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“Viver no Carregado ou em Lisboa é o mesmo para mim”

“Viver no Carregado ou em Lisboa é o mesmo para mim”

Jorge de Aguiar, Pediatra, 64 anos, Carregado

O pediatra Jorge de Aguiar, 64 anos, começou a trabalhar aos 14 como paquete no grémio das frutas e produtos hortícolas da Madeira, em Lisboa. Tirou o curso comercial, foi bancário e estudou medicina. É natural de Trancoso (Guarda) mas tem consultório no Carregado, onde vive. É casado e tem duas filhas. Nos tempos livres é um estudioso da sua área, mantém a buganvília que cresce no jardim e dá longos passeios de bicicleta aos domingos.

Nasci num moinho na Ribeira do Alcaide, freguesia de São Pedro, Trancoso (Guarda). Moinho esse que foi arrasado em 1953 por uma grande cheia. Não éramos uma família abastada. O meu pai era comerciante. Não tinha a ideia de que mandar os filhos estudar seria bom. Dizia muita vez que não tinha estudado e se governava.Na primeira e segunda classe andava a pé três quilómetros pelo meio de pinhais. Era hábito deixarmos marcas na estrada para avisar se já tínhamos passado. Quando havia uma pedrinha em cima de um marco eu já sabia que os meus amigos estavam adiantados e acelerava o passo para os apanhar. Aos 14 anos fui para Lisboa sozinho trabalhar no grémio das frutas e produtos hortícolas da Madeira. O meu pai queria que os filhos abrissem os olhos. Depois vieram os meus irmãos. Eu era paquete. Tinha uma farda. Ia aos bancos e levava ofertas a clientes. Dos 14 aos 20 anos fiz o curso comercial em regime nocturno. Demorei 51 dias de viagem de barco para Macau quando estive na tropa. Tive a oportunidade de conhecer Luanda, Lobito, Benguela e Lourenço Marques. Estive internado dez dias no Hospital e fiquei com boa impressão dos médicos. Decidi entrar em medicina também aconselhado pelo meu irmão. Quando regressei de Macau tornei-me bancário. Trabalhei no banco de 1972 a 1982 e durante esses anos tirei o curso de medicina. Depois fui para Mora fazer o serviço médico à periferia e tornou-se incompatível ser empregado bancário e médico. O presidente do banco aconselhou-me a esquecer que tinha sido bancário e a optar integralmente pela medicina.Durante seis meses fui médico de família no Centro de Saúde do Carregado. Depois fiz a especialidade de pediatria e fui trabalhar no Hospital de Vila Franca de Xira conciliando com o trabalho no consultório. Em 1983 uma doente, esposa do construtor do prédio onde funciona a Clínica Central do Carregado, convenceu-me a ver um andar. Comprei-o e isso determinou que ficasse por aqui. Comprei um telemóvel assim que apareceram. Tive a noção de que era fantástico ir numa viagem e poder comunicar. No exercício da medicina houve uma certa resistência inicial à informática porque estávamos habituados a passar o receituário à mão. Fiz dez lições e rapidamente aprendi o que é fundamental para o dia a dia. Gosto de andar de bicicleta e faço 25 quilómetros todos os domingos. Vou do Carregado ao Camarnal, depois atravesso Vila Nova da Rainha, percorro a zona da central Tejo, vou ao rio Tejo e regresso. Viver no Carregado ou em Lisboa é o mesmo para mim. Já me habituei e gosto. Trabalho cá há 30 anos mas só cá vivo há nove numa vivenda que construi. O movimento não me incomoda. Um dia passei três horas na auto-estrada por causa de um acidente mas em trinta anos tive dois ou três empecilhos de trânsito. Ao domingo ocupo-me de uma buganvília que me dá muito trabalho mas que me relaxa imenso. Lá em casa os grelhados são por minha conta. Tenho um forno em casa onde já fiz pão com a ajuda da minha sogra. Gosto de assistir a espectáculos. As minhas duas filhas, também médicas, conhecem os meus gostos e são elas que normalmente compram os bilhetes. O que me dá prazer é ler livros de medicina. Há um senhor que vende livros em Santa Maria, em Lisboa, e nem preciso dizer-lhe o que quero comprar. Ele reserva-os para mim. Tenho livros que me custam muito dinheiro mas são do mais actualizado a nível mundial. Dentro da pediatria interesso-me especialmente pela alergologia pediátrica. Nos tempos livres faço a investigação que nunca pude fazer. Procuro saber mais acerca de determinada patologia de um doente, por exemplo. A criança ajuda muito o médico. Os pais dizem muitas vezes que os filhos é que pedem: «leva-me ao Dr. Jorge». Muitas vezes têm razão. Os meus doentes são as crianças. Ligo muito ao que dizem. Interessa-me que verbalizem e que tenham uma boa relação comigo. Orgulho-me de olhar para o meu passado enquanto médico e lembrar alguns casos que fazem a diferença. Ana Santiago
“Viver no Carregado ou em Lisboa é o mesmo para mim”

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