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Uma lei para não ser cumprida

Grande parte dos estabelecimentos de comidas e bebidas da região está ilegal

Mais de metade dos estabelecimentos de restauração está a funcionar fora da lei. Quem não cumpre queixa-se, quem segue a lei revolta-se. E o Governo prepara-se para prorrogar novamente a aplicação da lei que deveria estar a funcionar desde 1999.

Detectores de incêndios, casa de banho para funcionários, afixação exterior de placa identificativa do tipo de estabelecimento, saídas de emergência sinalizadas e botijas de gás acondicionadas no exterior do edifício são alguns dos requisitos mínimos que qualquer café, bar ou restaurante tem de possuir a partir de 1 de Março próximo. Nessa data caducam os alvarás sanitários e entra em vigor a licença de utilização passada pelas câmaras.As exigências não são novas, mas muitos empresários fazem-se de novas quando se fala em cumprir a legislação. Mesmo que ela já venha de 1997, mesmo que tenha sido prorrogada de ano para ano para dar tempo à realização dos investimentos necessários. Mas mesmo que a lei não entre em vigor a 1 de Março, mais de 50 por cento da restauração do distrito de Santarém e 70 por cento da existente no concelho de Vila Franca de Xira continuará a não cumprir. E a funcionar sem licença, mas com a porta aberta e o fechar de olhos das câmaras municipais, responsáveis pela emissão das licenças de utilização.Dizemos se a lei entrar em vigor porque, de acordo com informações recolhidas por O MIRANTE, o Governo estará a preparar-se para fazer sair mais uma prorrogação ao cumprimento de uma legislação que deveria ter entrado em vigor em 1999. A Associação de Restauração e Similares de Portugal (ARESP) não quis ir tão longe. Ana Jacinto, responsável do gabinete jurídico da associação, prefere dizer que o Governo “poderá fazer uma revisão à lei”, tendo como principal objectivo “desburocratizar” os trâmites necessários ao processo de licenciamento. Isto é, a intenção do Executivo “é tornar os licenciamentos mais céleres”, de modo a que os pedidos dos empresários do sector “não demorem meses e às vezes anos a serem aprovados pelas câmaras”.Mas à insistência de O MIRANTE, Ana Jacinto deixou também escapar que a tabela de requisitos mínimos para um estabelecimento obter a almejada licença “deverá também ser revista, embora não deva haver alterações de substância”.O regime jurídico da instalação e do funcionamento dos estabelecimentos de restauração e de bebidas foi publicado em 1997 (decreto-lei 168/97, de 4 de Julho), tendo algumas disposições sido alteradas em 2002 (decreto-lei 57/2002, de 11 de Março), três anos depois do Governo ter decidido fazer a primeira prorrogação do prazo. Já nessa altura com a justificação de dar tempo aos empresários para realizarem as adaptações necessárias nos seus estabelecimentos.Os últimos dados estatísticos referentes ao distrito de Santarém datam de 2002. De acordo com Paulo Oliveira, presidente da delegação de Santarém da ARESP, nessa data havia 4200 estabelecimentos de restauração nos 21 concelhos do distrito, 60 por cento dos quais ainda funcionavam com o alvará sanitário. E sem terem todos os requisitos exigidos pela legislação.Mesmo assim, há distritos em muito pior situação do que Santarém, garante Paulo Oliveira. Uma convicção que é confirmada por Ana Jacinto. “Este é um problema nacional, que tem maiores repercussões em distritos de maior densidade populacional”. Como Lisboa, por exemplo.Segundo o apurado pelo nosso jornal, mais de 70 por cento do sector da restauração de Vila Franca de Xira, concelho que integra a Área Metropolitana de Lisboa, também está a trabalhar ainda nos moldes antigos.A culpa vai morrer solteiraQuando as coisas não correm bem, há sempre várias perspectivas de ver a mesma situação. As associações locais e regionais do sector dizem que têm vindo a prestar toda a informação aos seus associados e queixam-se de que, muitas vezes, outras entidades não fazem o mesmo. Por exemplo as câmaras, que deveriam fornecer também informação a quem paga mensalmente impostos para ter casa aberta. Mas as autarquias refugiam-se na data em que foi publicada a lei da restauração, adiantando que os comerciantes foram deixando andar a situação, à boa maneira portuguesa.Os visados também deitam as culpas para trás das costas. Queixam-se que é preciso muita papelada, que pedem vistorias que nunca mais são feitas pelas entidades competentes – Serviço Nacional de Bombeiros, câmaras e Delegada de Saúde concelhia – e que as câmaras demoram meses a desbloquearem as licenças de utilização solicitadas.Paulo Oliveira é que parece não ter dúvidas – “A responsabilidade pelo actual estado de coisas deve ser repartida entre as câmaras e os comerciantes”. Ana Jacinto diz por seu lado saber da existência de muitos pedidos de licença de utilização que “emperram” nas câmaras durante meses, por estas não terem capacidade de resposta na realização das imprescindíveis vistorias. “A «máquina» não consegue responder quando há milhares de pedidos a entrar em simultâneo”, diz a responsável da ARESP. Com culpa ou sem culpa no cartório, a verdade é que, sete anos após ter saído a legislação sobre o sector, a maioria dos estabelecimentos de restauração e bebidas da região continua sem cumprir a Lei. E não é em pouco mais de um mês que o cenário se irá alterar.Margarida Cabeleira

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