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Avós e netos na Festa da Flor

Avós e netos na Festa da Flor

Duas gerações em convívio no Palácio da Quinta da Piedade

Avós e netos encontraram-se no jardim do Palácio da Quinta da Piedade, na Póvoa de Santa Iria. A Festa da Flor celebrou a Primavera e o convívio entre gerações.

Maria Antónia Gouveia, 81 anos, procura uma sombra no jardim do Palácio da Quinta da Piedade, na Póvoa de Santa Iria. A sobrinha neta, Daniela, seis anos, senta-se ao seu lado, debaixo de uma árvore grande onde corre uma aragem na manhã solarenga de quarta-feira, 17 de Maio. Já se respira o ar da Festa da Flor. O evento celebra a primavera, mas também o convívio entre gerações de anciãos e crianças do concelho. Há muito que Maria Antónia Gouveia e Daniela seguem essa filosofia de forma espontânea. Mais de sete décadas separam o tempo das duas, que apesar da diferença de idade se sentem amigas como ninguém. Maria Antónia vive em Lisboa, mas vem regularmente à Póvoa de Santa Iria para estar com Daniela. Já não consegue viver sem o sorriso da neta, que trata como se fosse filha. Daniela também espera com ansiedade a visita da tia-avó. Partilham segredos, passeiam, brincam, dançam e cantam juntas.“Quando a Daniela era pequena eu já ficava com ela. Dava-lhe o biberão e mudava-lhe a fralda para a mãe poder trabalhar ao fim de semana. Agora já é crescida, mas adoro-a”, diz com ternura Maria Antónia. Aproxima-se a hora do almoço. O jardim do palácio é um mar colorido de bandeirinhas e flores de todos os tons e feitios. Na barraquinha da fruta distribuem-se maçãs e bananas para o piquenique do meio-dia. Assam-se sardinhas e febras na brasa. Os mais velhos matam o tempo com os jogos tradicionais que vão ensinando aos mais jovens. Aida Azevedo, 71 anos, olha com ternura para as crianças de camisolas coloridas que aguardam a vez de entrar em palco e recorda os seus tempos de infância. A época era outra, as famílias viviam com poucos recursos e as crianças eram chamadas a trabalhar cedo.“Trabalhei tanto… Ainda era pequena e já ia para o campo cortar erva para as vacas e ovelhas e guardar o rebanho. Por isso agora estou estoirada”, diz a mulher natural de Amarante que há meio século rumou a Lisboa com o marido e com a filha para procurar melhor sorte numa fábrica de refrigerantes dos arredores da capital. Vive no Bairro dos Quintais na Póvoa de Santa Iria. No campo não havia tempo para brincar, trabalhava-se, garante Aida Azevedo enquanto improvisa um ramo de flores silvestres num jarro de barro sobre a mesa do piquenique. Maria da Luz Alvarenga nasceu em Lisboa e por lá ficou toda a vida. Só há quatro anos foi morar para o Lar do Centro Social e Paroquial Casa de S. José na Vala do Carregado, na Castanheira do Ribatejo. A menina da cidade que se passeia pelo jardim do palácio, na frescura dos seus 94 anos, lembra as brincadeiras que fazia com o irmão no interior do apartamento no centro da capital.“Colocávamos as cadeiras da sala de jantar todas perfiladas no corredor. E o meu irmão fazia de conta que era o cobrador do carro eléctrico”, conta numa lucidez invejável.Escolheu uma saia leve em tons laranja para o encontro de quarta-feira. O boné claro protege-lhe a cabeça do sol. Maria da Luz sabe bem o que levar nos passeios. É reformada de uma empresa de seguros onde prestou serviço dos 16 aos 62 anos. Nunca casou. Não teve filhos. Viveu com uma meia-irmã até encontrar a “sua última morada”, o nome que dá ao lar onde mora e onde é tratada com carinho.A antiga escriturária conheceu a Rússia do tempo de Lenine, pisou a terra das oportunidades do outro lado do oceano, onde vivia o pai, e foi vezes sem conta à cidade Luz. “A certa altura Paris já me aborrecia”, diz quem tem uma mão cheia de quase um século de recordações.Ana Santiago
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