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Os jovens que entendem o folclore têm orgulho e não vergonha

Os jovens que entendem o folclore têm orgulho e não vergonha

Hélio Santos, 32 anos, é desde Agosto de 2011 responsável pelo Conselho Técnico Regional dos Templários, ramificação da Federação do Folclore Português, que abrange 24 grupos folclóricos dos concelhos de Abrantes, Constância, Entroncamento, Ferreira do Zêzere, Tomar, Torres Novas, Barquinha, Mação, Sardoal, Vila do Rei Sertã, Oleiros e Proença a Nova. Acredita que depende de outros jovens assegurar o futuro do folclore e convida todos a experimentarem um pé de dança e a conhecerem as raízes etnográficas.

Como é que se consegue cativar os jovens para os grupos etnográficos? Quando eu entrei no folclore, há praticamente 20 anos, era uma oportunidade para conviver, conhecer outras pessoas e visitar o resto do país. Hoje, qualquer jovem viaja com facilidade e tem uma panóplia de actividades para fazer. Actualmente, noto que já começa a haver falta de pares masculinos nos grupos. Já há casos em que as raparigas se disfarçam de rapazes (risos…). Mas de Coimbra para cima já há muita juventude porque no mesmo grupo há várias gerações da mesma família.Não é fácil convencer um rapaz a deixar a Playstation para ir dançar o fandango…Os grupos têm que começar a atrair esses jovens mais cedo, com sete ou oito anos, porque na adolescência é mais difícil. Devem fazer escolinhas de folclore para os miúdos começarem a dançar e a ganhar o gosto. Há miúdos que fazem esse percurso mas chegam à adolescência e deixam porque os colegas gozam com eles. Os grupos tem que trazer os jovens para o folclore desde muito cedo e convencer os que querem sair.Sendo um jovem, nunca sentiu complexos em vestir o traje folclórico?Não porque não danço, toco harmónio e acordeão e nunca senti que gozassem comigo uma vez que pertenço a um grupo de 40 ou 50 pessoas que criaram laços de amizade entre si. Quem entende o folclore como ele é de facto tem orgulho e não vergonha. Desde que entrei no Conselho Técnico tenho aprendido muito sobre etnografia e o orgulho é cada vez maior. Esse conhecimento etnográfico é fundamental para agarrar os jovens?Sim, os jovens têm que ser esclarecidos sobre o que estão a fazer em cima de um palco. Porque o folclore é os trajes de antigamente, as mezinhas, a culinária, a religião e costumes de outros tempos... O folclore tem que representar vivências e quem o dança tem que estar consciente dessa representatividade. As aldeias mais rurais, mais afastadas dos centros urbanos, têm mais jovens nos seus ranchos embora a questão da emigração já esteja a afectar alguns grupos. Não se pode, ou pelos menos não se deve, dançar folclore com piercings ou tatuagens. Estas regras não contribuem para o envelhecimento dos grupos?Penso que se queremos credibilizar o movimento folclórico o caminho será o contrário. Há jovens com cabelos compridos e que os escondem nos barretes e há jovens que, percebendo o que estão a representar, cortam o cabelo. Isto tem que ser explicado. A etnografia é uma ciência. O jovem não pode subir ao palco, dançar e ir embora sem saber o que esteve a representar. Por isso, no dia 26 de Maio, em Ferreira do Zêzere fizemos uma formação basilar para tentar esclarecer os jovens e meter-lhes o bichinho do folclore. Só sabemos para onde vamos se soubemos de onde viemos. O folclore também tem uma função social?Sim. O folclore pode ajudar a estruturar a personalidade das pessoas, incutindo nos jovens valores como a amizade, responsabilidade e o respeito. Penso que pode ajudar à sua formação cívica, evitando que optem por comportamentos desviantes. Se cada jovem trouxer um amigo para dançar está a ajudar. Sem juventude, o futuro do folclore está hipotecado. “Palavra folclore tem vindo a ser utilizada no sentido pejorativo”Como é que se dá a sua ligação ao folclore? Faço parte de dois grupos de folclore da região: o rancho de Minjoelho e da Pedreira. Entretanto, há cerca de três anos, surgiu o convite para integrar o Conselho Técnico Regional na área de música e entretanto o professor José Joaquim, que está há quase 30 anos, entendeu que estava na altura de passar a pasta e, desde Agosto, faço a gestão diária deste organismo. Qual é o objectivo deste Conselho Técnico Regional dos Templários?A Federação de Folclore Português é o organismo nacional dos ranchos folclóricos. O Conselho Técnico representa a federação no apoio aos grupos que a ela pertencem. Tentamos que os grupos representem, de facto, a época que pretendemos que é entre 1880 e 1920. O último processo que a federação entendeu fazer é a avaliação dos grupos para diferenciar os sócios efectivos, com mais representatividade, dos outros. Ainda há quem encare estas questões do folclore com algum preconceito.O que acontece é que a palavra folclore, de há uns anos para cá, tem vindo a ser utilizada no sentido pejorativo especialmente pela classe política, como sendo fogo de vista. O folclore é o estudo da cultura de um povo em determinada época. No tempo do Estado Novo foram criados alguns grupos somente para entreter o povo que não tiveram em conta os aspectos etnográficos. Quais?O facto folclórico deve ser popular (do agrado do povo), ter autor anónimo (o povo não conhecia o autor), ser tradicional (transmitido de geração em geração pela via oral) e ser universal (pertencer a uma comunidade inteira). Cada vez que morre um idoso é um livro que se fecha para a recolha do folclore.
Os jovens que entendem o folclore têm orgulho e não vergonha

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