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A minha vida não dá para alimentar a imprensa cor-de-rosa

Há quem diga que as cantoras, após a primeira gravidez, ficam com uma voz diferente. Alguma vez lhe disseram que a sua voz mudou desde que nasceu o seu filho Martim? Parece-me uma teoria bizarra. Senti que durante a gravidez a minha voz era diferente mas isso foi compreensível. Tinha aquela barriga enorme a pressionar-me o diafragma.Mas a sua voz está diferente. Basta ouvir com atenção os primeiros discos e os de agora. Isso é verdade mas a minha voz não mudou devido à gravidez. A minha gravidez é que coincidiu com um período de mudança. Tive o meu filho aos 32 anos. Deixei de ser uma menina. A voz aprofundou-se. Tem mais consistência. Está mais madura. Não tem a ver com maternidade, tem a ver com maturidade.Em palco também está mais sóbria. Não há tanta teatralidade.Eu sou uma pessoa sóbria. Já li que sou hiper-sensual e coisas assim mas nada do que fazia ou faço em palco é fabricado. Não ensaio ao espelho. Não há encenação. Moldo-me à música e aos músicos que estão comigo. É algo natural, intuitivo. Estou a ser confrontada com essa observação pela primeira vez. Tenho que reflectir sobre o que me está a dizer. É uma novidade para mim. Quem está a tratar do seu guarda-roupa? Difere de espectáculo para espectáculo. Os vestidos para o Ulisses foram feitos pelo Manuel Alves e pelo José Manuel Gonçalves. Tudo muito Diva. Muito colorido. Um vestido era verde e o outro rosa muito forte. Tudo muito voluptuoso. Agora com o Dino Alves e o Luís Buchinho é diferente. Um é mais clássico e outro mais grunge. Não é nada Amália. Gosta dos vestidos da Mariza? Não, não têm nada a ver comigo. Eu não sou exuberante. Não gosto muito de dar nas vistas. Sente-se retratada naquilo que sai na imprensa a seu respeito? É raro. Os grandes jornais nacionais têm tendência a empolgar certas coisas devido a estratégias editoriais e comerciais. Fabricam grandes histórias a partir de pequenos episódios sem importância. Fazem-me parecer aquilo que não sou. Penso que a imprensa regional acaba por me retratar melhor. Há um maior cuidado. Eu sou a pessoa mais desinteressante que há para entrevistar. Não tenho um percurso de vida empolgante. O seu percurso artístico é interessante. Na realidade as coisas aconteceram muito depressa e continuam a acontecer mas a minha vida não tem os ingredientes de que se alimenta certa imprensa. Em minha casa não havia artistas. Não havia tradição musical. Tenho uma vida discreta. Eu não faço televisão. Nem imprensa cor-de-rosa. É muito raro fazer televisão. A qualidade da televisão em França por exemplo ao nível da música é outro mundo. Não faço televisão. Não dou entrevistas à imprensa cor-de-rosa.Porque não faz televisão?Eu sou uma artista séria, não brinco às cantigas e não gosto que as pessoas encarem a minha música como uma pastilha elástica que se consome e deita fora. Em Portugal, na televisão, somos tratados assim, como um produto de consumo imediato onde não se regressa. Ir à televisão só porque vou ser vista por muitos milhares de pessoas não me interessa. Não tenho interesse nenhum em ser reconhecida na rua. O meu interesse é que as pessoas oiçam a minha música e que percebam o que eu ando aqui a fazer. Um dia destes ouvi uma rapariga dizer que tinha decidido cantar fado porque era o que estava a dar. Essa não é a minha atitude. Como vê a crítica em Portugal? Praticamente não existe em Portugal. Mas a culpa nem é dos jornalistas. Às vezes destacam o jornalista que está disponível para ir fazer um espectáculo. Pode ser da secção de economia ou da secção de política. Não há qualquer preocupação. Apesar de eu ter tido sempre críticas positivas em Portugal esta situação leva-me a duvidar da seriedade do que se faz. Lá fora há muito rigor. É tudo visto à lupa. Por vezes os críticos são severos mas é uma seriedade suportada, justificada, explicada. Já existem boas salas de espectáculos em Portugal? Sim, embora algumas não sirvam para a minha música. A Casa da Música, por exemplo, é um sítio fantástico para uma orquestra sinfónica, por exemplo, mas com uma acústica terrível para a minha música. E também há centros culturais fabulosos, alguns deles – principalmente no Norte de Portugal – com uma programação muito boa. Mas ao nível das salas ainda continuo a achar que se continua a privilegiar a arquitectura em detrimento da acústica. Infelizmente.

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