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“Fui uma revolucionária profissional”

Ex-comunista Zita Seabra abriu histórias e páginas do seu livro “Foi Assim” em Coruche
Foi perante um auditório do museu municipal de Coruche a meio gás que a deputada social-democrata Zita Seabra falou do seu livro “Foi Assim” e da sua vivência de comunista convicta, até 1989, altura que saiu do “comunismo e não do PCP”, como fez questão de salientar. À hora do jogo da selecção portuguesa, este sábado, e apesar das entradas livres, não foram muitos os que se mobilizaram para ver Zita Seabra falar a convite do Jornal de Coruche. Nem houve contestação à sua presença ou sinais de animosidade numa terra que já foi considerada um bastião comunista.Mas Zita Seabra fez por isso quando acusou os comunistas de apagarem o passado e quando espicaçou alguns “símbolos” do comunismo actual, como Odete Santos, Jerónimo de Sousa ou Vital Moreira, que classificou de “antifascistas retroactivos”, por só se terem manifestado contra o antigo regime no pós-25 de Abril. “Não me venham dar lições”, acrescentou.De palavra solta, a deputada reconheceu aos comunistas o lado heróico da luta incessante pela liberdade. Em contraponto a um lado trágico, das ideias que defendem e que em todo o lado deram no mesmo, seja Rússia, antiga Checoslováquia ou na China actual. “Fidel e Che Guevara mataram mais gente que Salazar. As vítimas do comunismo no século XX não têm nome nem retrato”. Zita Seabra garante que o livro que escreveu em Óbidos, onde tem casa, não foi fruto de mágoa ou ressabiamento. Na autobiografia conta os seus tempos do comunismo para não perder o passado. “Se não o fosse eu a fazer, ficaria apenas conhecida como a militante comunista a passar para o PSD”, justifica. Perante um público maioritariamente composto por pessoas acima dos 40 anos, a editora diz que escolheu livremente o partido que queria integrar. Considera que os dissidentes saem em geral para a área liberal e não renega o que fez no passado. “É uma desonestidade intelectual fazer isso porque sei onde andei e andámos todos. Defendi a ditadura do proletariado, a colectivização dos meios de produção e a superioridade moral dos comunistas. Fui do Comité Central com gabinete em frente ao de Cunhal”, recorda. Zita Seabra faz o elogio do 25 de Novembro de 1975, a chamada contra-revolução. Recua no tempo e diz ter sido bom que Cunhal perdesse, apesar de apenas reconhecer a derrota com a queda do comunismo na ex-URSS. Salienta a importância de Mário Soares para o país, figura que homenageia no seu livro. E recorda o período pós 25 de Abril, em particular a véspera do 25 de Novembro quando disse a estudantes e assalariados rurais para irem para a cama, porque as forças do outro lado eram mais que eles próprios. “Caso contrário o país seria mais um como muitos no leste europeu”, assegura.A deputada diz-se apenas arrependida do sofrimento infligido aos pais pela saída de casa com 17 anos, para reconhecer que só se percebe essa dor quando se é mãe. “Este é o meu passado. Felizmente que foi derrubado mas fico feliz por ter vivido a minha geração e a conquista da democracia”, constata.Do público surgem as perguntas. Zita Seabra responde a uma senhora que elogia a sua postura mas que lembra os tempos de sofrimento que as ocupações e nacionalizações causaram em Coruche. A deputada, que em 1997 foi candidata derrotada à presidência da Câmara de Vila Franca de Xira, lembra que as revoluções fazem sempre sofrer, apesar dos poucos que sucumbiram com o 25 de Abril. “Sei que prendemos latifundiários, ocupámos terras e fábricas. Fui uma revolucionária profissional. Em Cascais até se prenderam Mellos que não eram os Mellos, só porque ali viviam”, gracejou.Com a Perestroika de Gorbachev lembra-se de um episódio. Numa de três idas a Moscovo estranhou a ausência de cafés nas ruas. Disseram-lhe que era por fazer muito frio, 30 graus negativos. Após a queda do comunismo abriram os primeiros estabelecimentos. “Na ditadura não havia cafés, porque onde os há, existe gente que fala e conspira”, reporta Zita Seabra.

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