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Eles andam aí…Eles andam aí…

*Jorge GuedesUm amigo enviou-me, há dias, um e-mail que descrevia uma situação que, em traços gerais, contava a história de alguém que vive num concelho de um distrito vizinho de Santarém, que não identifico porque não conheço todos os contornos da história, mas que foi despedido por ter criado um “blog” na internet e ter dado asas à sua liberdade de expressão.O indivíduo em causa criou o tal site na internet que pretendia ser um espaço de reflexão e de debate de ideias, nomeadamente sobre a actividade da respectiva câmara municipal e outras instituições. Num espaço de dois meses, a página registou mais de 6.700 visitas, tendo sido bastante comentada no concelho.A autarquia ou o presidente nunca responderam a qualquer comentário mas alteraram alguns procedimentos dando, por isso, razão ao que se estava escrito. Até que, diz o e-mail, pouco tempo depois da criação da página, o autarca terá entrado em contacto com a direcção da empresa onde o criador trabalhava e denunciado a existência do site, dizendo que o mesmo era gerido em horas de expediente.A empresa, justificando que aquela situação lesava a relação institucional com a câmara, até porque necessitava desta para legalizar algumas situações pendentes, despediu o autor do “blog” sem sequer tentar saber se o mesmo era ou não gerido no horário laboral. O funcionário esclareceu a situação e comprometeu-se a eliminar a página e acabou por ser readmitidoPassado um mês, e depois de alguns encontros entre o presidente da câmara e a administração da empresa, foi novamente chamado à direcção e colocado perante uma de duas situações: ou se demitia voluntariamente ou seria alvo de um processo disciplinar que, desde logo ficou claro, teria o mesmo resultado. Acabou por escolher a primeira, até porque é um trabalhador com bom nome no mercado e pensou que não seria difícil arranjar outro emprego.Mas não foi assim. Ainda há dias ouviu um eventual empregador dizer-lhe que reconhecia que ele era a pessoa indicada para determinada função mas que não o admitia para não ter problemas com o senhor presidente da câmara.Com 36 anos, duas filhas de 20 meses para criar, carro e casa para pagar e mulher no desemprego, o autor do “blog” foi despedido e não arranja emprego apenas porque exerceu um direito legítimo: a liberdade de expressão.Confesso que não sei se a história é mesmo assim, ou terá outros contornos, mas não me custa absolutamente nada a acreditar na sua veracidade. Do caso do professor Marcelo até ao que se passou na rádio da Covilhã, para falar apenas nos casos mais recentes, são várias as histórias que nos fazem pensar se o nosso tempo é assim tão diferente daquele que se vivia antes da Revolução de Abril de 1974.A PIDE e os presos políticos acabaram mas a liberdade continua a ser bastante condicionada. A semana passada, um alto funcionário de um organismo público disse-me entre um copo e uma bifana comida à pressa. “Ó Guedes, quando quiser falar comigo não me telefone. Apareça e vimos aqui para falarmos mais à vontade”. Ainda hoje estou a pensar naquilo. E não me esqueço que um responsável pelas nossas forças de segurança disse há dias a um diário nacional que metade do país anda a ser escutado.Será que metade de nós somos criminosos? Ou será que a pretexto da segurança e outros conceitos semelhantes nos estão a roubar direitos fundamentais que levaram anos e muitas vidas a conquistar? Hoje em dia há câmaras de filmar em todo lado: na pastelaria onde vamos tomar o pequeno almoço, na loja onde fazemos compras, no parque de estacionamento onde deixamos o carro, e até no local de trabalho. Às vezes temo estar a ser algo paranóico, mas a verdade é que “eles” andam aí…*Jornalista

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