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Uma pessoa sensível e que preza a amizade

À hora da entrevista o médico Orlando Lopes acabava de estacionar o carro na Rua Mouzinho de Albuquerque, no bairro Azul, na Chamusca, frente à sua casa. Sai da viatura com uns sacos. Tinha ido às compras. Dá os bons dias com uma grande simpatia e encaminha-se para a porta alta da entrada do edifício de dois pisos de traça antiga, onde sempre morou. Só usa a casa aos fins-de-semana ou nas férias, porque o resto do tempo passa-o na sua casa de Lisboa, onde tem consultório e trabalha de segunda a sexta-feira mas só durante meio-dia. Uma forma de estar entretido.Apesar dos seus 84 anos é uma pessoa enérgica. Sobe com ligeireza a escadaria de madeira, a cheirar a cera, até ao primeiro andar. Abre a porta da sala composta de móveis antigos, com poucos artigos de decoração, sem livros. A casa transparece simplicidade como simples é o entrevistado. Primeiro quer saber que tipo de perguntas vão ser feitas, para se preparar. Depois as palavras vão saindo. Faz umas pausas para se tentar lembrar de datas de episódios de uma vida dedicada à medicina. Veste-se de forma informal. A sala está escura mas a determinada altura levanta-se para abrir as janelas e entrar mais luz na casa de tectos muito altos que faz com que o frio se concentre. Fala numa voz calma, sem vaidades tentando explicar o melhor que sabe o que lhe é pedido. Não se mexe do seu lugar no sofá demonstrando não estar nervoso por dar uma entrevista. Orlando Lopes é a imagem de uma pessoa simples, encantadora, conversadora e que gosta de companhia. Emociona-se quando fala dos amigos que já morreram. Pela conversa de cerca de uma hora fala várias vezes na amizade. Parece ser alguém que ainda preza muito os amigos, que é capaz de abdicar de coisas para preservar a amizade e os valores de uma sociedade fraterna. Não tem pejo em dizer que durante muitos anos as pessoas da Chamusca, de onde saiu muito novo mas onde é uma pessoa conhecida e respeitada, lhe pediam favores. Na altura era médico no Instituto de Oncologia em Lisboa. Apesar de não lidar directamente com o cancro tentava ajudar quem o procurava. Sempre que alguém da sua terra era internado tentava saber o seu estado, dar-lhe mais algum conforto e tentava resolver as dificuldades que apareciam pelo caminho. É parco em gestos, como se as palavras estivessem bem medidas e suficientemente fortes. Só de vez em quando levanta uma mão. Olha as pessoas de frente. Quando fala ou é questionado fixa o olhar nos olhos do interlocutor. Demonstra ser uma pessoa sensível ao longo da entrevista e alguém que sofre sozinho. Não é de desabafar as tristezas que sente quando sabe que alguém que lhe é querido morre. Acredita em poderes superiores que comandam a vida quando tenta arranjar explicações para coisas que sucedem e não descobre a resposta. Nas fotografias mantém o tronco hirto, braços caídos e olhar no infinito. Orlando Lopes é um médico à moda antiga nascido no seio de uma família humilde e não renega as suas origens.

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