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Dorme na estação de comboios para ir ao médico

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Idosa não tem dinheiro para pagar transporte de casa a Vila Franca de Xira

É no banco da estação de comboios ou do hospital que Maria Carminda, 65 anos, passa a noite sempre que tem tratamento às pernas. A pensão é baixa e não chega para pagar transporte até ao centro de Vila Franca de Xira.

Uma idosa de 65 anos, que vive sozinha nos arredores de Vila Franca de Xira, pernoita várias vezes nos bancos públicos da cidade por falta de dinheiro para o transporte entre a casa e o centro de saúde onde faz tratamento.As duas pernas de Maria Carmina Rafael Pinto estão ligadas e o problema que tem na anca dificulta-lhe a locomoção. A idosa movimenta-se lentamente com a ajuda de duas canadianas.As dificuldades de mobilidade impedem que a idosa se desloque de autocarro. A única solução é chamar um carro de praça que custa demasiado dinheiro à parca reforma de Maria Carmina.A pensão que recebe não chega a 100 euros e ainda tem que dar para pagar a renda de uma pequena casa térrea em Monte Gordo. Os medicamentos e as senhas de refeição a um euro que consome nos serviços sociais da autarquia levam-lhe todo o sustento que nunca chega ao final do mês.Os seus dias são passados quase sempre no banco do jardim Constantino Palha, em Vila Franca de Xira. É fácil identificar a mulher de pernas brancas das ligaduras e gabardina preta sobre a coluna vergada dos anos de trabalho. Os olhos estão postos no Tejo. Maria Carmina recorda sempre os tempos de juventude em que trabalhou na casa senhorial do mouchão da Póvoa de Santa Iria.Primeiro tratava dos filhos dos patrões. Depois a cozinheira casou e Maria Carmina passou para a copa. “Conheci as pessoas da alta de Vila Franca”, diz orgulhosa.Continuou a trabalhar como empregada interna em casas abastadas de Vila Franca de Xira e Calhandriz. Saía de 15 em 15 dias para ir ter com a mãe. “A patroa oferecia-me um vestido de cada vez que ia ao baile. Dizia: deixa cá ver o que posso arranjar-te para ires jeitosa”, diz Maria Carmina enquanto compõe o lenço cinzento fechado sobre o cabelo.“Quem me dera esses tempos”. A Maria Carmina custa-lhe recordar essa época. De repente pára a conversa e pergunta o porquê da entrevista. Tem medo de ser enganada ou motivo de chacota. Não percebe o interesse. Acha que foi o chefe de estação que mandou alguém por passar muitas noites ali abrigada. Maria Carmina Rafael Pinto não recusa a entrada numa instituição. Gostava de ter um espaço digno para ficar mais perto dos tratamentos. Mas o que mais quer é ser operada à anca para se curar do problema e continuar a trabalhar. “Trabalhei no campo, fiz limpezas e ainda há uma senhora de Vila Franca de Xira que está à espera que melhore”, diz a mulher animada pela ideia de poder voltar a andar como antigamente.Maria Carmina almoça muitas vezes no refeitório social da Divisão de Saúde e Acção Social da autarquia.“Não tenho mais ninguém”, diz a idosa. O marido faleceu há mais de 10 anos. A mãe e o pai há muito que seguiram pelo mesmo caminho. Maria Carmina nunca teve filhos. Os dois primos da zona de Lisboa alheiam-se do problema.Contactada pelo nosso jornal a directora do Departamento de Habitação, Saúde e Acção Social da Câmara de Vila Franca de Xira, Carolina Carvalho, explicou que a idosa tem uma vaga aberta no lar da Santa Casa da Misericórdia desde 16 de Agosto, mas tem recusado ser institucionalizada por se considerar ainda independente.“O caso está a ser acompanhado, mas a senhora teima em não aceitar a vaga. Acreditamos que com ainda este mês, com a chegada do tempo mais frio, reconsidere”, disse ao nosso jornal Carolina Carvalho.Ana Santiago
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