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Debate sobre centro histórico de Santarém desapareceu da agenda

Zona antiga da cidade é há anos um somatório de lojas fechadas, casas devolutas e mal tratadas e território desprovido de vida assim que anoitece. O debate está adormecido e são necessárias acções de fundo com vista à revitalização do centro histórico.

O centro histórico de Santarém continua a definhar e a acrescentar a isso soma-se a ausência de debate sobre uma questão que não é de agora mas que já mereceu mais atenção dos políticos e forças vivas da cidade. Até há uma dúzia de anos multiplicavam-se os debates, conferências e posições públicas de diversas proveniências. A candidatura da cidade a património da humanidade era a mola impulsionadora da discussão e da reflexão e a verdade é que com a suspensão desse projecto, em 2002, a atenção nunca mais foi a mesma.“Se fecharmos as oportunidades ao debate, as melhores soluções poderão ficar à porta. É antigo o ditado que aqui encaixa na perfeição: da discussão nasce a luz”, opina José Miguel Noras, ex-presidente da câmara e impulsionador da candidatura de Santarém a património mundial.A cidade foi-se desligando aos poucos do seu centro histórico e de potenciar as jóias patrimoniais em toda a plenitude. Apesar das intervenções no espaço público e em monumentos como as igrejas de Santa Clara e de Santa Cruz, no Convento de São Francisco ou na Sé Catedral, a verdade é que, os visitantes deparam-se hoje com monumentos fechados como o Museu do Alporão ou a Torre das Cabaças. E a vida nocturna garantida por alguns bares e restaurantes que resistem não disfarça o deserto de gente em que essa zona se transformou.João Brigola, professor universitário que foi vereador da Câmara de Santarém e eleito da assembleia municipal na primeira metade da década de 90, considera que cabe aos agentes políticos e associativos e aos cidadãos residentes decidir sobre a pertinência do relançamento do debate sobre a zona antiga da cidade. “Debates de cidadania activa fazem sempre falta nas cidades contemporâneas, mesmo fora dos calendários eleitorais”, diz. Pedro Canavarro, um dos fundadores e sócio honorário da Associação de Defesa do Património de Santarém, concorda que a reflexão sobre a zona histórica de Santarém praticamente desapareceu. “Há algumas décadas atrás, o associativismo era motor desses debates, versus o poder para quem o património eram discussões e propostas quase elitistas. Hoje, esse conceito vibra em todos os quadrantes partidários, que o assumem, igualando, porém, as intervenções, mais do que aceitando a participação cívica, alargada e crítica exigível”, diz ao nosso jornal.Cidade desligou-se do seu coraçãoO antigo eurodeputado e deputado, presidente da Fundação Passos Canavarro, refere que “a cidade ou o centro histórico foram no passado a mesma realidade, mas hoje a vitalidade da urbe distanciou-se dele, e este não é senão uma malha urbana diminutamente habitada - em cidadãos e comércio -, transformando-o num quase ‘esqueleto’, embora com alguma alma nocturna”. “Ao certo, não sei se foi o centro histórico que não resistiu à cidade ou se foi a cidade que desistiu do seu centro histórico. A verdade é que, sem urgente regeneração, só poderá ser olhado numa perspectiva quase tumular, como coisa morta e mumificada”, diz por seu lado José Miguel Noras, acrescentando: “O centro histórico de Santarém é todo ele um estado de alma, território do coração. Desconheço palavras capazes de pintar o mais rico tesouro da memória dos dias escalabitanos. Embora seja uma obra-prima mas, muitas vezes, é tratado como ‘primo da obra’”.João Brigola, professor da Universidade de Évora, hoje visitante esporádico da cidade escalabitana, diz que o centro histórico é a imagem comum a tantos centros históricos nacionais: “a necessitarem com urgência de um plano de regeneração urbana que contemple a reabilitação do edificado, revalorização dos espaços públicos e revitalização do comércio e dos serviços”.Soluções que não são novas mas que têm esbarrado nas dificuldades em serem implementadas. Brigola diz que é preciso ter em conta que a regeneração urbana, ainda para mais numa época de crise, é um processo imensamente dispendioso e longo, podendo durar décadas. “Certo é que o seu sucesso, a prazo, depende do envolvimento obrigatório dos interesses privados, com apoio complementar da administração pública, central e local”, afirma.Pedro Canavarro recorda que “para muitos, vir a Santarém é ainda reencontrar o centro histórico, pela tradição, pela concentração do património histórico-cultural, por uma cultura de rua que se desejaria”, mostrando-se esperançado que “tudo ainda é recuperável se a alma não for pequena”. E aponta o exemplo do Jardim da Liberdade como “um passo significativo no casamento do centro histórico com áreas envolventes”.Lembrando que a autarquia e a empresa municipal Viver Santarém manifestaram intenção de dar prioridade ao centro histórico, “tornando-o num espaço atractivo para a vida, para as pessoas, e em local turístico de visita obrigatória para nacionais e estrangeiros”, Noras considera essa tarefa “ciclópica”, mas também “um nobre desígnio, repleto de esperança” que “exige forte empenhamento de todos os agentes locais interessados na ressurreição do centro histórico de Santarém”.Quanto à que deve ser a prioridade no momento, Noras recorda uma frase que escreveu aquando da musealização da Torre das Cabaças. “As cidades históricas são bonitas como as mulheres mas, de tempos a tempos, precisam de uma sessão de maquilhagem. Agora, para recomeçar, é necessário muito sabão. Nada como a higiene numa cidade. É um pilar insubstituível na sua saúde”, considera.Câmara vai apresentar projectosO presidente da Câmara de Santarém diz que há uma série de projectos e várias candidaturas para intervenções na zona antiga da cidade, num trabalho que tem vindo a ser articulado com outras entidades, como a Diocese de Santarém e a Associação Comercial e Empresarial de Santarém. Ricardo Gonçalves disse a O MIRANTE que pretende realizar em breve uma sessão pública para apresentar “algumas das directrizes” em que a autarquia vai basear o seu trabalho nos próximos anos no que toca ao centro histórico.

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