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Actividade perigosa

Paulo Ferreira Mendes*
O Aníbal era dono de uma pastelaria, estabelecimento que estava sito junto de um escritório da Companhia de Seguros Leal & Avisada,S.A.. Concretamente a pastelaria, de seu nome «A Doce», estava localizada num prédio que era contíguo ao do escritório daquela seguradora. Naquela pastelaria o Aníbal levava a cabo actividade comercial de café, salão de chá e pastelaria, vendendo sandes, refeições ligeiras, bebidas e bolos, produtos adquiridos e consumidos pelos clientes ao balcão ou nas mesas que existiam na pastelaria. A dada altura decidiu a Leal & Avisada proceder a obras no seu escritório, entendendo que este necessitava de mais espaço interior e de melhores condições para instalação de equipamentos, nomeadamente informáticos. Para tal contratou a Construções Perfeitas,Lda., empresa que ficou encarregada de realizar aquelas obras. A Construções Perfeitas pôs mãos à obra e procedeu, conforme previsto e contratado, à demolição de paredes e pilares, reboco de estuques, arranque de pavimentos e abertura de roços. Naquelas obras, utilizou a Construções Perfeitas ponteiros de aço e compressor para perfuração e demolição. Naturalmente, tais obras tiveram impacto na vizinhança, sendo que levaram mesmo a que, durante 5 dias, a pastelaria «A Doce» apenas tivesse podido abrir depois das 17h..Como compensação por aquele encerramento parcial, acordou a Construções Perfeitas, por escrito, em pagar ao Aníbal a soma de 1250euros. No entanto, o problema não se limitou àquele encerramento forçado. É que os trabalhos foram levados a cabo durante o dia, coincidindo com o horário diurno da pastelaria e provocaram o estremecimento das paredes, chão, janelas, máquinas e vitrines para lá dos ruídos ensurdecedores das máquinas ouvidos constantemente na pastelaria. Sucedeu muitas vezes que clientes que se dirigiam à pastelaria do Aníbal tiveram que voltar para trás, dizendo expressamente àquele que não se podia estar dentro do estabelecimento. Isto levou a que o estabelecimento visse reduzidas as suas receitas a cerca de metade do habitual, durante o período em que as obras duraram. Gerou-se aqui litígio entre a Construções Perfeitas e o Aníbal, uma vez que este pretendeu obter da Construções Perfeitas indemnização dos prejuízos causados. Porque não foi possível acordo que satisfizesse as pretensões do Aníbal, este acabou por intentar contra aquela construtora acção destinada a obter a condenação dela no pagamento de indemnização a ele Aníbal. O Aníbal, ao intentar aquela acção, baseava-se no art. 493.º,2 do Código Civil, o qual estabelece que «Quem causar danos a outrem no exercício de uma actividade, perigosa por sua própria natureza ou pela natureza dos meios utilizados, é obrigado a repará-los, excepto se mostrar que empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de os prevenir». Na 1.ª instância entendeu-se que o caso ora em questão se subsumia à previsão daquela norma legal e condenou-se a Construções Perfeitas no pedido. No entanto, veio aquela a recorrer para a Relação, a qual acabou por revogar a sentença proferida na 1.ª instância, absolvendo no respectivo acórdão a Ré Construções Perfeitas do pedido. De facto julgou-se que a actividade em questão não era perigosa na acepção legal, pois dela não resultava perigosidade devida aos meios utilizados nem à sua natureza, uma vez que aquelas não produziam probabilidade maior do que as de outras actividades de causar danos a terceiros.Assim, caberia ao Aníbal provar culpa da Ré Construções Perfeitas, coisa que não havia feito. Isto apesar de um dos Desembargadores signatários do acórdão ter votado em contrário, considerando que a actividade era perigosa e que de tal forma cabia à Ré provar que havia adoptado todas as providências necessárias para evitar o causar de danos ao Aníbal e não a este provar culpa da Ré causadora dos danos.*Advogado

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