No meio da lezíria imensa, as notícias que assolam o mundo não chegam a Pedro Maria Garcia. Utiliza o seu rádio para ouvir música. Diz não ter paciência para ouvir relatos de futebol ou notícias. Mas afirma-se pouco adepto das novas tecnologias até porque, segundo ele, “para quê ter um telemóvel se eles aqui não têm rede?”. Já lhe passaram dois pelas mãos mas não ficou convencido. “Eu não bebo água”, diz bebendo mais uns goles de vinho. De seguida enrola mais um cigarro. Diz que enche duas a três vezes a garrafa que carrega consigo. Gaba-se da sua saúde “de ferro”. O pastor mal se lembra quando foi a última vez que teve de ir a um médico. Ganha 500 euros. Diz que já pediu ao patrão para o aumentar mas não se mostra preocupado se isso não acontecer. Pedro não tem formação académica. Tem antes a sabedoria e experiência de uma vida a conduzir rebanhos com quem estabelece linguagens próprias que só ele sabe entender. Já trabalhou para vários patrões, uns bons, outros menos bons, diz. Recorda com emoção o episódio de quando há pouco tempo o seu actual patrão teve de abater todo o rebanho por causa da doença da língua azul. “Eu chorei por aquelas ovelhas como choro pelas minhas filhas” afirma com rudeza e compaixão ao mesmo tempo. “Consigo conhecer todas as ovelhas, uma por uma”.