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Creches a abarrotar

Creches a abarrotar

Pais desesperam com falta de vagas para os seus filhos nos estabelecimentos da região

Conseguir um local onde deixar os filhos com menos de três anos é, para muitos pais, encontrar uma agulha num palheiro. O número de amas, berçários e creches aumenta todos os anos mas continua a oferta continua a ser insuficiente no Ribatejo.

Quando se iniciar o novo ano lectivo a professora Sílvia Freire já sabe onde deixar a sua pequena Matilde – na mesma ama que durante três anos tomou conta de Adriana, a filha mais velha.Uma ama particular, sem qualquer vínculo à Segurança Social mas “de toda a confiança”. A professora de Torres Novas diz mesmo que se sente bem mais descansada ao deixar a filha de seis meses com alguém por quem tem grande consideração do que no melhor berçário do concelho.O recurso a amas particulares é cada vez mais utilizado na região do Ribatejo. Porque a oferta de creches e berçários, apesar de ter aumentado nos últimos anos, continua a ser deficitária.Numa instituição estatal ou protocolada com a Segurança Social, conseguir uma vaga é quase como procurar uma agulha no palheiro. E mesmo para quem possa pagar uma mensalidade mais elevada o caminho é difícil.Em Tomar, por exemplo, já não há vagas, seja em estabelecimentos com acordo com a Segurança Social (as instituições públicas de solidariedade social – IPSS) seja em privados, legalizados ou “clandestinos”. Tomar é, aliás, um dos concelhos do Ribatejo com menor taxa de cobertura a nível de berçários e creches. Para uma população infantil de 1.163 crianças a oferta estatal ou semi-privada (através das IPSS) ronda os 11 por cento.Pior mesmo só Constância, sem qualquer creche, ou Vila Nova da Barquinha, concelho que tem também uma taxa de cobertura zero, embora neste caso a situação seja mais optimista, já que está a ser actualmente construída uma creche pela Santa Casa da Misericórdia da vila.Para o director do Centro Distrital de Segurança Social (CDSS) de Santarém o maior problema não reside na capacidade instalada, mas no facto de, apesar de se inaugurarem todos os anos novos estabelecimentos, a oferta conseguir suplantar sempre a procura. “A alteração foi mais rápida que a resposta dada nesta área”.“Houve uma mudança cultural nos últimos anos na região. Os hábitos familiares mudaram e se há 15 anos ninguém punha os filhos nas creches, hoje os pais preferem que as crianças comecem desde cedo a conviver com outras crianças”, refere António Campos, lembrando ainda que há sensivelmente um ano foi inaugurada uma nova creche no Pego (Abrantes) e outra em Ferreira do Zêzere.A solução passa, segundo o director do CDSS de Santarém, pela legalização da profissão de ama. Neste momento a Segurança Social está a ultimar um estudo que prevê a regulamentação profissional das amas particulares. O objectivo, diz António Campos, é passá-las para a rede privada e dar-lhes enquadramento legal.O director distrital, que como outros pais viveu a experiência de ter os filhos numa ama particular, considera que este é um passo extremamente positivo para o sector da educação infantil.Outra das alternativas à falta de vagas nas instituições públicas e privadas é a chamada creche familiar, as amas que têm acordo com a Segurança Social. E que são cada vez mais (ver caixa).