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Pedro Choy

Pedro Choy

Médico, 49 anos, Salvaterra de Magos
Trabalho muito, sempre trabalhei. Na faculdade chamavam-me o homem sem tempo. Tinha 20 anos. Agora estou com 50 e continuo a ser o homem sem tempo. É a minha natureza. Já no liceu fazia muitas coisas. Além de ser o melhor aluno da turma - ou não teria conseguido entrar em medicina - fazia judo, karaté, esgrima, marcha atlética e equitação e ainda integrava um grupo musical e era escuteiro. A diferença é que não fazia aquilo que todos os jovens fazem. Não ia a discotecas, não sabia dançar. Ainda hoje não sei. Nunca tive tempo para aprender. Sempre dei importância às coisas que considerava de responsabilidade. Até aos 42 anos suportava não almoçar. Mas tive que começar a fazer uma pausa. O almoço é uma perda de tempo terrível. Uma pessoa perde o raciocínio e depois tem dificuldade em recomeçar. Sobretudo quando estamos a criar. Uma grande parte do meu trabalho implica escrever. Passo muitas horas ao computador. Agora já é excepção não jantar ou não almoçar. Às vezes tenho tempo para dormir oito horas. A maior parte das vezes durmo cinco ou seis. O trabalho que faço dava para seis ou sete pessoas. Podia trabalhar sete dias por dia e não acabava. Estou sempre atrasado. Pratico artes marciais. Há pouco tempo tive a sorte de conhecer em Salvaterra de Magos um muito bom mestre de boxe tailandês. Sou mestre de karaté. Tenho mais de quarenta anos de prática de técnicas de combate e isso faz com que para mim seja aborrecido fazer outros desportos. Desloco-me de carro porque não tenho tempo. Moro nos Foros de Salvaterra. Trabalho sobretudo em Salvaterra de Magos. Se tivesse mais tempo gostaria imenso de fazer o percurso de bicicleta. Prefiro fazer uma hora de boxe tailandês. As pessoas não conseguem ter saúde se não fizerem algum desporto. Vou fazer 50 anos a 30 de Março. Os chineses dizem que têm a idade que vão fazer enquanto os portugueses dizem a idade que fizeram. Sou casado e tenho quatro filhos. Todos em idade escolar. Com o tipo de profissão que tenho não é fácil, mas penso que ainda consigo dar à família um tempo mínimo de convívio. Tenho uma necessidade de tornar o tempo útil. Quando estou com eles ensino-lhes técnicas de combate e simultaneamente ensino-os a ser pacíficos, calmos e tranquilos. Com frequência visto calças que já viveram 25 anos. Às vezes andam esfarrapadas em baixo. A minha mulher ralha comigo, mas não quero saber. Como ninguém olha para as baínhas das calças atrás de uma secretária, deixo andar. A aparência tem pouca importância. O que vale é aquilo que as pessoas realmente são. Claro que sei que para que as pessoas tenham confiança em mim tenho que ter alguma aparência. Mas tenho vantagem porque já fiz um nome forte. Posso ser mais condescendente. No início vinha trabalhar de fato e gravata, perfumado e garantidamente bem barbeado. Querer é poder. Sempre repeti muitas vezes esta frase que foi muito importante para a minha família. Nasci em Macau, mas desde criança que vivo no Ribatejo. Cresci em Almeirim e pertenci à população muito pobre. A primeira vez que tive electricidade tinha 15 anos. Antes vivia numa outra casa que tinha como canalização uma torneira. Não existiam instalações sanitárias. Era uma casa velhinha por onde entrava o frio e a água quando chovia. O meu quarto era metade da cozinha dividida ao meio por panos camuflados. O meu pai era militar. Tínhamos uma cama antiga com ferros altos e colocávamos por cima um plástico para a água escorrer para os lados.Estudar é importante mesmo que se queira ser servente de pedreiro. Nós também somos aquilo que aprendemos. Uma das minhas dores sociais é o facto da educação estar tão desvalorizada no ocidente. Eu e os meus irmãos começámos a trabalhar aos 13 anos. Não, ao contrário das pessoas que viviam na rua, como substituição da escola, mas como complemento e ainda bem que assim foi. Felizmente tive a sorte de ter um pai e uma mãe que davam importância extrema à educação. Podia não haver dinheiro para comer, mas para os livros havia.Gosto muito do mar. Se eu pudesse - e não posso porque não tenho tempo – passava férias em países quentes. Faço sempre parte das minhas férias no estrangeiro porque trabalho muito fora do país. A minha mulher é francesa o que implica que para que as crianças conheçam a família temos que viajar. Ana SantiagoNa faculdade chamavam-lhe o homem sem tempo. Tinha 20 anos. Prestes a fazer 50, Pedro Choy continua a ter o mesmo problema. Trabalha por sete, é mestre em artes marciais e em medicina chinesa. Foi menino pobre em Almeirim, mas hoje é dono de um pequeno império. Tem mais de vinte clínicas e acompanha o trabalho desenvolvido a partir de Salvaterra de Magos, concelho onde reside. É casado, tem quatro filhos, pratica boxe tailandês e gosta de ensinar o espírito das artes marciais aos descendentes. Se tivesse mais tempo garante que ia a pé para o trabalho.
Pedro Choy

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