientes ambulatórios, com doenças crónicas, como a hepatite, HIV e a insuficiência renal e a maioria das pessoas que vêm buscar os produtos à nossa farmácia não faz a mínima ideia do valor que leva dentro do saco”.Mas nem só medicamentos para a farmácia compra Maria do Céu. “Compramos também reagentes para as análises e produtos para o sangue, que se destinam a fazer a triagem das pessoas que vão dar sangue ou fazer análises".Apesar de tratar da compra de milhares e milhares de medicamentos, Maria do Céu nunca os vê. Ou raramente. “Só quando vou ao armazém, mas não tenho que os ver”, diz. “Quando eles chegam a técnica do armazém recebe, confere, e diz-me que está tudo certo, enviando-me novamente o papel, assinado por si, para cima”. O procedimento burocrático continua quando Maria do Céu Escudeiro recebe o “seu” papel de volta. “Quando o recebo, volto a verificar se os produtos e a quantidade encomendada estão correctos, assino também e mando para os serviços de contabilidade para pagamento”.Uma actividade demasiado monótona não fosse o contacto com os fornecedores. “Estamos sempre em contacto, ou para sabermos se há este ou aquele medicamento em stock, informações de preços, de dosagens”, diz, adiantando que há dias em que o ritmo é quase louco.Maria do Céu sabe quase de cor quais são os medicamentos destinados às diversas patologias. “Desde que mudamos para as novas instalações estamos mais afastadas do armazém mas no velho edifício tínhamos um gabinete mesmo junto ao armazém”.O que difere dos medicamentos hospitalares daqueles que se vendem numa vulgar farmácia é o facto de o hospital comprar genéricos. “Não quer dizer que seja sempre o genérico em si, mas a compra é sempre feita pelo nome genérico do medicamento, o nome do seu princípio activo”.E esse nome genérico tem muitos nomes comerciais, dados pelos fornecedores. “Para os hospitais, a marca não interessa, mas sim o princípio activo e no mercado há muita marca concorrente para o mesmo genérico”. Por isso quando se abre um concurso para a compra de um genérico tem de se ter em conta o factor preço e qualidade na escolha do laboratório.Maria do Céu Escudeiro entra ao serviço às 9 horas e às 16h30 já está na rua. Normalmente sairia às 17h30 mas neste momento está com o estatuto de trabalhadora estudante e por isso sacrificou a sua hora de almoço, que é agora de apenas 30 minutos.Aos 37 anos Maria do Céu decidiu concluir o 12º ano, inscrevendo-se à noite nas aulas de matemática, a única disciplina em falta. “Se tivesse outro horário não conseguiria estudar à noite”, garante. Quando sai do hospital ainda passa geralmente pelo supermercado, ruma a Fungalvaz, onde mora, para fazer o jantar e dar banho à sua filha de três anos. Depois de tudo pronto, regressa novamente a Tomar, mais uma vez para lidar com números.Margarida Cabeleira
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