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As tintas foram proibidas pelo médico e por isso São Sobral pinta com café

As tintas foram proibidas pelo médico e por isso São Sobral pinta com café

Artista da Castanheira do Ribatejo inaugurou exposição no Dia da Mulher

As pinturas de São Sobral têm cor, cheiro e sabor. Por causa de um problema de saúde os médicos proibiram-na de usar tintas e a artista, que não vive sem pintar, reinventou outro pigmento. O café é agora a sua tinta caseira. A primeira exposição a café, inaugurada no Dia da Mulher, está patente até ao fim do mês na Biblioteca da Castanheira do Ribatejo.

Um problema de saúde causado pelo contacto com as tintas e diluentes levou os médicos a proibirem São Sobral de pintar. A artista residente na Castanheira do Ribatejo, no concelho de Vila Franca de Xira, não consegue viver sem criar e por isso reinventou um novo material para dar cor às suas obras inspirando-se naquilo que a escola de Leonardo Da Vinci também usava no renascimento: café.Tudo aconteceu quase por acaso. São Sobral, com um carreira de mais de 30 anos na área da pintura, estava já a mentalizar-se de que teria que distanciar-se da arte quando passou num café com um papel e pincel. Pediu uma bica e inspirando-se nos pigmentos usados pelos mestres antigos e num livro sobre Leonardo Da Vinci, que leu há pouco tempo, deu por si a esboçar um desenho na mesa do estabelecimento. Depois de um café fraco pediu uma italiana e concluiu o trabalho.“Cheguei a casa e fiz o primeiro quadro que está ali pendurado”, ilustra apontando para uma paisagem com um ponto de água. Trata-se de uma das 34 obras em café que São Sobral tem expostas até ao final do mês de Março na Biblioteca Pública Fernando Gomes de Sousa, na Castanheira do Ribatejo. A exposição, inaugurada no Dia da Mulher, 8 de Março, foi preparada ao longo do último ano. É em casa que prepara café solúvel, matéria prima para as suas obras. Para fazer um trabalho, que demora dois dias a concluir, São Sobral precisa de fazer café três vezes. As várias tonalidades de castanho são conseguidas pela conjugação de diferentes tipos de café: verde, com cafeína e sem cafeína. “Se quero uma cor clara uso o café verde, se quero um tom mais carregado faço um café forte com cafeína e o descafeinado faz-me outra tonalidade de castanho”, exemplifica. Os pormenores são desenhados com pincel fino de três pêlos, como lhes chama.A tinta é tão consistente e duradoura como a aguarela. Só um pingo de água que deixou cair um dia numa Torre de Belém diluiu o monumento ainda fresco. Foi o único percalço que notou em dezenas de obras que produziu ao longo do último ano.É apreciadora de café e lamenta não poder beber tantos quanto desejaria. “Quando pintava porcelana chegava a beber meio litro por noite de café feito na cafeteira de pressão”. A café pintou alguns lugares de referência da Castanheira do Ribatejo: a Fonte de Santa Catarina e a avenida do apeadeiro, de onde arrancaram os eucaliptos para construir a auto-estrada. “Antigamente estavam lá sempre dois guardas. Um para cá e outro para lá. Pintei-os também. Controlavam quem chegava porque o comboio podia trazer meliantes”, justifica. O edifício da actual biblioteca, que foi prisão, escola, sede da junta e pensão de idosos carenciados, também está retratado a café.A escola primária, onde é hoje a junta de freguesia, integra a exposição bem como o Palácio das Castanhas que já não existe e o Palácio do Convento de Nossa Senhora de Subserra . Há quadros inspirados em gravuras do século XVIII que São Sobral pintava em porcelana: casas, rios, pontes, portos de mar, um homem que transporta barris de vinho e outro que pesca. Há também muros partidos. Muitos muros simbolicamente partidos. Casinhas que imagina. Locais paradisíacos onde um dia gostaria de morar e ouvir os pássaros. Sempre conciliou a pintura com as aulas. Durante 20 anos pintou porcelana. Aprendeu a pintar a ouro. Depois optou por outras técnicas: óleo, acrílico e pastel. Deixou tudo para trás para se dedicar ao café. O material que foi usado há séculos continua ainda hoje a ter adeptos nos Estados Unidos e no Brasil. São Sobral, 64 anos feitos em Janeiro, pinta a café à luz do dia no apartamento do rés-do-chão na Castanheira do Ribatejo enquanto faz companhia ao marido, de quase 90 anos. O companheiro de há 42 anos, pai da sua filha, é a sua outra paixão além da pintura. Têm uma diferença de 26 anos que São Sobral não esconde e faz até questão de realçar orgulhosamente. Para apoiar o marido, agora mais debilitado, São Sobral deixou de frequentar tantas vezes o atelier, que fica numa garagem paralela à rua onde mora. Nasceu em Vila Franca de Xira mas veio para a Castanheira do Ribatejo com 13 meses. Esteve 10 anos em África. É na terra que considera sua que estão os quadros em exposição para venda (das 10h00 às 13h00 e das 14h00 às 18h00). Fins de semana das 15h00 às 18h00. Obras de arte únicas não só com cor como com cheiro e sabor… a café.
As tintas foram proibidas pelo médico e por isso São Sobral pinta com café

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