É num prédio de traça antiga, restaurado, que funciona em Santarém o Palmo e Meio, uma creche privada dirigida por Margarida Pereira. O estabelecimento funciona das oito às 19 horas e alberga neste momento 27 crianças. Apesar da mensalidade não estar ao alcance de todas as bolsas – até um ano de idade o valor mensal é de 306 euros e para os mais crescidinhos (de um aos três anos) é de 287 euros, acrescendo ainda os 130 euros de inscrição, que é só paga no primeiro ano – o Palmo e Meio tem já lotação esgotada. Vagas só mesmo quatro e apenas no berçário. O valor pago pelos pais inclui as fraldas, o almoço e o lanche da criança.O Palmo e Meio é apenas um exemplo, embora elucidativo, do preço que se pode pagar numa creche privada. Santarém é, aliás, de acordo com a Deco - Associação de Defesa do Consumidor, um dos concelhos onde a oferta privada nesta área é mais cara. Segundo a listagem efectuada pela organização, em Santarém, os valores variam entre os 3100 e os 3597 euros anuais.Se as vagas nos estabelecimentos particulares da região são poucas, nas creches geridas por Instituições particulares de Solidariedade Social (IPSS) - que têm protocolos com a Segurança Social - simplesmente não existem. Porque são as primeiras que os pais procuram, já que a mensalidade é mais acessível.Nestas creches o valor a pagar depende exclusivamente dos rendimentos dos pais, uma vez que o cálculo da mensalidade é feito com base na declaração de IRS. É um princípio justo – quem ganha mais, paga mais, quem tem poucas posses desembolsa um valor mensal mais reduzido.Em Vila Franca de Xira, no Nuclisol Jean Piaget (uma IPSS), o valor mínimo é de 77 euros, enquanto o máximo pago pelos pais é actualmente de 192 euros. As duas salas da creche estão completamente preenchidas com duas dezenas de crianças de um aos três anos de idade e a lista de espera aumenta todos os dias.No jardim-de-infância do Cartaxo, que tem das maiores creches da região, o valor mínimo pago pelos pais corresponde ao abono de família recebido por cada filho. O preço máximo ronda actualmente os 130 euros.A instituição, implantada em cinco hectares de terreno, tem dez salas divididas por duas creches, que funcionam das oito da manhã às 19h30. Os pais apenas têm de levar fraldas, disponibilizando a instituição o pequeno-almoço, o almoço e o lanche.É também nesta creche que mais notória se torna a dificuldade dos pais em arranjar alternativas credíveis para deixar os filhos. A lista de espera (100 crianças) é quase idêntica ao número de crianças que frequentam as duas creches - 155.A prioridade, diz o director da instituição, são os casos sociais. Não apenas nas situações em que a família tem maiores dificuldades financeiras, mas também aquelas em que não há alternativa para deixar os filhos. José Painho dá o exemplo do caso de um casal, ele procurador em Lisboa, ela juíza em Santarém, que não tem família no Cartaxo, onde reside. “Os filhos acabaram por ser criados aqui”, diz.E nunca ninguém deixou de ter os filhos no jardim-de-infância do Cartaxo por não ter como pagar. “Algumas crianças são financiadas pela caridade pública”, refere José Painho.Todos os anos há pais desesperados à procura de um local onde deixar os filhos bebés. E saudosos dos tempos em que os avós quase abdicavam da vida própria para ficar com o rebento da família. Mas até isso mudou. Hoje, a chamada terceira idade está muito mais receptiva a gozar a vida do que a ficar em casa…Margarida CabeleiraCreches familiares estão a crescer no distrito de SantarémAmas por vocaçãoNão é qualquer pessoa que pode ter uma creche familiar. O primeiro passo para as aspirantes a amas é mostrarem a sua disponibilidade junto de uma instituição pública de solidariedade social. São as IPSS que fazem as candidaturas à Segurança Social da sua área de residência. Posteriormente é feita uma selecção, baseada no resultado de uma entrevista com a psicóloga da Segurança Social. Depois de ser escolhida, a ama recebe formação profissional para desempenho das suas funções.Além disso, é imprescindível que a habitação da potencial ama tenha as condições mínimas exigidas para poder receber crianças. Na residência tem de haver pelo menos uma assoalhada que fique única e exclusivamente ao serviço da creche. O ideal é que tenha uma casa de banho privada e muita luz natural.Neste momento a Segurança Social de Santarém está a dar formação para abertura de creches familiares a amas de Benavente, Alpiarça