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Maria-Rapaz

Por vezes, quando um indivíduo é preso por um qualquer motivo, vêem-se a fazer descobertas de realidades até então desconhecidas.Vem isto a propósito do curioso caso da Maria-Rapaz, nome pelo qual ficou conhecida uma criminosa lisboeta do início do século XX, na alvorada da República.A sua história é relembrada num interessantíssimo livro de Alice Samara: “Operárias e Burguesas”. Na obra, a autora relata a vida de várias mulheres que se destacaram em diferentes escalões sociais. No extremo oposto da Maria-Rapaz, lembra Regina Quintanilha, a primeira advogada do país.Quem mais se interessou pela situação da Maria-Rapaz, a mulher-gatuna foi Pereira de Sousa, Chefe da Polícia. O caso fascinou-o de tal modo que até redigiu umas memórias, onde se reportou a ela, de forma detalhada.O primeiro contacto de Maria com os tribunais deu-se quando ela tinha dois anos de idade. Sucedeu tal em circunstâncias impossíveis de ocorrer hoje.A mãe de Maria encontrava-se sentada no banco dos réus, em conjunto com o seu amante.Sem ter onde deixar a pequena, esta presenciou todo o desenrolar da audiência.No final, os dois réus foram condenados pelo crime de que vinham acusados. Pelo homicídio do marido da senhora, foram enviados para o degredo. Foi a última vez que mãe e filha estiveram juntas.Terminado o julgamento, o juiz preocupou-se com o futuro da menina.Olhando para a vasta assistência, questionou se alguém se dispunha a dela cuidar.Uma bondosa senhora, desconhecida, ofereceu-se e veio a dar uma esmerada educação a Maria, tendo-a matriculado na escola.O pior foi quando a benfeitora faleceu prematuramente. Contava Maria apenas 10 anos de idade.O viúvo da senhora não demonstrou idêntico espírito solidário. Quis-se ver livre da menina, sobretudo após ter contraído novo matrimónio.Maria passou a criada de servir. Detestou esse trabalho. Decidiu que viria a ser homem em vez de rapariga encarregue de limpezas, compras no mercado e tarefas na cozinha.Adquiriu um fato, camisas, boné e gravata. Passou a usar sapatos de atacadores. No cabeleireiro, cortou o cabelo à homem. Diariamente, barbeava-se, para que as pilosidades faciais despontassem. Fumava e tocava guitarra, em conjunto com rapazes boémios.E foi assim que, com um novo nome masculino, arranjou emprego numa companhia de seguros.Em 1921, foi presa por gatunagem no próprio local de trabalho.É então que, no Torel, todos são surpreendidos. Está-se perante uma jovem ladra e não em face de um homem.O caso fascinou os clínicos do Instituto de Medicina Legal.* Juiz (hjfraguas@hotmail.com)

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