uma parceria com o Jornal Expresso

Edição Diária >

Edição Semanal >

Assine O Mirante e receba o jornal em casa
31 anos do jornal o Mirante

Uma “aberração” à margem da lei

Assembleia Distrital de Santarém não reúne há cerca de quatro anos

É uma estrutura que existe no papel mas que não passa daí. A Assembleia Distrital de Santarém não tem actividade política há anos e não existe opinião unânime sobre a sua legalidade. O próprio secretário de Estado da Administração Local e presidente da Assembleia Municipal de Tomar diz, com orgulho, que nunca quis tomar posse do seu lugar naquele órgão e defende que o mesmo é uma “ aberração” que só “custa dinheiro aos contribuintes”.

A Assembleia Distrital de Santarém, de quem não há rasto de actividade política nos últimos anos, está a funcionar à margem da lei e, em última análise, arrisca-se a ficar sem o seu valioso património a favor do Estado. Essa é pelo menos a conclusão do presidente da Assembleia Municipal de Santarém, e durante alguns anos presidente da assembleia distrital, José Miguel Noras.Só que a leitura de Miguel Noras parece demasiado drástica. O decreto-lei 5/91 diz que os bens das assembleias distritais só podem ser transferidos para a posse do Estado caso as mesmas deliberem nesse sentido. Ora, como a Assembleia Distrital de Santarém nem sequer reúne, não há possibilidade de haver qualquer decisão nesse sentido. Aliás, no seu habitual artigo de opinião publicado na última edição de O MIRANTE, Miguel Noras destaca que há mais de um ano que a assembleia funciona em situação irregular, precisamente porque não se procedeu à convocatória para eleição da nova mesa no decurso das eleições autárquicas de Dezembro de 2001 – o que deveria ter acontecido em Março de 2002. A lei diz mesmo que devem ser convocadas duas assembleias ordinárias por ano - em Março (para prestação de contas) e em Dezembro (para apresentação e votação do orçamento e plano de actividades). Mas ninguém liga ao que está escrito no papel e a mesa eleita em 1999, também já fora dos prazos legais, apesar de ter convocado essas reuniões ordinárias até final de 2001 nunca teve quorum para as realizar. Por isso não há orçamentos aprovados nem prestação de contas há uma série de anos.Refira-se que as assembleias distritais são compostas pelos presidentes das câmaras e das assembleias municipais de cada distrito e ainda por um representante das juntas de freguesia de cada município eleito pelos seus pares. A sua composição decorre, pois, directamente, dos resultados das eleições autárquicas e o plenário distrital deveria reunir nos meses seguintes ao sufrágio para proceder à instalação de uma nova mesa.AS BOAS INTENÇÕES DE RODRIGUESNa prática, a assembleia distrital não existe em termos políticos e a sua extinção não seria sentida por ninguém, não fosse o caso de desenvolver uma obra social de algum relevo através da Colónia de Férias da Nazaré. Um equipamento que permite alguns dias de praia a crianças carenciadas do distrito.E não é por falta de boas intenções que a assembleia é um fracasso. O presidente da Câmara de Torres Novas, António Rodrigues (PS), quando tomou posse como presidente em Fevereiro de 1999, disse aos jornalistas que iria revitalizar o papel de um órgão que poderia ser uma voz do distrito. Até aí, a assembleia raramente reunia, por não haver quorum em sucessivas ocasiões.Só que promessas leva-as o vento e os debates sobre temas candentes da actualidade da altura - como a localização do novo aeroporto de Lisboa ou a iminência de diminuição de fundos comunitários para a região – nunca passaram daí.A Assembleia Distrital de Santarém teve até uma oportunidade única de mostrar que ainda mexia, quando o actual Governo decidiu dividir o distrito ao meio para tentar garantir que a torneira dos fundos comunitários não se fechasse - os municípios da Lezíria do Tejo receberam guia de marcha para a Região do Alentejo, enquanto os concelhos do Médio Tejo passarão a integrar a Região Centro.Essa alteração administrativa, cujas consequências se passarão a sentir a partir de 2006, não mereceu qualquer posição da assembleia - uma emanação do nosso poder autárquico, reforce-se – que continuou a sua longa hibernação, alheia à realidade que a envolve.“UMA ABERRAÇÃO QUE SÓ CUSTA DINHEIRO AOS CONTRIBUINTES”É por isso que a sua existência continua a ser questionada, pelo menos nos moldes actuais, por alguns responsáveis autárquicos. Desde logo por Miguel Noras, que considera preferível a venda do património, que valerá alguns milhões de euros, e a distribuição dos proventos pelas autarquias que a compõem.Mas também por Miguel Relvas (PSD), que a considera mesmo uma “aberração”. Presidente da Assembleia Municipal de Tomar desde Dezembro de 1997, o agora secretário de Estado da Administração Local diz com algum orgulho que nunca tomou posse do seu assento na assembleia distrital. Nem neste mandato nem no anterior. Para ele, a assembleia é um alvo a abater. “A minha legitimidade de eleito é no município, e é no município que eu presto contas. A matriz do país é municipal”, justifica.Quanto ao património, “haveria sempre uma maneira de ser integrado noutros organismos da administração pública”. E o facto de não se terem registado ainda eleições leva-o ao seguinte comentário: “Essa é uma prova de que este é um órgão que não devia existir. É uma aberração do sistema que só custa dinheiro aos contribuintes”.Sérgio Carrinho (CDU) não vai tão longe, mas reconhece que a assembleia distrital deixou de ter protagonismo a partir do momento em que as associações de municípios se assumiram como voz colectiva e plataforma privilegiada para o debate de assuntos de cariz regional.“Hoje, a assembleia distrital é uma figura de retórica”, diz o presidente da Câmara da Chamusca, admitindo que a mesma só ainda não se extinguiu porque tem um património valioso para gerir. O autarca da CDU referiu ainda ter conhecimento de “alguns esforços” para se fazer uma convocatória que reponha a legalidade do seu funcionamento.“Há trabalho feito”O MIRANTE tentou falar com António Rodrigues sobre o assunto, mas tal não foi possível. No entanto, o nosso jornal apurou que o autarca de Torres Novas tem vindo a pedir aos serviços da assembleia distrital a elaboração dos relatórios e contas em atraso. Alguns problemas no funcionamento interno dos serviços, devido a doença de um funcionário superior, terão obstado a que os documentos pudessem estar já concluídos de molde a convocar-se uma assembleia para os discutir e aprovar, bem como para eleger nova mesa.Mesmo assim, isso não justificará só por si o arrastamento da situação. Mas a culpa reparte-se por todos os autarcas envolvidos, porque apesar de ter havido convocatórias até final de 2001 – quando se concluiu o anterior mandato – nunca houve quorum. O desinteresse é manifesto.De qualquer forma, uma fonte próxima de António Rodrigues, que pediu para não ser identificada por entender que as explicações deviam ser dadas pelo presidente da assembleia, sempre adiantou que “há trabalho feito” na assembleia distrital, sobretudo ao nível da colónia balnear da Nazaré. E é mesmo provável que para breve haja novidades referentes aquele espaço.

Mais Notícias

    A carregar...