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Emigrantes de regresso ao Ribatejo no Verão

Emigrantes de regresso ao Ribatejo no Verão

Carlos Ribeiro e Carlos Póvoa matam saudades da terra nas tardes de Julho

Deixaram o Ribatejo e foram procurar a sorte noutras paragens. No Verão voltam à terra natal. Em busca da identidade, da família e das amizades. Histórias de dois ribatejanos eternamente apaixonados pelo lugar onde nasceram.

Carlos Constantino Ribeiro tem 73 anos. Carlos Póvoa tem 49. Carlos Ribeiro, mais conhecido por Canu, gosta de ouvir Tony Carreira e Charles Aznavour. Carlos Póvoa, prefere ouvir Amália Rodrigues e Tom Jones. Canu diz que não passa sem uma boa caldeirada de peixe, já Carlos Povoa nunca consegue dizer que não a um ensopado de enguias, acompanhado por um bom tinto. O primeiro nasceu em Riachos (Torres Novas) e desde que partiu para França nunca falhou a uma Benção do Gado ou a um São Martinho. O segundo nasceu em Vila Franca de Xira, mas emigrou para Inglaterra. Nunca se lembra de não ter participado no Colete Encarnado ou na Feira de Outubro. Em comum têm a simpatia pelo Benfica e um porto de abrigo muito especial: o Ribatejo. De onde saíram, mas de onde nunca levantaram âncora. Onde quer que estejam, os cavalos, os toiros e o Tejo acompanham-nos no coração. Carlos Póvoa, deixou o colégio Nuno Álvares em Tomar e rumou para Londres, em 1972, quando a sua mãe, como tantos milhares de portugueses, sentiu necessidade de fugir ao fascismo e à miséria. Tinha 13 anos. Por lá, acabou a escola, teve aulas intensivas de inglês e casou com Ofélia, uma filipina. Vingou na vida como director de hotelaria e chegou mesmo a trabalhar no número 10 da Downig Street, na residência oficial do “ Prime Minister”. Em terras de sua majestade, Carlos Póvoa fundou em 1994 a primeira tertúlia tauromáquica portuguesa de Londres e diz que viu nascer a comunidade portuguesa londrina. “Em 1962 não havia muitos portugueses. Foi nos últimos dez anos que se registou um grande aumento da emigração portuguesa em Londres”. Carlos Póvoa recorda ainda os tempos em que tinha de ir comprar o bacalhau, para matar as saudades do paladar, numa mercearia italiana. “Só nos anos 80 é que se abriu a primeira mercearia portuguesa em Londres”, conta. “Pelo amor de uma rosa, o jardineiro é servo de 1000 espinhos. É uma frase que os turcos usam, mas a isto pode chamar-se saudades” – responde Carlos Póvoa, quando confrontado com a pergunta “sente saudades da sua terra?”. Canu, por sua vez, diz que em nome da nostalgia chegou a meter-se no carro de propósito para poder vir à feira das segundas-feiras, a Torres Novas. E isto, mais do que uma vez, mas sempre com o consentimento da sua esposa. Quando as circunstâncias não permitiam tal capricho, Canu colmatava a nostalgia dos toiros e dos cavalos no Parque Montreuil: ia ver as garraiadas que lhe faziam lembrar Riachos. Canu foi para Paris há quatro décadas, com a mulher e um bebé nos braços. Foi na altura em que se passava a fronteira “a salto”. Tinha 32 anos. Para trás ficou o seu emprego na firma António Alves das lãs, em Torres Novas, onde ainda recorda o seu “patrão bom”. Mas lembra também que a vida, nesses tempos “era um bocado dura do ponto de vista financeiro”. Tanto que sentiu a necessidade de emigrar. Para além do mais havia a promessa dos amigos, que já lá estavam, de que em Paris poderia encontrar “muitas possibilidades de vingar na vida”.Foi de um dia para o outro que decidiu tentar a sorte na capital francesa, onde viria a fazer de tudo um pouco. Desde operário numa lavandaria, passando por uma fábrica de gás, sendo também mais tarde distribuidor de carne num talho. Diz que nunca viveu a realidade dos bairros de lata e que a maior dificuldade que sentiu foi o não falar a língua. Mas como trabalhou sempre com franceses, rápido lhe tomou o jeito. Mais tarde, a complicação seria de outra ordem.Há 12 anos sobreviveu a um cancro e confessa que ficou a dever a sua vida aos médicos franceses. Foi também em França que nasceu o seu segundo filho e onde tomou o gosto aos chapéus. Hoje, reformado, tem uma colecção invejável, como aquele que trazia na cabeça no dia em que O MIRANTE o cruzou.
Emigrantes de regresso ao Ribatejo no Verão

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