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Despedida por ter idade a mais

Enfermeira do CIRE de Tomar não se conforma e diz que foi saneada após 30 anos de serviço

Uma enfermeira do Centro de Integração e Reabilitação de Tomar diz que foi saneada três dias após a realização de eleições na instituição. O presidente do CIRE refere que a rescisão do contrato se deve apenas à idade de Maria Augusta Costa.

Três dias após a realização de eleições para a direcção do Centro de Integração e Reabilitação de Tomar (CIRE), a enfermeira que há 30 anos prestava serviço na instituição foi afastada do cargo, alegadamente, devido à sua idade, 70 anos.Maria Augusta Costa tem, no entanto, outra versão. Em declarações a O MIRANTE, acusa a direcção reeleita de a ter “saneado” pelo facto de, nos últimos anos, ter deixado claro que a instituição precisava de “sangue novo” na direcção.O nome da enfermeira, também eleita para a assembleia municipal pelo PS, não constava da lista que se apresentava como alternativa à manutenção da actual direcção do CIRE. Mas o facto de apoiar uma renovação na instituição pode ter sido o bastante para ser afastada.Um afastamento que não surpreendeu Maria Augusta, uma vez que, diz, antes das eleições alguns funcionários já a teriam avisado de que estava “queimada”. Foi a forma como o processo foi feito que a deixa indignada.“No dia 16, véspera das eleições, houve a festa de Natal do CIRE e parecia estar tudo bem. Ninguém me disse nada, assim como no dia seguinte, quando fui votar”, refere, adiantando que, por esse facto, foi com surpresa e indignação que, na terça-feira seguinte, dia 20, recebeu via correio a carta de rescisão do contrato.“Dei 30 anos de mim àquela casa, merecia ser tratada de outra forma”, diz quem sente ter-se tornado “um estorvo” nos últimos anos, pelas posições frontais que assumiu. “Nunca escondi que apoiava uma renovação da direcção, porque 18 anos é muito tempo e há vícios que se adquirem”.Maria Augusta lamenta também que Luís Bonet, o presidente da direcção que assinou a sua carta de demissão, não lhe tenha dito nada. “Quando recebi a carta fui a casa dele e disse-lhe, frontalmente, que não esperava ser tratada assim por quem considerava um amigo, por quem fiz campanha eleitoral (Luís Bonet foi presidente da Câmara de Tomar no início da década de 80) e sempre estive ao lado dele”, refere a enfermeira, adiantando que o director lhe disse que não mandava nada no CIRE. Uma afirmação que Maria Augusta já há muito tempo sabia. “Quem manda na instituição são as coordenadoras, elas é que põem e dispõem”, refere.Ao nosso jornal Luís Bonet desdramatizou a situação, afirmando que foi apenas devido à idade de Maria Augusta Costa (70 anos) que o contrato foi rescindido. Uma posição curiosa vindo de um dirigente que conta 84 anos.Em Setembro de 2003, a direcção aprovou uma norma interna que estabelece os 70 anos como limite de idade para desempenho de funções na instituição. Mas em Janeiro do ano passado, quando Maria Augusta atingiu essa idade, o médico de serviço no CIRE, Luís Cochado, fez questão de continuar a ter os serviços da única enfermeira especializada em saúde mental e psíquica existente na instituição.A direcção acabou por dar razão ao médico, tendo ficado em acta (acta nº 824) a continuidade de Maria Augusta no cargo, a título excepcional, uma vez que o médico “atestava a qualidade das suas funções e a necessidade das mesmas, chamando particular atenção para a dificuldade em encontrar no mercado local técnico com formação académica e experiência similar e, sobretudo, disponibilidade de horário, por ser reformada”.Na mesma acta ficou também assinalado que o contrato seria objecto de análise e renovação anual. “Já nessa altura eles queriam correr comigo pelo facto de eu não me calar relativamente a situações que considerada menos transparentes”, refere a enfermeira.“A realização de eleições e o facto de não esconder que apoiava uma renovação da casa foi a desculpa que precisavam para me mandar embora, com receio de que eu abrisse a boca, mais cedo ou mais tarde”, (ver texto ao lado) diz quem deu 30 anos da sua vida ao CIRE. Margarida CabeleiraPrivilégios, compadrios e ligações perigosasPrivilégios não lícitos obtidos por parte das coordenadoras, móveis feitos por alunos para funcionários a título gratuito, um porteiro que “virou” professor de educação física, compadrios e algumas ligações perigosas. Estas são situações que, segundo Maria Augusta Costa, acontecem há anos dentro das instalações do Centro de Integração e Reabilitação de Tomar (CIRE). A antiga enfermeira da instituição, agora despedida, diz que as coisas tomaram maiores proporções nos últimos anos e que nunca denunciou as situações com receio de que as crianças acabassem por ser penalizadas. Mas, como refere, nunca pactuou nem concordou com o que lá se passava e sempre fez questão de o dizer, alto e em bom som. É, por isso, diz, que era considerada como um “estorvo” por parte da direcção e das coordenadoras da instituição que são, garante, “quem realmente manda lá”.Maria Augusta Dias fala em compadrios na colocação de alguns amigos dos membros da direcção dentro da instituição e refere mesmo um caso concreto, que foi muito falado na altura.É o caso de António Henriques da Silva, ex-tesoureiro da Junta de Freguesia de São João Baptista, que foi “levado” para o CIRE pela mão de José Júlio da Silva, quando este deixou a presidência daquela junta.A função inicial dada a António Henriques da Silva foi a portaria da instituição. Mas rapidamente passou a ser professor de ginástica dos alunos. Com 50 anos e sem qualquer curso nesta matéria. “O único curso que tirou à posteriori, pelo menos diz que tirou, foi o de animador cultural”, refere Maria Augusta Silva.A mesma fonte relata outras situações, como o facto da carpintaria da instituição ter executado móveis para casa de “altos funcionários”, ou destes receberem prendas em ouro por favores prestados a pessoas exteriores ao CIRE. Situações confirmadas ao nosso jornal por outros funcio-nários, encobertos pelo anonimato com receio de represálias.São estes “ganhos indirectos”, como lhes chama a enfermeira agora despedida, que deveriam ser alvo de auditoria, nomeadamente, por parte da Segurança Social. O MIRANTE tentou obter uma reacção do presidente da instituição, mas Luís Bonet recusou-se a tecer quaisquer comentários sobre estas acusações.Desiludida com o partidoMaria Augusta Costa nunca pensou que uma questão profissional “virasse” um caso partidário. A enfermeira refere ter recebido um telefonema de um membro da concelhia do PS, partido pelo qual é deputada municipal, acusando-a de ter apoiado, tacitamente, a eleição de uma direcção cujos membros eram, maioritariamente, do PSD.“Não posso admitir que ao fim de tantos anos de contributo ao PS me venham agora com lições de moral”, diz a enfermeira, adiantando que o seu partido misturou coisas que não podem ser misturadas.“A lista concorrente até podia ser da CDU, ou do Bloco de Esquerda. Não estava em causa de que partido eram as pessoas que apresentavam uma alternativa para o CIRE, o que estava em causa era as suas motivações e a sua estratégia futura para a instituição” afirma, acrescentando ter ficado desiludida com a posição tomada por dirigentes do PS.Felizmente, diz, que há elementos do partido com algum discernimento, que perceberam que as eleições numa instituição particular de solidariedade social nada têm que ver com questões partidárias.

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