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Filarmónica Sardoalense aguenta o fôlego há 150 anos graças à carolice

Filarmónica Sardoalense aguenta o fôlego há 150 anos graças à carolice

História da banda tem vindo a ser feita de altos e baixos mas, actualmente, todos estão afinados no mesmo sentido: o de não deixar acabar a instituição.

A história da Filarmónica União Sardoalense (FUS) remonta a 3 de Agosto de 1862 e merece ser relatada cronologicamente pela sua singularidade. Martinho Nunes, 36 anos, vogal na direcção e músico, conta que, por volta de 1900, existiam duas bandas no Sardoal, em linguagem vernácula, a do “Pau teso” e a do “Cu aberto”. Sobreviveu apenas a do “Pau teso”, que correspondia à “Sociedade Philarmónica Sardoalense” nascida em 1862, sendo, mais tarde, em Novembro de 1901, fundada a “Sociedade Fraternidade Sardoalense”. Estas duas bandas viriam a protagonizar algumas rivalidades políticas e sociais, hostilidades que terminariam em 1911 quando surge a “Filarmónica União Sardoalense”, que veio juntar as duas rivais. Ao longo de gerações tem sido uma verdadeira escola de música, continuando a ser uma das colectividades mais representativas do concelho do SardoalDesde 1911 até à actualidade, a história da Filarmónica União Sardoalense é feita de altos e baixos, normalmente associados a crises de regência, porque os maestros, tanto quanto se sabe, sempre tiveram no passado uma influência determinante que se sobrepunha à da direcção, à qual cabia, na maior parte dos casos, um papel meramente representativo. Sem ganharem nada em troca, a recompensa dos músicos acaba por ser os momentos vividos colectivamente. “É o amor à camisola e pela música. É bom tocar entre amigos, as saídas que fazemos em grupo, levar o nome do Sardoal a outras paragens”, conta Martinho Nunes. A actual direcção ambiciona para a FUS uma nova sede pois está instalada nas instalações da antiga escola primária do Sardoal que pertence à junta, o que dificulta ensaios e a formação leccionada pela escola de música. “Com 150 anos já merecia uma sede condigna”, defende Maria Júlia Martins, tesoureira da direcção desde 1994, dedicando os seus tempos livres, desde que se aposentou, a uma causa que não quer perdida. O maestro da Filarmónica é natural do Sardoal. Américo Lobato, 30 anos, é licenciado em fotografia mas estudou música no Conservatório da Gualdim Pais em Tomar, estando ligado à FUS há 17 anos. A Filarmónica é, actualmente, constituída por 30 elementos efectivos, com uma média de idades que ronda os 22 anos. A maioria não reside na vila mas aqui chegam de todo o concelho para ensaiar às sextas e sábados. “Para se andar aqui, acima de tudo, é preciso gostar muito porque é muito exigente a nível pessoal. A nossa família fica para trás, acabam-se as saídas nocturnas”, explica Américo Lobato. O maestro sente que, actualmente, a FUS alcançou uma maior estabilidade, quebrando os ciclos dos altos e baixos. “Andávamos aqui cinco ou seis anos bem mas depois isto ia abaixo. Actualmente, toda a gente trabalha para que isto vá para a frente”, diz. Martinho Nunes complementa: “É o único sítio no Sardoal onde se aprende música a sério. As crianças entram na Filarmónica e saem a tocar um instrumento como deve ser”, refere. Memórias de um saxofonista de outros temposAntónio Moleirinho Júnior é, aos 97 anos, o rosto mais antigo da Filarmónica União Sardoalense. Em conversa com O MIRANTE, na antiga escola primária do Sardoal, onde a FUS está instalada até conseguir uma sede definitiva, recordou tempos antigos. “O mestre (maestro) João Florindo Bernardo trabalhava de sol a sol no campo, depois ia para casa estudar a partitura e em seguida ia dar ensaio aos músicos”, conta, acrescentando que saiam para actuações todas as semanas. Se a banda estivesse “à rasca com falta de dinheiro”, os músicos faziam recitais pela vila e era assim que aguentavam para pagar ao maestro. O pai do actual presidente da Câmara do Sardoal (Fernando Moleirinho) nasceu nessa vila a 15 de Março de 1915 e foi sapateiro toda a vida. Já tinha feito a quarta classe quando, com 12 ou 13 anos, entrou para a Filarmónica União Sardoalense. O instrumento que lhe foi parar às mãos foi o saxofone mas, mais tarde, também aprendeu a tocar trompete. “Tinha vocação para estas coisas e aprendia com facilidade”. A primeira actuação em público foi nas antigas festas do Bodo, que se realizavam no Sardoal durante duas semanas. “Naquele tempo não havia esta palhaçada que há agora. Tocavam-se peças de grandes autores. As pessoas só queriam duas coisas: música de arraial para dançarem e a banda a tocar para apreciarem a sinfonia”, conta. Recorda que a FUS era convidada a actuar em festas a mais de 20 quilómetros do Sardoal e que, muitas vezes, era a pé que iam e regressavam, cada um segurando o seu instrumento. “O meu pai tinha um jumento e o mestre da música ia lá sentado. O resto ia atrás, a buzinar por aí fora”, recorda. Naquela altura, a FUS era uma das mais prestigiadas do distrito, sendo convidada para actuar, muitas vezes, em Santarém. A actuação mais marcante que teve foi na feira de Santarém num concurso de bandas filarmónicas que se prolongou por vários dias. António Moleirinho Júnior colaborou com a FUS durante quarenta anos, até que teve que fazer pela vida pois tinha os dois filhos a estudar. “Decidi sair para fundar a minha orquestra para conseguir amealhar algum dinheiro para os estudos dos filhos”, disse. Juntou-se então a um grupo e formou os “Leões do Carvalhal”, convidado para actuar em recepções oficiais em Abrantes. Mais tarde, anos 60-70, formou outro grupo no Sardoal, os Pérola do Ritmo, o que não caiu bem ao então presidente da autarquia, Serras Pereira, que os impedia de tocar nas festas. Hoje já não toca porque a dentição não o permite mas não perde uma actuação “da sua filarmónica”. Encontro de bandas assinala efeméridePara assinalar os seus 150 anos de existência, a FUS organiza domingo, 5 de Agosto, pelas 17h00, no Centro Cultural Gil Vicente, o V Encontro de Filarmónicas. As comemorações têm, porém, início às 10h00, com uma homenagem aos músicos falecidos no cemitério do Sardoal, local onde a FUS vai interpretar o Hino da Sociedade. Segue-se uma missa solene na Igreja Matriz da vila. O V Encontro de Filarmónicas terá lugar na tarde de domingo. A recepção à filarmónica União Musical Amarelejense, a banda convidada, será feita às 16h00, na Praça da República. Segue-se uma arruada até ao Centro Cultural Gil Vicente, onde decorre o Concerto de Gala com a exibição em palco das duas bandas. O dia termina com um jantar de aniversário, que decorrerá a partir das 19h30 no mesmo local.
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