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O pintor que vive para o momento

Monteiro de Alcobaça pinta retratos e azulejos, mas é apaixonado por barcos e cavalos

Monteiro de Alcobaça esteve muitos anos sem expor por sentir que não pintava tão bem como queria. Veio morar para Vialonga e foi em terras de cavalos e lezírias que aperfeiçoou a técnica.

“Um pintor vive para o momento. É necessário almoçar para continuar a viver e a pintar, mas nesse momento saber se há jantar não preocupa”. Monteiro de Alcobaça, 48 anos, é um artista nascido em terras do Oeste, que abraçou há três anos a vida na freguesia de Vialonga, em Vila Franca de Xira. “Mudei-me para cá para estar mais próximo do que pinto, dos cavalos e da Lezíria”, conta a O MIRANTE. Os cavalos, de raça árabe, inglês ou puros lusitanos, estão no topo das preferências do artista, enquanto modelos. Na casa de Monteiro de Alcobaça são vários os quadros de equinos, vistos junto à praia, num grande plano de que sobressai a cabeça, ou mesmo em pleno Parque Natural da Peneda-Gerês, no caso de uma obra que retrata um garrano daquela zona. “Acabei por me tornar mais conhecido por pintar cavalos. É um animal nobre e que fica sempre bem de qualquer perspectiva”, considera o pintor. A vida artística de Monteiro começou como cenógrafo, no Teatro Nacional D. Maria e em espaços como o S. Carlos ou o Teatro da Trindade. Monteiro tinha 15 anos e tinha olhar crítico para o trabalho dos colegas mais velhos. “Estava atento aos jogos de luzes e à forma como os pintores de cenários faziam. Na escola já tinha jeito e depois nunca mais parei. Comecei com aguarela, e depois dediquei-me ao óleo. Actualmente, pinto mais em acrílico”, explica o artista. Em jovem, Monteiro frequentava as aulas na escola António Arroio, em Lisboa, em simultâneo com o trabalho no Teatro São Carlos, onde recebia lições do falecido pintor e cenógrafo Manuel de Lima, que considera seu mestre. Aos 16 anos, o trabalhador e estudante começou a mostrar o seu trabalho, mas considerou que ainda não tinha qualidade suficiente. “Estive vários anos sem expor porque achei que não tinha qualidade. Agora, os quadros já têm um nível aceitável”, avalia. Na primeira exposição em que participou, já em 1996, Monteiro concorreu com uma pintura em cerâmica e ganhou o primeiro prémio. O gosto pela pintura em azulejo, ao estilo tradicional português, tornar-se-ia um ganha-pão (ver caixa). Monteiro de Alcobaça mudou-se de Lisboa para o Cacém, onde viveu até há três anos com a família. A vinda para Vialonga trouxe-lhe inspiração. “Aqui, aprendi a pintar melhor. Hoje faço coisas que não pintava há cinco anos. O estilo aparece aos poucos sem se dar por isso”, confessa. Para Monteiro, “a pintura já está toda descoberta, o que se pode fazer são experiências”. Algumas testemunhas são gravuras onde o carvão, os pastéis e a aguarela se combinam. Os quadros sucedem-se, pintados de manhã ou ao fim do dia, ao ritmo da inspiração. Monteiro de Alcobaça expõe em Lisboa, Sintra e no concelho de Vila Franca de Xira. Das mostras em que participou, destaca uma exposição a dois, no Museu Sousa Martins, dedicada aos barcos do Tejo. Naquele local, a pintura de Monteiro de Alcobaça surgiu acompanhada pelos barcos em miniatura, feitos em madeira pelo artesão João Padinha. “Esta foi a mais recente, mas há mais planeadas”, conta. Os barcos do Tejo e os comboios são as prioridades para duas novas exposições que prepara. A presença de um pintor profissional em Vialonga também se fez notar na própria freguesia. Monteiro foi convidado em Janeiro para dar aulas de pintura no atelier da Secção Cultural do Grupo Desportivo de Vialonga. “Ao dar aulas, aprendo também. Os erros dos alunos, as correcções que faço, as paisagens e os modelos ajudam a ganhar melhor percepção do que pinto”. O método, além das instruções e da pintura a partir de modelos, inclui ainda a pintura ao vivo. “Mal comece a Primavera, vamos para o campo, para captar as tonalidades e a luz das paisagens”, explica Monteiro. Do currículo das aulas fazem parte ainda visitas a museus, como o Museu José Malhoa, nas Caldas da Rainha. “Aprende-se muito a ver como pintam os mestres”, conclui.Azulejos chegam aos Estados Unidos e França A pintura em azulejo é uma das técnicas que permitiu que Monteiro de Alcobaça se tornasse mais conhecido. “Um pintor tem de fazer de tudo para viver”, explica. O gosto pelas cenas do século XVII, em azul-cobalto, levou o pintor a participar no restauro de monumentos como o Palácio Nacional de Queluz. Dos Estados Unidos e de França vão chegando encomendas de mais azulejos, em resposta aos anúncios que o pintor coloca em revistas da especialidade. “Fiz muitas entradas de prédios, restaurantes, alguns azulejos de monumentos”, conta. E nem as entradas de alguns prédios na Quinta da Flamenga, em Vialonga e o exterior do mercado retalhista da freguesia, escaparam ao toque artístico do pintor. O azulejo pintado à mão é raro e por isso tem procura. “Às vezes não me posso queixar e há muitas encomendas. Mas a vida de artista tem muitos altos e baixos”, conta. Os pontos de venda de pinturas e azulejo multiplicam-se pela zona de Lisboa e do Oeste. Do Cabo da Roca aos castelos de Óbidos e São Jorge, várias são as lojas que vendem azulejos com a assinatura de Monteiro. Mas o motivo de maior satisfação do artista vai para além do dinheiro. “O azulejo é eterno”, declara. O futuro anda sobre carris Os projectos de Monteiro de Alcobaça para as próximas exposições passam pelo Museu da Marinha e por uma exposição em aliança com a Associação Portuguesa dos Amigos dos Caminhos-de-ferro. Alguns dos quadros estão ainda por pintar, mas as negociações têm vindo a decorrer. O pintor autodidacta, que admira Silva Porto, José Malhoa, João Mário e Rui Pinheiro, quer mostrar dois dos elementos que mais o inspiram. Os barcos, tradicionais, pintados a partir de gravuras a preto e branco, ao vivo na marina de Cascais ou no Tejo, surgem nas telas de Monteiro em quantidade. A inspiração para a pintura de comboios em quantidade aguarda por uma maior colaboração da parte da empresa Comboios de Portugal (CP), que tarda em chegar.

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