e Santarém. Actualmente existem já seis creches familiares em Alcanena, estando prevista a abertura de mais três ainda este ano. Em Alpiarça existem também cinco creches familiares em funcionamento.Uma delas é a de Sandra Cadinas. Desde Dezembro que a residente em Alpiarça tem a seu cargo quatro crianças, entre um e três anos de idade. Sandra sempre sonhou trabalhar com crianças e diz que só deve ser ama quem sente vocação para isso. “Se tivesse estudado mais, hoje seria educadora de infância”, diz, enquanto dá papa à pequena Erica.Trabalhava no centro de dia da Associação de Reformados, Pensionistas e Idosos do Concelho de Alpiarça (ARPICA) quando surgiu a oportunidade de ser ama. A instituição, a quem Sandra reporta, fez a candidatura e a ama o resto – dois meses de formação intensiva, mais duas semanas de estágio no Coelhinho, creche da Chamusca.Hoje “Nana”, como é tratada pelas pupilas, ganha 130 euros por cada criança, trabalha a recibos verdes e faz os descontos para a Segurança Social. Mas o dinheiro não é tudo. As brincadeiras, os jogos, as pinturas e a ginástica que diariamente faz com Erica, Mariana, Diana e Luísa valem muito mais.Abrir uma creche não é tarefa fácilGosto vence burocraciaDuas educadoras de infância e uma auxiliar uniram-se e decidiram investir na área da educação. A creche das sócias Sónia Nunes, Carla Santos e Sónia Afonso vai abrir a 16 de Setembro no Entroncamento, com o berçário e cheio e as duas salas dos mais crescidinhos (até aos três anos) bastante composta.Abrir uma creche não é todavia tarefa fácil. Primeiro há que encontrar um local que respeite as regras impostas pela Segurança Social. Depois são as alterações indispensáveis do espaço, os arranjos interiores, a decoração e, pior que tudo, os trâmites legais – vistorias, licenças, alvarás.Situada no rés-do-chão de um bloco de apartamentos, nas traseiras do Lidl do Entroncamento, a Mimos Mágicos tem duas salas – para as crianças de um aos dois anos e dos dois aos três anos – e um berçário.A legislação exige que cada criança tem de ter um espaço de dois metros quadrados para si. Para poder albergar dez crianças, cada sala da Mimos Mágicos tem 20 metros quadrados. E também muita luz natural. E ventilação. Tudo como manda a lei.A casa de banho, comum às duas salas da creche, tem grandes vidraças, de modo a que nada do que ali se passe possa escapar às educadoras. As minúsculas sanitas têm obrigatoriamente de ter divisórias entre elas, por causa da privacidade…Os móveis, quer das salas quer do refeitório, não podem ter bicos e têm de ser construídos com material lavável. Os equipamentos da cozinha são todos em inox e não se pode esquecer da zona de arrumos, do vestiário e da casa de banho do pessoal.No berçário, que pode albergar até um máximo de oito crianças, há além da sala-parque a sala dos berços, onde as pequenas camas de grades brancas estão lado a lado mas seguem a lei e têm um espaço de meio metro entre cada uma, de modo a tornar fácil o seu acesso. Ao lado, a chamada copa de leites, onde se preparam as papas e os biberões.Ainda de acordo com a legislação os proprietários das creches são obrigados a afixar em local bem visível a fotocópia do alvará, mapa de pessoal e respectivos horários, nome do director, regulamento interno, mapa de ementas e tabela de mensalidades, com os serviços abrangidos.No caso da Mimos Mágicos, a mensalidade fixada pelas três sócias é de 225 euros, idêntica para todos os escalões etários (dos quatro meses aos três anos) e os pais têm de trazer as fraldas. A alimentação (almoço e lanche) fica a cargo da creche.A Mimos Mágico vai funcionar entre as 7h30 e as 19h30 de segunda a sexta-feira e não exclui a hipótese de também poder abrir ao sábado até à hora de almoço. O berçário está lotado mas se o seu filho tiver entre um e três anos ainda consegue vaga. Se se apressar…
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