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“Tive que provar a dobrar aquilo que valia”

“Tive que provar a dobrar aquilo que valia”

Rodrigo Santos, invisual, é animador de rádio na Ribatejo FM

Deixou para trás um curso de direito e muitos preconceitos e lançou-se no desafio de fazer rádio. Para Rodrigo Santos, 26 anos, a cegueira nunca foi uma limitação. É a sua voz que se ouve do outro lado da antena nas manhãs da Ribatejo FM, que emite a partir de Azambuja.

Na manhã de uma segunda-feira o ouvinte anónimo que segue ao volante do seu carro, algures no Ribatejo, esboça um sorriso. Rodrigo Santos acaba de partilhar em antena que grande parte das mulheres condutoras aproveita o trajecto de automóvel até ao emprego para se maquilharem. É com estas e outras histórias curiosas que o animador de rádio cumpre todas as manhãs a missão de entreter quem sintoniza a frequência 92.2 FM. Para o jovem, de 26 anos, a cegueira não é uma limitação. Rodrigo Santos é também produtor de conteúdos da emissão, coordenador musical da estação e tem ainda a seu cargo a gestão de todo o parque informático da rádio. O programa de síntese vocal com que trabalha permite aceder a toda a informação disponível no computador. Antes de entrar no ar o animador ouve o texto que escreveu no computador e segundos depois transmite ao ouvinte as histórias que recolheu. É um trabalho que exige grande capacidade de memória e improviso, mas Rodrigo Santos considera que até pode ser uma vantagem não estar demasiado agarrado ao papel. Por vezes recorre à impressora em braille e leva a informação em papel para a cabina.O contacto com algumas personalidades do mundo radiofónico, algumas das quais com as mesmas dificuldades, ajudaram-no a ultrapassar algumas barreiras. O pai do animador trabalha com computadores desde 1972 e desde cedo que Rodrigo Santos teve contacto com as novas tecnologias.Todos os dias o animador chega à rádio, sediada em Azambuja, onde reside, às sete da manhã. A “obrigação” de madrugar é o que mais custa ao animador que se confessa um apaixonado pela comunicação. Seguem-se três horas de trabalho em estúdio e muitas outras nos bastidores da rádio. Na rubrica diária “Notícias da Música”, que vai para o ar de segunda a sexta às 11h00 e ao domingo às 10h00, vai divulgando pedaços de informação que ajuda os ouvintes a formar uma opinião.A escolha das músicas para a rádio, com um perfil muito marcado de anos 80, é um dos trabalhos que mais lhe agrada. “É muito bom descobrir uma música que não ouvíamos há muito tempo e partilhá-la com o auditório”.O fascínio pela rádio começou muito cedo, quando ainda criança simulava emissões em casa e produzia programas para os amigos da rua com um microfone sem fios. A grande oportunidade surgiu em 1996, quando a rádio Ateneu, de Vila Franca de Xira, ofereceu estágios. Deixou para trás um ano do curso de Direito, que ainda espera completar, e aceitou o desafio. “Soube mais tarde que a minha situação criou problemas de consciência a muita gente, mas acabei por ficar por considerarem que tinha alguma aptidão”, recorda.Depois de uma passagem pela Rádio Lezíria, Rodrigo Santos acabou por aceitar o convite de integrar os quadros da Ribatejo FM, onde está há cinco anos. A empresa proprietária da rádio adquiriu o equipamento específico com a ajuda de apoios estatais que estão previstos na lei.“Ajudou muito a lógica da empresa que percebeu que ao permitir este emprego não estava a ter nenhuma quebra de produção e que eu era um elemento tão válido como outro qualquer. Faz falta às vezes que o tecido empresarial se dispa de preconceitos”.Rodrigo sentiu que muitas vezes teve que fazer o trabalho duas vezes. “Sempre entendi que se tivesse direito a um lugar seria por provar a minha própria capacidade contra tudo e contra todos. Tive que provar a dobrar aquilo que valia, não só pela competência profissional, mas para justificar que a deficiência não é entrave a nada”.No dia a dia Rodrigo Santos faz questão de ser transparente com o ouvinte. Tal como António Sala, acredita que o grande segredo para trabalhar bem no horário da manhã é imaginar que está à sua frente o ouvinte tipo. “Se estou a falar para um taxista tenho que imaginar que vou no táxi. Se estou a falar para um agricultor tenho que imaginar que estou no campo ao pé do agricultor ou junto do empregado de escritório que acaba de chegar cheio de sono...”.Ana Santiago
“Tive que provar a dobrar aquilo que valia”

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