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As aventuras do “rei do gado” pelo mundo do futebol

Alves Gomes não foge à polémica e promete voltar com novo projecto

Começou a guardar gado aos cinco anos, no alto Minho. Tirou a quarta classe “mal tirada” graças às galinhas oferecidas à professora. Trabalhou numa carvoaria e na hotelaria até chegar a criador de gado. A paixão pelo futebol foi alimentada no Ribatejo com os projectos frustrados no Benfica do Ribatejo e nos Tigres do Cartaxo. Mas o polémico Alves Gomes garante que vai voltar à carga.

Entrou no futebol distrital como um elefante entraria numa loja de porcelanas: com estrondo. De completo desconhecido passou a nome temido e/ou malquerido. Mas nunca passou despercebido. Em menos de meia dúzia de anos, Alves Gomes deixou marcas no mundo do futebol do distrito de Santarém. Os detractores acham que foram marcas sobretudo negativas. Ele acha que fez o que tinha a fazer dadas as circunstâncias. Esteve envolvido em polémicas com árbitros, com treinadores, com jogadores, com dirigentes. Em 2002 pegou no futebol do Benfica do Ribatejo (Almeirim), então desactivado, e transformou a equipa numa espécie de entreposto de jogadores, muitos deles brasileiros. A intenção era mostrá-los e vendê-los, captando mais valias para o clube. O projecto correu mal e passado ano e meio acabou com a aventura queixando-se das arbitragens tendenciosas. Em 2006, Alves Gomes volta à carga com os Tigres do Cartaxo. Um clube inventado por si, que jogava num campo de futebol construído na sua quinta naquele concelho. A nova experiência durou pouco mais de uma época. Mais uma vez a realidade sobrepôs-se à utopia. Sem receitas de vulto, preferiu acabar com o futebol a acumular dívidas a jogadores, fisco ou Segurança Social. “Sei que não foi simpático desligar a corrente a dois clubes, mas é preferível isso do que deixá-los no estado em que estão alguns”. Mais uma vez ficou-lhe um travo a frustração. E a certeza inabalável de que vai voltar à carga - “não há duas sem três”. Só não sabe onde nem quando.Constantino Alves Gomes nasceu em Monção, no alto Minho, há 63 anos. Diz-se solteiro, com dois filhos e dois netos. Aos cinco anos já ajudava os pais a guardar gado. Filho de agricultores humildes, fez a quarta classe “mal tirada” a troco de umas galinhas que a mãe dava à professora. Aos 12 anos surge a oportunidade de rumar à capital. Deixa o verdejante Minho pela cosmopolita Lisboa, onde vai trabalhar numa carvoaria. Começa aí a paixão fervorosa pelo futebol. É com os jornais desportivos, que devora, que aprende verdadeiramente a ler. O seu espírito empreendedor leva-o a ligar-se ao ramo da hotelaria e mais tarde à criação de gado bovino para abate - umas das suas paixões, como confessa, que provavelmente é uma consequência das raízes minhotas. Há cerca de 30 anos ligou-se à agro-pecuária e estabeleceu-se no Ribatejo, onde hoje vive na Quinta de Santo António, no concelho do Cartaxo. A actividade de criador e produtor de “carne de alta qualidade” levou a que no meio ficasse conhecido como “rei do gado”. Título que ainda hoje recorda.Os negócios não lhe diminuem a paixão pelo futebol. Alimenta-a devorando livros e jornais, assistindo a jogos. Diz que não é nem nunca foi adepto de qualquer clube. Gosta simplesmente da modalidade que diz ser uma arte – “e nessa arte só devem entrar os verdadeiros artistas. Porque há muito chutador de bola e poucos jogadores de bola”.Alves Gomes sabe distinguir as diferenças apenas por meia dúzia de pormenores. Garante a sua aptidão para prospector de talentos, tal como confessa a sua inabilidade técnica para jogar futebol. Sem jeito para praticante dedicou-se à teoria. É uma espécie de enciclopédia ambulante que diz ter na memória todos os acontecimentos marcantes do desporto-rei desde 1955. Desfia nomes de clubes e de jogadores como quem soletra a tabuada.É todo esse conhecimento acumulado que quis colocar ao serviço do futebol distrital. Infelizmente para ele, sem dinheiro não há conhecimento que valha e teve de sair duas vezes pela porta dos fundos. Frustrado mas não convencido. “Sou um homem de coragem e arreganho”, lembra. A sua frontalidade levou-o a entrar em polémicas pouco usuais no futebol da nossa região. Lançou suspeitas de utilização de substâncias ilegais para melhorar a performance dos jogadores e de corrupção na arbitragem. Confessou-se alvo de concorrência desleal por parte de clubes que recebem apoios das autarquias para a formação e gastam esse dinheiro com os seniores. Essas e outras posições polémicas engrossaram a sua longa lista de “inimigos”.O tempo divide-o entre o futebol, os negócios e a família. Não gosta de caça nem de touradas, por exemplo. E muito menos de outras modalidades desportivas. Desporto para si é sinónimo de futebol. Quando lhe perguntamos se é um fundamentalista do futebol, não hesita em responder afirmativamente. “Acho que gasto mais tempo com o futebol que com a família”. Mas isso não lhe traz problemas. “As pessoas mais próximas compreendem que também tenho direito a um certo tipo de liberdade”.De palavra solta e vocabulário variado, não se adivinha no discurso o homem que se afirma “semi-analfabeto e com a quarta classe mal tirada”. Não é homem de rendilhados a meio-campo. Quando tem a palavra usa-a como um ponta de lança que se preze usa a bola: com objectividade e acutilância. Às vezes pode falhar de baliza aberta. Mas muitas vezes marca golo. E são os golos que contam para o resultado. No futebol, passou de vencedor a desistente em duas ocasiões. Nos negócios a vida não lhe correu mal e a sua auto-estima está bem alimentada. “Se tivesse sido aproveitado desde miúdo podia ter sido alguma coisa de relevo e mais útil à sociedade”, afirma.

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