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A terra como modo de vida

António Graça, agricultor e empresário de Riachos, desafia a crise do sector

António Graça está ligado à terra desde criança. E continua apaixonado pela magia do campo e pela agricultura, a que decidiu dedicar-se a tempo inteiro. Tem cerca de 70 hectares de terra por sua conta e uma empresa familiar para gerir, em Riachos, juntamente com a mulher e os três filhos.

O despertador toca impiedosamente, todos os dias, antes das seis e meia da manhã. Está dado o alerta para mais uma jornada. António Graça, já se habituou e sabe que o dia de um agricultor tem de começar ao nascer dos primeiros raios de sol. E soube-o cedo. Cresceu debaixo das bancas do mercado onde via o pai vender fruta e percebeu desde logo que aquela vida não era fácil. Ainda assim, foi esse o caminho que escolheu. Aos 56 anos de idade, passa os dias entre o trabalho no campo e a gestão da sua empresa de distribuição de produtos agrícolas e hortícolas. Hoje, se voltasse atrás, não sabe se voltaria a traçar o mesmo destino, mas não tem dúvidas quando afirma que continua apaixonado pela magia do campo, pelo cheiro da terra, pela dureza da agricultura. Ainda criança, sonhava com o dia em que se tornaria hoquista profissional. Os patins foram companheiros inseparáveis, mas a vida trocou-lhe as voltas. Os jogos de hóquei deram lugar ao trabalho nos mercados. “Quando comecei a fazer o mercado de Leiria sofri na pele os dissabores desta vida. Tínhamos de ir para lá ainda de noite para apanhar os bons lugares. Passávamos tanto frio que tínhamos de pôr os carros a trabalhar para aquecer a cabine”, conta António Graça.Nessa altura, tinha um pequeno pomar e comprava laranjas que vendia na ponte da Chamusca. O negócio era ainda embrionário, mas depressa se desenvolveu e deu lugar a um investimento maior. Aos 30 anos, percebeu que poderia tirar partido da terra. Foi então que apostou forte na agricultura. Hoje, tem cerca de 70 hectares de terra por sua conta e uma empresa familiar para gerir, em Riachos, concelho de Torres Novas, juntamente com a mulher e os três filhos.“É uma vida muito dura. Se o dia tivesse 48 horas, eram essas horas que eu passava a trabalhar. Ora a lavrar, ora a gradar, ora a vender ou a cortar couves. Mas isto entusiasma, porque não é um trabalho enfadonho. Fazem-se muitas coisas diferentes”, explica o agricultor. Quase todos os dias, António Graça, faz a distância dos Riachos até Lisboa, para descarregar mercadoria no Mercado Abastecedor da Região de Lisboa (MARL), onde vende os seus produtos. É também fornecedor de uma grande superfície da região de Santarém e continua a marcar presença nos mercados locais. Por detrás da vertente comercial estão horas dedicadas ao cultivo das terras, à sua manutenção, à colheita dos produtos e à preparação das encomendas. Um trabalho que pode durar até altas horas da noite: “Muitas vezes saio de casa perto da sete da manhã e só chego depois da uma hora da madrugada. Nós não temos horários. Quando há trabalho, não se pode estar a olhar para o relógio”, diz António Graça.É que o tempo de crise não se coaduna com a preguiça e para responder às dificuldades que o sector agrícola atravessa é preciso lutar com a única arma possível: o trabalho. Uma realidade que não assusta este agricultor, mas que o intimida quando pensa no futuro dos filhos. “Fui eu que incentivei os meus três rapazes a seguirem este caminho. Puxei-os para a agricultura, mas parece-me que os puxei para o mal. O nosso trabalho não está a ser compensado. Os hábitos alimentares mudaram, e as pessoas agora gostam é da comida de plástico”, lamenta.Mesmo assim, António Graça continua a lutar por um lugar ao sol nos meandros da agricultura ribatejana. Porque o campo o desafia, porque a agricultura lhe provoca emoções controversas que se confundem num misto de amor e ódio. Porque “cada dia é um dia, e os problemas têm de ser ultrapassados, um de cada vez”.Carla Paixão

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