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Uma mulher no corta mato

Catarina Borges trabalha numa actividade quase exclusiva de homens

Começou por brincadeira, para provar à mãe que era capaz. Hoje Catarina Borges não quer outra coisa e revela que o seu futuro profissional está na limpeza florestal. Uma área quase exclusiva de homens de barba rija.

Tem pouco mais de 1,60 metros e 55 quilos de peso. Mas força suficiente, diz, para agarrar numa roçadora e andar um dia inteiro a cortar mato. Catarina Borges, 28 anos, é das poucas mulheres a fazer este tipo de trabalho, quase exclusivo de homens de barba rija.É por isso que, quando os seus clientes a vêem chegar, mostram surpresa e muitas vezes ficam cépticos relativamente ao seu desempenho. “Já me acostumei” diz a jovem de Tomar, adiantando que o trabalho final é a melhor prova das suas capacidades.Desistiu de estudar no 10º ano, altura em que iniciou um curso profissional de topografia, que ficou pelo caminho. Experimentou então outra área e, ainda em termos profissionalizantes, concluiu o curso de práticas administrativas. Porque acredita que o 12º ano lhe faz falta inscreveu-se à noite para o tirar no próximo ano lectivo.À noite, porque de dia Catarina Borges pretende continuar a exercer a sua profissão – fazer limpezas florestais. Uma actividade que começou a praticar apenas há sete meses, quase por brincadeira. “Moro numa quinta com quatro hectares e em Janeiro disse à minha mãe que iria tratar da limpeza do terreno”.Contra o cepticismo inicial da progenitora, Catarina acabou mesmo por fazer toda a desmatação da quinta, fazendo “inveja” à vizinha do lado, que lhe pediu para limpar também o seu terreno.“Eram três hectares que não viam uma roçadora há já 20 anos, altura em que houve ali um incêndio”, diz Catarina, adiantando ter sido talvez o espaço que mais trabalho lhe deu. “Levei dois meses a cortar erva e mato mas valeu a pena”, refere a jovem.Catarina define-se como “amiga do ambiente”. Não foi por acaso que no ano passado fez voluntariado na vigilância das florestas na zona de Tomar.O trabalho pesado não lhe mete medo. “O que me mete medo é ver tudo a arder e pensar que daqui a alguns anos posso não ter oxigénio para respirar”, diz para quem a melhor satisfação que pode tirar da profissão é ver um terreno todo limpinho, só com árvores. “Até apetece deitar no chão”.A limpeza florestal é uma actividade sazonal, restringida aos meses de Inverno e Primavera, altura em que é permitido fazer queimadas. Por isso Catarina Borges diz ser “como as formigas”, tem de amealhar nesses meses para ter um Verão descansado.“Só quando comecei nesta profissão é que tive a noção da quantidade de pessoas que trabalham nesta área”, refere a jovem, adiantando ser a única mulher na zona a fazer aquele serviço.Catarina trabalha essencialmente com roçadoras mas também agarra em motoserras e em outras máquinas agrícolas. “Trabalho com o que for preciso”, diz.Em Abril deste ano foi contratada para limpar o espaço por detrás da cafetaria do Convento de Cristo. O mato que por lá viu levou-a a apresentar um projecto aos responsáveis do convento. “Propus-me limpar a Horta dos Frades, que estava cheia de erva e mato”. A proposta foi preterida por haver outra mais abrangente, segundo a informaram.A última limpeza que fez foi na Costa da Caparica. A proprietária solicitou-lhe uma intervenção no jardim. “Estava completamente cheio de cactos aloés de grande dimensão, de tal modo que a senhora já não conseguia passar para casa”.Catarina não usa nenhuma roupa especial quando vai para o terreno. Umas jardineiras, de ganga ou tecido, uma camisola e botas, sempre. O que não pode faltar é o equipamento de protecção – capacete com viseira de rede e luvas.Auscultadores não usa, porque lhe fazem impressão. “Gosto de ouvir o barulho da máquina para saber quando é que ela está cansada”, refere.Os “manuais” da limpeza florestal mandam os trabalhadores pararem a cada meia hora. Catarina costuma trabalhar uma hora seguida, fazendo então um intervalo de 20 minutos, para dar descanso à máquina.O custo do seu trabalho depende muito do tipo de vegetação e da intervenção que ali tiver de ser feita. “Custa mais cortar mato que palha, por exemplo. O mato requer muito mais esforço físico”. Mas é precisamente cortar mato que mais gosta de fazer. “Cortar palha é quase andar a passear, não dá gozo”.Aos 28 anos Catarina Borges tem uma certeza – o seu futuro profissional passa pela limpeza das florestas. E tem já planos para a constituição de uma empresa com uma sócia. Porque quer levar a sua actividade para fora do concelho de Tomar.Margarida Cabeleira

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