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Vive num carro há dois meses mas não desiste de endireitar a vida

Vive num carro há dois meses mas não desiste de endireitar a vida

Fernando Santos, um desempregado do Porto Alto, recusa ser tratado como mendigo, vai fazendo biscates e todos os dias procura trabalho.

Embora viva num carro, Fernando Santos, 44 anos, não se considera um mendigo, mas alguém que teve azar na vida. Tentou ainda pedir ajuda a algumas instituições locais, mas sentiu-se tão humilhado que desistiu. Vai conseguindo realizar alguns biscates para os comerciantes chineses e acalentando a esperança de vir a ter um emprego que lhe dê uma vida melhor. Um dia acordou e não conseguia andar. Sentia as pernas paralisadas. Teve de ligar o radiador do carro e esperar até começar a sentir-se mais quente. Há dois meses a viver num carro em Porto Alto, concelho de Benavente, Fernando Santos, 44 anos, garante que nunca pensou em toda a sua vida que alguma vez tivesse que viver nestas condições. Depois de uma primeira tentativa de ajuda junto de instituições locais, desistiu de procurar apoio. Diz que do nada que tem ainda lhe resta a dignidade e procura não ter mau aspecto para receber caridade.Trabalhou sempre como motorista até o desemprego lhe bater à porta há quatro anos. Sem receber qualquer tipo de subsídio, o recente divórcio agravou mais a situação. O dinheiro que ia recebendo de alguns biscates que continua a fazer nos armazéns chineses de Benavente não chegava para pagar os 240 euros de renda. Os três filhos, de 16, 18 e 19 anos, são a única coisa que o vai mantendo no Porto Alto, onde mora há 12 anos. “Tenho semanas em que os chineses me pedem para ir entregar ou buscar encomendas e pagam-me geralmente 20 euros por um dia”, explica. É com este dinheiro que vai comendo num restaurante local. Às vezes, o cansaço é tanto que confessa que gasta o dinheiro de um dia de trabalho numa pensão para poder descansar e tomar um banho.Agora que está nesta situação nota a facilidade com que se tecem julgamentos. Quando se dirigiu a uma instituição de Samora Correia para ir buscar apoio alimentar recebeu uma resposta de uma técnica que o deixou envergonhado. “Mal me viu perguntou bem alto para todos ouvirem o que estava ali a fazer porque não tinha nada para mim. Senti-me tão envergonhado que nunca mais lá voltei. Há uma coisa que ainda me resta, dignidade”, desabafa. Fernando Santos diz que para se ser pobre e receber ajudas é preciso “andar todo roto, sujo e mal vestido” e recusa-se a ser assim. “Toda a roupa que tenho é dada. Os chineses vão-me deixando tomar banho nos armazéns, tento arranjar-me e realizar a minha higiene diária”.O facto de ter carro, apesar de ser de gama baixa e já com quase 13 anos, também leva muita gente a acreditar que está bem na vida. Está em risco de perder também a viatura que é o seu porto de abrigo porque deixou de pagar as prestações. O depósito do Opel Corsa vai tendo o combustível que os comerciantes para quem faz trabalhos lhe dão. À noite, vai deixando o carro em sítios diferentes para não atrair atenções. “Passo muito frio no carro, é o que mais me custa. Se colocasse uns cartões nos vidros ajudava, mas não quero atrair atenções”, explica.Fernando Santos está disponível para ir trabalhar em qualquer ponto do país ou a emigrar. Não tenciona viver à custa do Estado, só quer um trabalho que o ajude a alugar uma casa. “Todos os dias, por volta das 6h00 ou 7h00, já estou à procura de trabalho”, assegura. “Não me considero um mendigo, nem um sem-abrigo, mas uma pessoa que teve azar na vida”.
Vive num carro há dois meses mas não desiste de endireitar a vida

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