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Mesmo em tempos de repressão e disciplina férrea havia muita rebeldia nas escolas

Mesmo em tempos de repressão e disciplina férrea havia muita rebeldia nas escolas

Ex-alunos da Escola Industrial e Comercial de Vila Franca de Xira confraternizaram

Nos anos sessenta e setenta não havia telemóveis e por isso não se trocavam mensagens durante as aulas. Quem queria passar algum recado mandava um bilhetinho escrito num papel e esperava que o mesmo não fosse interceptado pelo professor. Também não era possível fazer vídeos de alguns incidentes mais e menos divertidos e por isso é necessário recorrer à memória dos antigos alunos e à imaginação de quem os ouve contar, para os trazer para o presente.

António Cabral aproveita um momento de convívio e descontracção após o almoço de convívio que reuniu mais de duzentos ex-alunos da Escola Industrial e Comercial de Vila Franca de Xira, para relatar uma das muitas partidas em que foi interveniente enquanto estudante. “Uma vez meti um rato na gaveta da secretária da professora. Foi um fartar de rir quando ela o descobriu e apesar de estar grávida subiu para cima da secretária aos gritos”. Foi um fartar de rir na altura e um fartar de rir no domingo, 20 de Outubro, na Quinta do Coração onde decorreu a confraternização.Quem não deve ter achado muita piada foram os pais do “insurrecto” aluno. Ao fim de várias acções de rebeldia e mau comportamento, uma das quais lhe valeu ter levado com uma caixa de costura de uma colega na cabeça, foi convidado a abandonar a escola pelo director. António Cabral não se arrepende. Era adolescente e queria viver a vida. Mais tarde emigrou para Londres onde ainda vive e manteve sempre o seu sentido de humor como o comprovaram as inúmeras gargalhadas que provocou na sua roda de amigos.O organizador do encontro já não larga o jornalista quando este o informa que anda à procura dos “maus rapazes” de outros tempos. E mais preocupado fica quando este lhe manifesta a curiosidade de saber se a Escola Industrial e Comercial de Vila Franca de Xira chegou a ter, no tempo do Estado Novo, algum departamento da Mocidade Portuguesa, uma organização de inspiração fascista em que os jovens usavam farda com camisa verde e emblema das Quinas e um cinto cuja fivela era um S de Salazar. A curiosidade ficou sem resposta. Os relatos de traquinices não pararam até à altura da despedida.Joaquim Carnana, que vai circulando pela espaço aberto da quinta entre grupos de ex-alunos como ele, deixa cair o papel de pai e avô exemplar para dar uma ajuda ao repórter. “Éramos uns malandros quando estávamos em grupo”, conta. Para incentivar confissões, lembramos-lhe a história que nos foi contada de alguns faltarem às aulas para ir jogar matraquilhos para o Café do Diogo. Prontamente acrescenta outras. “Também andávamos à procura das matinés dançantes. E havia umas trocas de sopapos entre rapazes de bairros diferentes por causa de raparigas”. Ri-se com gosto, mas faz questão de acrescentar algo que marca a diferença entre esses seus tempos e os tempos actuais. “Pelo menos nenhum de nós tinha facas nem armas”. Diz ter saudades da camaradagem que existia na Escola. E não se esquece da greve geral ocorrida em 1969 que levou à detenção de alguns colegas mais velhos. “Das janelas, havia malta a cuspir para a polícia e a mandar para a rua o que tinha à mão”, conta, embora confesse que na altura não tinha consciência política do que se estava a passar.A Escola Industrial e Comercial de Vila Franca de Xira foi inaugurada em 1958 e terminou após o 25 de Abril de 1974 quando acabou a separação entre ensino liceal e técnico passando a haver ensino unificado nas Escolas Secundárias. Quando o Facebook junta os mais velhosFoi através de um grupo no facebook que Ana Torres se juntou aos almoços anuais dos antigos alunos de Vila Franca. Apesar de ter frequentado o curso de comercial à noite porque tinha que trabalhar durante o dia e de não ter recordações de brincadeiras com os seus companheiros, afirma que se sente bem no seio da antiga comunidade escolar. “Aproveito para fazer amigos que não fiz na época”, explica. Ana é professora de Português e Francês e vereador da câmara de Bordéus, onde se encontra instalada há vários anos. Diz que o que aprendeu na escola de Vila Franca de Xira a influenciou para ter melhores resultados a nível profissional. Sempre que pode, vem a Portugal visitar os familiares e o Ribatejo. “Gosto muito de ver os sítios onde passei a minha adolescência”, conclui. No encontro havia alunos de todo o país e alguns que vieram propositadamente dos países onde residem para reencontrarem antigos companheiros.
Mesmo em tempos de repressão e disciplina férrea havia muita rebeldia nas escolas

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