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Uma vida construída a pulso

João Salvador, o simpatizante comunista que se tornou empresário de sucesso

Personagem multifacetada, João Salvador é uma figura da história contemporânea de Tomar. Empresário que conheceu altos e baixos, chegou a envolver-se nos mundos da política e do futebol mas não ficou com saudades. O homem que começou a fortuna a vender areia do rio Nabão tem hoje um pequeno império na área da construção e obras públicas.

Nunca se arrependeu de ter deixado a escola aos 12 anos?Não. Havia tanta gente a estudar que pensei que não estudar também traria vantagens. Enquanto um indivíduo anda a estudar, o outro está a trabalhar e também está a formar-se. Posso ter perdido por não estudar mais, mas não vi os meus colegas que entretanto estudaram ganhar mais do que eu.A veia para o negócio foi herdada do seu pai?É um pouco genética, mas também é por formação. Não me formei na escola, tive que arranjar outro tipo de formação. Formei-me na vida, na prática.Já cometeu alguma grande “argolada” nos negócios?Raramente o fiz, porque sou um indivíduo que pensa muito. Até já tenho perdido negócios por pensar de mais. Se em determinada altura fosse mais atrevido, podia ter hoje muito mais.Mas podia também ser mais uma das empresas de Tomar que foram grandes e entretanto desapareceram.Pois. Na minha vida há uma pessoa em que me inspirei muito, que foi o Champallimaud. Foi de tal maneira que cheguei a pensar fazer uma fábrica de cimento em Portugal.E não fez porquê?Tinha comprado uma propriedade onde havia matéria-prima e tinha uns cunhados do meu irmão que trabalhavam para o Champallimaud que eram excelentes profissionais. Como nessa altura o Estado não autorizava que se fizessem mais fábricas de cimento, tinha pensado traduzir essa ambição numa fábrica de cal que era tão boa como o cimento. Ia ter sucesso com certeza. Mas veio o 25 de Abril e estragou-me os planos.Ficou com muitos projectos estragados pela revolução?Tinha um projecto para investir em África, tinha esse projecto da fábrica que certamente ia resultar em pleno e tinha outras ideias…Com tantos desaires no pós-25 de Abril como é que geriu isso com a simpatia que tinha pelo PCP?Eu praticamente só fui comunista antes do 25 de Abril. A partir daí comecei a deixar de ser. Quando vi os desacatos e as posições do PCP deixei de ter essa simpatia.A burocracia é opior cancro do paísConsidera-se uma pessoa que subiu na vida a pulso?Sim. Subi na vida a pulso. Nunca tive subsídios da CEE. E ainda hoje critico de uma maneira feroz o Estado, pela maneira como dificulta tudo. A burocracia é o pior cancro que temos no país.Porquê?Quando me meto num investimento tem que ser na altura própria. Se os projectos demoram muito perdem oportunidade. E as oportunidades ou se ganham ou se perdem. Se eu me meto agora num projecto a pensar que só daqui a dois anos é que tenho dinheiro para investir, perco a oportunidade.Começou a construir fortuna em Lisboa com o negócio da construção, mas acabou por investir e voltar a Tomar. É um homem apegado às raízes?Gosto muito de Portugal e gosto muito de Tomar.Não consegue deixar de viver aqui?Não consigo. Estive em Lisboa alguns anos mas depois vim para aqui. Nasci aqui e é aqui que quero viver.Quantas horas é que dedica aos negócios por dia?É desde as oito da manhã até às dez da noite. Raramente janto antes das dez e meia da noite.E a sua esposa não ralha consigo?Ela ralha, mas já está vacinada (risos)…E como é que a compensa?Dando-lhe algum carinho e alguma atenção. É uma pessoa modesta.A sua esposa também se envolve nos negócios? Os seus sucessos também são os sucessos dela?Não. Pelo contrário. Ela queria é que não me metesse em tanta coisa. Sabemos que costumava emprestar dinheiro para ajudar amigos e familiares. É uma pessoa que gosta de praticar o bem?A vida de cada um tem as suas características. Há pessoas que se sentem bem só a fazer mal. Eu sou o oposto desse tipo de pessoas. Mas se soubesse que iria ser penalizado nalguns casos, como fui, não teria agido assim.Mantém relações com essas pessoas que lhe devem dinheiro?Engoli alguns sapos e continuo a falar-lhes. Sei que alguns não me pagam porque não podem. E não se ganha nada em criar inimizades.E quando são as câmaras, por exemplo, a dever-lhe dinheiro. Tem muitos milhares por aí espalhados?Já tive mais. Só na Câmara de Santarém cheguei a ter lá mais de meio milhão de contos uma data de tempo. A Câmara de Tomar também me deveu cerca de meio milhão de contos mais de um ano. Por os ter estado a financiar ainda tive que pagar juros. E isso descompensou-me na tesouraria.Os seus negócios têm altos e baixos consoante os ciclos eleitorais?Sem dúvida. Quando há eleições há muito mais obras.João CalhazMargarida Cabeleira

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