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Dirigente diz que a Adega Cooperativa da Chamusca foi durante anos “um palco de roubos”

Dirigente diz que a Adega Cooperativa da Chamusca foi durante anos “um palco de roubos”

António Guita salienta que a adega morreu “de doença prolongada” e não de “ataque súbito”
Durante anos António Guita guardou na alma os “podres” da adega cooperativa, responsáveis pelo seu definitivo encerramento, no final do Verão. Mas diz não poder ficar calado perante acusações de quem tenta sacudir agora a água do capote.“Bem ou mal estamos a viver agora dos ossos da adega, porque a carne alguém já a tinha comido antes”. É assim, sem papas na língua, que um dos elementos da direcção cessante da Adega Cooperativa da Chamusca resume as situações que foram ocorrendo nos últimos anos e que levaram ao seu encerramento definitivo este Verão. António Guita está na direcção da adega há mais de uma década. Conhece os “podres” da casa e não admite que alguém venha agora a público afirmar que o fecho da cooperativa se deve à má gestão da direcção cessante. “Não fujo às minhas responsabilidades. Se calhar podia ter aberto a boca há mais tempo mas sempre pensei que conseguíssemos dar a volta por cima”, refere o produtor da Chamusca.Em entrevista a O MIRANTE, António Guita diz que a adega morreu “de doença prolongada” e não de “ataque súbito” e pela primeira vez denuncia publicamente algumas situações que a levaram agora à morte. “Em 1999 desapareceram da adega milhares de litros de vinho e se calhar eu até vi carregarem esse vinho”, afirma, adiantando que nessa altura o presidente da direcção tinha uma política de “quero, posso e mando” e o gerente “era um verbo de encher”. Acusações que o presidente da adega até 1999 não quis comentar. “Desconheço que tenha desaparecido vinho da adega mas quem diz isso deve-o provar”, disse ao nosso jornal Joaquim Cláudio, afirmando estar “de consciência tranquila” sobre a sua presidência na direcção da cooperativa.António Guita diz que se consegue provar o “desvio” do vinho, através da documentação existente no escritório da adega. “Enquanto o escritório não for assaltado, as provas existem”, salienta, adiantando que o escritório “foi sempre a parte mais séria da adega”. Na altura em que deu pelo desaparecimento do vinho, depois de ter feito contas ao que entrou e ao que foi facturado nessa campanha, o produtor deu conta das suas suspeitas – “mais do que suspeitas, eram certezas” – ao presidente da direcção, mas recebeu um encolher de ombros. “Fartei-me de falar do desaparecimento do vinho, na direcção, no escritório e a outros produtores. Na altura falou-se até em fazer queixas à Polícia Judiciária mas foi tudo abafado”.Abafado foi outro dos vinhos que saiu da adega pela “porta traseira”. Pelas contas de António Guita, na última década desapareceram 1500 litros desse vinho, a juntar a outros milhares de aguardente engarrafada. “Durante anos a adega foi um palco de roubos”, denuncia o elemento da direcção, que desabafa: “Levamos tempo a desacreditar nas pessoas”.A complicada herança deixada, a menor produção de uvas e a quebra acentuada no preço do vinho levou a que a morte anunciada chegasse mais cedo. “Se os sócios continuassem a colocar as uvas na adega se calhar tínhamos aguentado o barco”, refere António Guita, lembrando que muitos produtores foram arrancando as suas vinhas ao longo dos últimos anos e outros optaram por as colocar em outras adegas.A má conjuntura no sector, que desde 2000 fez baixar o preço do vinho para menos de metade, deu a machadada final. “Na última campanha pagamos vinho tinto ao produtor a 16 cêntimos e branco a 14 cêntimos”. António Guita é o primeiro a admitir que para os sócios a situação não tem sido fácil. Parte da campanha de 2003 está por pagar, assim como a de 2004, 2005 e 2006. Mas realça que ele próprio é um dos mais penalizados, chegando inclusivamente, em conjunto com outros produtores, a dar o seu aval pessoal para garantir financiamentos bancários. “Neste momento tenho por receber dinheiro correspondente a mais de 506 mil quilos de uvas depositadas na adega”. E o presidente da direcção cessante, José Carlos da Luz, “tem para cima de um milhão de quilos de uvas por liquidar”.António Guita está no entanto convicto de que a venda da maquinaria, já concretizada, e dos edifícios que compõem a adega, que já têm alguns interessados, irá dar para pagar a quem se deve. E amortizar os 750 mil euros de dívida bancária.No final da entrevista lê-se o alívio na cara de produtor da Chamusca. Um alívio por finalmente ter tido coragem de publicamente denunciar o que durante anos guardou na alma. Um alívio superior ao receio do que as suas palavras podem originar. “Há pessoas para as quais a verdade da adega não é para falar”.
Dirigente diz que a Adega Cooperativa da Chamusca foi durante anos “um palco de roubos”

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