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Abandonou a caixa de um supermercado para trabalhar no hospital

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Claudina Alexandre é assistente operacional no Reynaldo dos Santos

O percurso de vida de Claudina Alexandre, 46 anos, é quase sempre ligado à área profissional pela qual se entusiasmou há mais de duas décadas: a saúde. É assistente operacional no Hospital de Reynaldo dos Santos, em Vila Franca de Xira, e não tem vergonha de viver “na sombra” dos médicos e enfermeiros.Filipe Matias

Trabalhar num hospital até morrer, mesmo que seja “na sombra” dos médicos e enfermeiros, é a ambição de Claudina Alexandre. Esta mulher de 46 anos é assistente operacional no bloco de cirurgias do Hospital de Reynaldo dos Santos, em Vila Franca de Xira. “O nome é novo mas a profissão já é antiga. Há poucos anos chamava-se auxiliar de acção médica. Apesar de sermos pouco conhecidos e reconhecidos pelos doentes, desempenhamos uma função muito importante”, explica a nossa interlocutora. Algumas das suas tarefas são cuidar dos doentes depois das cirurgias e apoiar as equipas de enfermeiros e médicos no que estes precisarem. “Temos também a responsabilidade de dar as refeições aos doentes, fazer as camas, ajudar nos banhos e tratar dos seus reposicionamentos”, conta Claudina a O MIRANTE.Nascida em Lisboa, começou a estudar na zona de Sacavém. A necessidade de obter rendimentos para suportar a casa onde vivia lançou-a precocemente no mercado de trabalho. Entrou num supermercado da capital onde desempenhou as funções de caixa. “Não era fácil, era um trabalho muito exigente e fisicamente desgastante”, confessa. O patrão não era mau pagador mas a nossa interlocutora sonhava com outra profissão.“Nunca me encontrei naquilo que fazia, sempre senti que tinha potencial para fazer algo mais que pudesse servir as pessoas. A dada altura soube que havia vagas para a lavandaria do Hospital Pulido Valente em Lisboa e arrisquei. Candidatei-me e fui aceite. Nos primeiros dias cheguei a pensar que talvez não fosse capaz de fazer aquilo, encontramos coisas muito macabras, mas depois fiquei durante quatro meses”, recorda.A sua integração no Pulido Valente foi feita num dos blocos emocionalmente mais complicados: o dos internamentos infecto-contagiosos. “É aí que criamos uma barreira de defesa contra a adversidade. Ver a morte todos os dias à nossa frente marca-nos muito. Às vezes sofremos mais que as pessoas que choram. Ainda hoje conheço doentes que, mesmo com todas as minhas defesas, acabam por nos alcançar emocionalmente”, confessa.Apesar de gostar da profissão, Claudina não foi capaz de manter o emprego. Acabou por se mudar para o concelho de Vila Franca de Xira, onde se inscreveu no Centro de Emprego. Ao fim de alguns dias foi chamada para entrar como auxiliar de acção médica no Reynaldo dos Santos. Não hesitou. “Trabalhei durante dois anos pelo fundo de desemprego e no final acabei por ficar. Entreguei-me de corpo e alma a este trabalho, que é o que adoro fazer. Sinto que estou a ajudar muita gente todos os dias e ainda hoje as pessoas me encontram na rua e agradecem-me pela forma como as tratei nos internamentos. Isso dá-me muita felicidade. Quero continuar a dar o bom que sinto cá dentro. Recebo o meu ordenado, é verdade, mas dou muito mais que isso”, refere. Trabalhar atrás dos médicos e enfermeiros não é problema para a nossa interlocutora. “Eles fazem o seu trabalho e eu faço o meu. Claro que as pessoas se identificam mais com os médicos, mas no fundo acabam por agradecer, e muito, o carinho e atenção que as auxiliares lhes dão. Sem nós, os médicos e enfermeiros teriam a sua vida muito dificultada”, ironiza.Claudina Alexandre confessa que chegou a ter uma ideia errada do Hospital de Vila Franca de Xira e garante que não quer trocar de profissão até ao final da vida. “Tinha a sensação de que isto seria uma casa complicada e cheia de gente. Fico feliz por ver que não é verdade. Adoro o movimento do hospital, a tensão, os cheiros e a atmosfera. Encontrei aqui uma forte componente humana. É verdade que poderíamos ter mais recursos para operarmos com qualidade mas compensamos com uma óptima equipa. Às vezes não é preciso ter uma cama articulada novinha em folha, basta uma mão amiga e um sorriso. Muitos idosos e pessoas de meia-idade passam aqui dias e semanas em completa solidão e precisam sempre de um pouco de carinho. Esse também é o meu trabalho”, refere com emoção.
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