Finalmente consegui perceber por que é que tão pouca gente gosta do nosso benfazejo e augusto primeiro-ministro, apesar do homem ser bem parecido, bem-falante e até ter feito alguma coisa de jeito, pelo menos se comparado com alguns antecessores de má memória. O cavalheiro é repudiado simplesmente porque pratica jogging. Ou seja, descodificando para quem não está a par destes preciosismos linguísticos, José Sócrates gosta de dar umas corridinhas pela rua e anda a pagar caro por isso. Como todos os outros que têm esse saudável mas depreciado hábito.Cheguei a essa conclusão através da experiência própria. E o conhecimento empírico é como o algodão: não engana. Só numa tarde consegui ser atacado por um rafeiro, ouvir bocas de duas ciganas que perguntavam qual era a minha pressa (e a quem tive de dar troco em linguagem gestual), ser alvo de chacota com pronúncia do norte por um bando de morcões que passava de carro e correr o risco de ser atropelado numa passadeira. Repito: isto aconteceu só numa tarde, no espaço de uma hora. E a maior parte dessas experiências já as tinha vivido antes. Com excepção das ciganas, mas tratando-se de uma minoria étnica está explicada a raridade.Sinceramente ainda não consegui perceber a razão para esta ostensiva antipatia para com quem, além de estar a dar um saudável exemplo, chateia muito menos que um arrumador de automóveis, um vendedor de bordas de água ou um agente da ASAE. E que ainda por cima não anda a tocar às campainhas aos domingos de manhã para anunciar a aproximação do fim do mundo ou a distribuir publicidade de supermercados.Caro Manel, não sei se tens alguma teoria acerca deste fenómeno. Eu não tenho. Apenas sei que essa antipatia aos atletas informais não se verifica tanto, por exemplo, em relação aos milhentos de peregrinos urbanos que andam ao fim do dia pelas ruas das nossas cidades. Aliás já experimentei, para ver no que dava. E a verdade é que se for a andar não há problemas. Mas mal começo a ensaiar um trote, lá vêm as bocas das mais diversas proveniências que me fazem passar pela cabeça imagens das mais sanguinárias chacinas da história da humanidade.É por estas e por outras que José Sócrates aproveita o poder que tem para se prevenir dessa gente sem escrúpulos. Se eu pudesse também mandava cortar a Praça Vermelha de Moscovo ou a avenida marginal de Luanda para poder desentorpecer as pernas sem estar sujeito aos comportamentos trogloditas de alguns concidadãos com um QI semelhante ao de um paralelepípedo. Aliás, ia mais longe: por mim até corria com o nosso primeiro-ministro. E tu, não gostavas de correr com ele?Com esta dúvida metafísica me vouUm salamaleque do Serafim das Neves