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“Relações forçadas têm reflexos na saúde mental”

Um estudo da sua autoria, apresentado recentemente, referia que uma em cada quatro estudantes universitárias já havia sido coagida sexualmente. Acha que esses números são credíveis e reflectem a realidade?A amostra estudada nesta investigação é, como habitualmente se designam, de conveniência, ou seja, não obedeceu a critérios de estratificação. Logo, o que podemos dizer é que uma em cada quatro estudantes universitárias que compunham a nossa amostra relatou que já havia sido forçada sexualmente. Apesar de na comunicação social estes resultados estarem a causar alarme, não são motivo de espanto para quem tem conhecimento das investigações conduzidas em países como a Alemanha, Canadá, Espanha e Estados Unidos, onde estas taxas variaram de 14,5 a 53,7% da população inquirida. Sendo Portugal um país de brandos costumes, pensamos que os nossos resultados reflectem a realidade portuguesa.O que é que entende por relações sexuais forçadas?Penso que essa pergunta é fundamental, pois na comunicação social foi muito confundido relações sexuais forçadas com violação. É então importante clarificar que as relações sexuais forçadas (qualquer forma de actividade sexual não consentida) podem passar por: “contacto sexual indesejado”; “coacção sexual”; “tentativa de violação” e “violação”.Que leitura faz desses dados?Que as relações sexuais forçadas existem entre os jovens e têm consequências graves na saúde mental. Que os nossos jovens pouco ou nada recorrem a ajuda especializada - ou por vergonha ou por inacessibilidade física ou económica -, o que seria importante pela possibilidade de uma intervenção precoce poder prevenir o estabelecimento de um problema crónico e pela existência de soluções adequadas para a resolução de problemas específicos da população forçada. O que leva jovens universitárias a submeterem-se a relações sexuais sem o seu consentimento?Relativamente às relações entre atitudes e comportamentos, um elevado número de investigadores e de teóricos sugeriram que as relações sexuais forçadas são o resultado dos processos “normais” de socialização que os homens experimentam. E que as atitudes, crenças e experiências de socialização dos atacantes são a base que predispõe um homem a perpetrar um ataque ou a acreditar que este é justificável. Realmente, parece que as relações sexuais forçadas estão rotuladas em estereótipos culturais de homens e mulheres que definem a maneira como é esperado para interagir social e sexualmente, o chamado duplo padrão.Ficou surpreendida com a ampliação que foi dada ao estudo por parte da comunicação social?Sem dúvida! Isto porque no 3º Simpósio de Sexologia da Universidade Lusófona várias foram as comunicações interessantíssimas apresentadas. Contudo, a comunicação social deu destaque a dois trabalhos sobre agressão sexual. Isto repercute o facto de se estar no âmbito de uma das temáticas mais abordadas no nosso país actualmente, apesar de estes estudos terem iniciado em 2001. Qual foi o universo utilizado para a elaboração do estudo?Relativamente ao primeiro estudo - “Estudo das propriedades psicométricas de medidas para avaliação de relações sexuais forçadas” - foram incluídos 1374 estudantes universitários portugueses. As respostas foram obtidas de duas formas distintas: 304 (22.1%) por questionários respondidos na internet e 1070 (77.9%) por questionários respondidos na sala de aula (aplicados em sete estabelecimentos de ensino superior de Norte a Sul de Portugal). Destes 1374 sujeitos, 39.1% eram homens e 60.9% eram mulheres. Quanto ao segundo estudo, “Atitudes face ao sexo forçado, relações sexuais forçadas e ajustamento emocional em mulheres universitárias”, participaram 837 estudantes universitárias portuguesas. As respostas foram obtidas de duas formas distintas: 144 por questionários respondidos via internet e 693 em sala de aula. No respeitante à prevalência de agressão sexual, 612 sujeitos (73.1%) nunca tinham estado envolvidos em relações sexuais forçadas, 57 (6.8%) tinham experimentado contacto sexual indesejado, 25 (3%) tinham sido envolvidas em tentativas de violação, 111 (13.3%) tinham sido coagidas sexualmente e 32 (3.8%) tinham sido violadas.Como surgiu este tema de investigação?Por convite da universidade, visto este trabalho fazer parte de um projecto de colaboração em curso com as Universidades Autónoma de Madrid, com o Professor José Antonio Carrobles e com a das Ilhas Baleares com o Professor Javier Perez Pareja.Mário Gonçalves

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