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O topógrafo voador

O topógrafo voador

Ricardo Pereira trocou o pára-quedismo por uma profissão mais terrena

Quando era pequeno Ricardo Pereira queria ser desenhador mas quando atingiu a maioridade inscreveu-se como voluntário no corpo de pára-quedistas. Sem o 12º ano, as perspectivas de progressão militar não eram animadoras e o jovem de Junceira regressou à terra. Hoje é topógrafo, profissão que aprendeu a gostar.

Mantém o espírito lá no alto mas os pés bem assentes na terra. Em 1999, depois de 16 meses de pára-quedismo, Ricardo Agostinho Cristóvão Pereira decidiu enveredar por uma profissão que lhe desse garantias de emprego e ao mesmo tempo lhe proporcionasse a hipótese de tirar o 12º ano. Acabou num curso profissional. O jeito para o desenho que o acompanha desde pequeno levou-o a procurar algo nessa área mas no Centro de Formação Profissional de Tomar não existia então qualquer curso de desenho e optou por um que iria iniciar-se dali a uma semana – topografia.Depois do pára-quedismo, este foi mais um salto de aventura. Ricardo não fazia a mínima ideia do que era ser topógrafo. “Via-os por ali, à beira das estradas, mas não fazia a mínima ideia do que faziam e para que é que o trabalho deles servia”.Entrou no curso completamente “a zero”. Mas foi o pensamento de que era uma actividade para ser feita ao ar livre que o levou a interessar-se pelo curso. “Sou uma pessoa que não gosta de estar muito tempo fechado num escritório”. E nesta profissão passam-se muitas horas ao ar livre, é um trabalho de campo. “É a imprevisibilidade que eu gosto neste trabalho. Hoje está-se aqui, amanhã acolá”, diz Ricardo.Quando entrou no curso a primeira coisa que lhe despertou a atenção foi o aparelho em si. “Parecia quase uma máquina sofisticada de tirar fotografias”, diz agora meio a brincar.Hoje, Ricardo já sabe o que faz um topógrafo – “Faz levantamentos de topografia”. E o que é isso, pergunta-se. Ricardo prefere responder de forma indirecta: “Hoje para se construir uma habitação, uma estrada ou um simples muro, as câmaras exigem um levantamento topográfico do local, que lhes permite identificar exactamente o local e o desnível do terreno, por exemplo. É por isso que cada vez mais vemos por essas estradas fora pessoas a olhar para dentro do aparelho que parece uma máquina de tirar fotos. E realmente é quase como tirar uma fotografia. Ricardo Pereira olha para a lente do equipamento, foca a cruz que aparece no centro e a que está no prisma do bastão, carregado por um colega, geralmente chamado de porta-miras.O aparelho foca a cruz no bastão, lê as coordenadas, o desnível, a distância e fixa. Um topógrafo tem de saber ler as coordenadas que aparecem no aparelho, gravá-las e mais tarde, quando chegar ao escritório, transpor essas coordenadas para um programa de computador.Fazer a marcação topográfica de uma estrada com quatro ou cinco quilómetros demora uma semana ou duas, mas tudo depende do terreno que se pisa. O topógrafo fez recentemente o levantamento para o alargamento da estrada da Serra e só apanhou mato. O que fez com que o trabalho demorasse mais tempo do que se estivesse a fazer um levantamento num terreno plano e limpo.Não usa bata nem luvas, mas já andou muitas vezes com dois ou três pares de calças de gangas vestidas e mesmo assim, quando acabou o dia de trabalho, tinha as pernas completamente picadas. Só costuma usar capacete em grandes obras, nomeadamente no levantamento topográfico para colocação de esgotos numa fábrica em construção. É que nesse tipo de trabalhos o perigo de queda é maior do que no levantamento topográfico de uma estrada.Ricardo gosta do que faz na Tecsebas, uma empresa familiar de Tomar. Tem um horário definido mas o seu cumprimento depende muito do local de trabalho e das condições atmosféricas. Em dias de grande calor começa a trabalhar de madrugada e acaba o serviço logo depois de almoço. Se vai para longe, nunca sabe a que horas acaba o seu dia. “Só acabamos o dia quando já não se consegue ver”.Hoje Ricardo sabe que esta é uma profissão de futuro – “cada vez os topógrafos são mais requisitados devido às exigências no sector” – mas não esquece o tempo em que a adrenalina subia na mesma proporção em que ele descia em direcção à terra, antes de abrir o pára-quedas.O bichinho ficará para sempre. Tanto assim é que ainda não desistiu de tirar o curso civil de saltos de pára-quedas.Margarida Cabeleira
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