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Colhidas mais graves acontecem nas largadas nocturnas e estão associadas a embriaguez

Colhidas mais graves acontecem nas largadas nocturnas e estão associadas a embriaguez

Luís Ramos é cirurgião no hospital de Vila Franca de Xira e aficionado, mas não arrisca

Feira de Maio em Azambuja e as festas em Samora Correia são os eventos que provocam mais feridos e com mais gravidade durante as largadas de toiros. Médico defende que as organizações devem criar uma estrutura pré-hospitalar no local das largadas.Jorge Afonso da Silva

Quem é ferido por algum toiro numa largada das muitas que se fazem nas festas taurinas do Ribatejo, raramente volta ao hospital pelo mesmo motivo. Pelo menos é essa a percepção que tem Luís Ramos, cirurgião do Hospital de Reynaldo dos Santos em Vila Franca de Xira, local que recebe, a nível nacional, o maior número de feridos daquela natureza. A situação é tal que na altura das festas a habitual equipa de cirurgiões de serviço, passa a contar com três elementos em vez de dois. Segundo o médico há dois locais no topo das colhidas. A Feira de Maio em Azambuja e as largadas e esperas em Samora Correia, concelho de Benavente. “Têm um volume de feridos um pouco superior e de maior gravidade. Superam o Colete Encarnado de Vila Franca de Xira. Não há nenhuma largada de toiros em Vila Franca que tenha a gravidade e a quantidade de feridos como têm esses dois sítios”, afirma.Ao longo de mais de dez anos em que trabalha no hospital, Luís Ramos já assistiu a muitas situações, algumas das quais dramáticas. “Pessoas com os intestinos saídos por causa de uma cornada abdominal. Acidentados com ferimentos na região inguinal, que se descobre, já no bloco operatório, que chegam praticamente ao tórax, sem nenhuma abertura a nível abdominal. E há alguns feridos que saem com vida do local das largadas e que, pela distância a percorrer chegam ao hospital sem vida”, conta.O cirurgião diz que um estudo realizado no passado concluiu que as colhidas mais graves acontecem durante as largadas nocturnas, sendo as vítimas quase todas homens, que se dividem em dois escalões etários: dos 20 aos 30 e dos 50 ao 60 anos. Acrescenta que na maioria dos casos está associado um “grau de embriaguez” que faz com que as pessoas fiquem desinibidas e percam o medo de enfrentar o toiro. O volume de acidentados registados neste tipo de iniciativas tem-se mantido constante, sendo a única alteração ocorrida nos últimos cinco anos, o aparecimento de alguns feridos imigrantes.O médico Luís Ramos é aficionado e frequentador das largadas em Vila Franca de Xira desde criança. Conta que nunca teve a ousadia de saltar para o recinto com o objectivo de ir para a frente do toiro. Com o passar dos anos e a experiência profissional fizeram com que tivesse cada vez mais respeito pelos animais e se afastasse do perigo. “Claro que me sujeito sempre a ter alguma situação acidental porque permaneço dentro do recinto – com a distância minimamente segura – e vou visitando as tertúlias e os amigos. Mas sempre com muito temor pelo toiro”, revela com um sorriso.Nessa incursão pelas zonas das “mangas” (locais onde são largados os toiros) o cirurgião afirma que por vezes fica com a sensação de que as pessoas não têm a real noção do perigo. Mas por outro lado compreende e entusiasma-se ao ver a renovação das gerações que fazem este jogo de risco com o toiro, só pelo facto de quererem provar isso às outras pessoas que estão a assistir. “É uma herança cultural, difícil de explicar. As pessoas de fora provavelmente também não entendem”, garante.Faz falta uma estrutura pré-hospitalar no local das largadas de toirosNa opinião de Luís Ramos é mais perigoso fazer uma largada ou uma espera de toiros do que organizar uma corrida numa praça. Dada a elevada perigosidade que existe neste tipo de eventos o cirurgião pede uma maior responsabilização e coordenação de todos os intervenientes, no sentido de se salvarem vidas. O médico lamenta que haja um vazio legal nesta matéria o que leva a que ninguém assuma a responsabilidade por qualquer acidente. Por isso apela ao bom senso de quem organiza. “Em pleno século XXI não é possível organizar um evento destes sem haver o cuidado de se ter uma estrutura médica pré-hospitalar. Um hospital de campanha. Uma tenda. Um contentor. Preparado para avaliar estes feridos e fazer os gestos que salvam vidas, no local. Não basta apenas carregá-los para a ambulância dos bombeiros e levá-los para o hospital”, ressalva o cirurgião.A situação assume contornos mais graves quando as colhidas acontecem em zonas afastadas do hospital para onde são encaminhados os feridos. “O hospital está em Vila Franca de Xira. Outra coisa é falarmos de Benavente, Samora Correia ou Azambuja. O transporte nessas condições pode fazer com que esse doente entre em estado crítico ou acabe mesmo por morrer quando a sua grave situação clínica assim o determina”, alerta o cirurgião Luís Ramos.
Colhidas mais graves acontecem nas largadas nocturnas e estão associadas a embriaguez

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