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Embarcações do “Ti Fontes” dão mote a Museu da Pesca em Ortiga

Embarcações do “Ti Fontes” dão mote a Museu da Pesca em Ortiga

Homenagem a Manuel Pires Fontes juntou dezenas de pessoas na barragem de Belver
A homenagem que o povo de Ortiga, Mação, fez domingo, 3 de Janeiro, a Manuel Pires Fontes - “o senhor dos Barcos” como alguém um dia lhe chamou – serviu de pretexto para anunciar o Museu das Artes da Pesca Tradicional de Ortiga onde vão ser perpetuados dois picaretos (embarcações típicas de Ortiga) por si construídos. Uma ideia que já tem cerca de cinco anos, tempo dedicado à recolha de algum espólio, mas que pretende agora ganhar um novo fôlego. A iniciativa, organizada em conjunto pela associação “Os Amigos da Estação de Ortiga” e pela Liga Regional de Melhoramentos de Ortiga, juntou cerca de uma centena de pessoas na barragem de Belver, junto a Ortiga, numa tarde de chuva miudinha. O futuro espaço museológico deverá ser implantado num terreno, ainda sem localização e custos definidos, mas seguramente dentro da freguesia de Ortiga, a mais pequena do concelho de Mação. O objectivo passa por preservar as tradições locais, aquelas que passavam de pais para filhos. Como por exemplo, a arte de construção dos picaretos. Estas embarcações são construídas artesanalmente e uma das suas características mais curiosas passa pela acentuada curvatura da proa. Para lhe moldar a forma, o calafate (construtor de barcos) recorre a uma técnica ancestral que utiliza a água e o fogo. Para concretizar o projecto, os dinamizadores pedem apoio à Câmara Municipal de Mação para que, através dos últimos fundos comunitários disponíveis, comparticipe a aquisição do terreno com vista à construção do espaço museológico que, para abranger peças em tamanho original, terá que ser bastante espaçoso. Presente na cerimónia, o vice-presidente da autarquia, Vasco Estrela (PSD), assegurou que a câmara tudo vai fazer para que “este anseio das pessoas de Ortiga seja uma realidade dentro em breve”. Actualmente são poucos os picaretos que se podem encontrar no rio Tejo. Por este motivo, o homenageado, de 83 anos - considerado como um dos últimos calafates de Ortiga - estava visivelmente orgulhoso depois de ter lançado ao rio, perante o aplauso dos presentes, os dois últimos barcos que construiu de propósito para a ocasião. Sérgio Durão, presidente da associação “Os Amigos da Estação de Ortiga”, sublinhou a importância da criação deste Museu da Pesca em Ortiga. “Por um lado porque não vai haver quem os construa e, por outro, porque tendem a ser substituídos por embarcações de fibra”, apontou sublinhando que este museu poderá vir a ser um importante complemento do Museu de Arte Pré-Histórica de Mação, atraíndo muitos turistas até esta zona.Trezentos barcos moldadosA disponibilidade e o espírito de entrega de Manuel Pires Fontes foram destacados por todos os interlocutores da tarde, relembrando que esta homenagem é merecida uma vez que o seu trabalho engrandeceu a terra onde nasceu. “A madeira utilizada para a construção os picaretos é uma tábua única que é dobrada a água e fogo ”, conta Manuel Fontes entusiasmado, revelando que ao longo da sua vida construiu à volta de trezentos barcos. As embarcações, construídas entre 2008 e 2009, foram lançadas ao rio através do deslize sobre rolos de madeira, impulsionados pela força de Manuel Fontes. Em tempos, este era um momento especial, de grande expectativa, para quem os construía e para os seus proprietários. Era a prova dos nove, o momento em que se testava o equilíbrio do barco e o seu isolamento. Prova superada, as embarcações, com cerca de 5,80 metros de comprimento, foram baptizadas de “Príncipe do Tejo” e “Adamastor”. No lanche, que foi servido aos presentes no Parque de Campismo de Ortiga, foi exibido um filme elucidativo de todas as fases de construção destes dois picaretos. E, já na fase final da homenagem, Manuel Fontes exprime a O MIRANTE um desejo muito particular: “Só queria ver o museu a funcionar antes de morrer”.O calafate-pescadorNa edição de 16 de Dezembro de 2004, O MIRANTE publicou um trabalho sobre Manuel Pires Fontes, com o título “O último calafate de Ortiga”. Foi nesta terra que nasceu a 26 de Fevereiro de 1926, casou e teve uma única filha. Para além de calafate foi pescador e, por isso, se durante o dia trabalhava na construção de barcos, à noite rumava ao rio. O contacto directo dos barcos com a água permitiu-lhe aumentar os conhecimentos de modo a melhorar a sua arte. “Foi assim, na escola da vida, ávido pela perfeição na sua arte, querendo agarrar-lhe todos os pormenores, que evoluiu e se tornou um mestre”, realçou Sérgio Durão, presidente da Associação “Os Amigos da Estação de Ortiga” para quem o povo de Ortiga sempre teve uma forte ligação ao Tejo. “Este rio foi o amparo de muitas gerações de famílias de ortiguenses. Dele retiravam o peixe para a alimentação e a lenha (que nas cheias descia o rio) que utilizavam depois nas lareiras para aquecer as casas e cozinhar, na altura em que não havia gás nem electricidade”, evocou na cerimónia.
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