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Chegou a altura de tirar partido das urbanizações de luxo e desenvolver o turismo em Benavente

Carlos Coutinho, presidente da Câmara de Benavente, quer manter o rumo de desenvolvimento do seu antecessor

O novo presidente da Câmara de Benavente é um autarca com a experiência de 16 anos de vice-presidência na autarquia. Neste mandato quer apostar no desenvolvimento do turismo de natureza aproveitando as condições do concelho e as urbanizações de luxo que foram crescendo na zona de Santo Estêvão, onde já há três campos de golfe. Carlos Coutinho acredita que vai ser possível construir o aeroporto no campo de tiro de Alcochete num território que pertence quase todo ao concelho de Benavente. Mas provavelmente não será, a ganhar as próximas eleições, nos três mandatos que pode fazer no cargo. Nesta entrevista o presidente que vive em Samora Correia fala dos bairrismos, da necessidade de recuperar as zonas centrais que foram sendo abandonadas à custa de um crescimento para as periferias e sustenta que Benavente só consegue vingar se se afirmar pela diferença.

O que é que a câmara ganha com os armazéns chineses do Porto Alto?Estamos a falar de uma comunidade que praticamente não se dá por ela, que vive muito fechada. Está em marcha um investimento chinês de 40 milhões num centro de distribuição que é importante para a economia local. Sempre procurámos que todas as comunidades se sintam bem no concelho. No que diz respeito à câmara os únicos problemas são com a deposição de lixo e monos feita de forma incorrecta junto aos contentores. A nível fiscal contribuem para o concelho?Pagam os seus impostos. O que posso dizer e também já me disseram contabilistas, ao contrário do que as pessoas pensam, são certinhos nos pagamentos. E se empresários chineses começarem a comprar empresas do concelho?Ainda não aconteceu. O capital chinês tem vindo a tomar conta de sectores estratégicos do país como a electricidade. São situações normais do mercado e da economia. O que é que representam as urbanizações de luxo de Santo Estêvão para além dos negócios imobiliários?Tenho uma grande expectativa que a vertente do turismo de natureza possa neste mandato ter um desenvolvimento. Temos um potencial muito bom e associado às urbanizações em meio florestal, onde existem projectos turísticos. Temos três campos de golfe no concelho e é preciso criar condições para desenvolverem a actividade. Há depois outros projectos na fileira do cavalo. Temos o estuário do Tejo e uma charneca de grande dimensão. A complementaridade entre projectos que existem e os que pretendemos implementar serão fundamentais. E onde entram as urbanizações?As habitações estão em parcelas de dois hectares. Quem vem para aqui é também pela natureza. Foi uma aposta acertada e isto faz parte da complementaridade. Temos também algumas casas agrícolas que têm no contexto actual dificuldade em manter a sustentabilidade das explorações e esta vertente turística pode ser também importante para o seu futuro.Está na altura então de tirar rentabilidade.Chegou o momento do retorno. Agora é importante que para desenvolvermos estes processos tenhamos também uma visão regional e nacional. E não é o município por si só que tem condições para o promover e dinamizar, atendendo a que é necessário vender o produto. Estamos a desenvolver esse trabalho com a entidade regional de turismo. O turismo gastronómico, com a aposta que foi feita no cozido de carnes bravas, perdeu interesse?O projecto foi bem desenvolvido e esteve envolvida a Casa do Ribatejo. Foram lançadas boas bases. Há ainda alguns restaurantes com esta oferta e que têm muita procura mas é verdade que há empresários da restauração que não prosseguiram esse caminho porque o prato é muito exigente em termos de confecção. O projecto foi-se desvanecendo. A proximidade de Lisboa tem ajudado o concelho a desenvolver-se?Temos tido um crescimento de cerca de 500 habitantes por ano. É um crescimento controlado mas que foi feito para as zonas periféricas, aumentando os perímetros urbanos. As nossas zonas antigas foram ficando para trás e hoje temos espaços degradados. Como é que pretende chamar moradores para as zonas antigas?Através do processo de reabilitação urbana para o qual haverá fundos comunitários para requalificação urbana. Temos ideias para transformar algumas ruas do centro em espaços pedonais, criando condições para a existência de esplanadas e instalação do comércio tradicional. Pretendemos também, através da Sociedade de Reabilitação Urbana da Lezíria, recuperar casas degradadas. Há incentivos fiscais com reduções do IVA e isenções de taxas. Mas era também importante a disponibilização de linhas de crédito com juros baixos.Os inúmeros prédios que surgiram em Samora Correia descaracterizaram a freguesia?A densidade populacional que temos na freguesia é no máximo de 60 habitantes por hectare. É um valor reduzido. Também tenho ouvido críticas às questões da construção em Samora mas não é comparável ao que aconteceu na maioria dos municípios da Área Metropolitana de Lisboa, onde houve uma grande concentração de pessoas que não se conhecem umas às outras. Aqui ainda não se vive essa realidade. Oferecemos condições de vida que não existem na área de Lisboa.O presidente é de Samora Correia. Concorda que na freguesia há um bairrismo quase exacerbado?É importante cada um sentir uma grande identificação com a terra onde reside. Costumo dizer que quando vejo as placas da localidade fico com um estado de espírito diferente. Gosto muito da minha terra e o bairrismo é fundamental para a consolidação da comunidade. Mas o bairrismo não pode ser para estarmos contra alguém. Mas esse tipo de bairrismo existe.Essa questão tem-se diluído ao longo dos tempos. Era dos que defendia que a freguesia de Samora Correia devia ser concelho? Na década de 80 os partidos foram criando expectativas nas populações assumindo compromissos sem que estivessem devidamente enquadrados numa lei de ordenamento do território. Samora reunia na altura as condições para ser concelho. Em determinada altura isso esteve muito próximo de acontecer. Creio que até a própria câmara se preparou para isso. Benavente está mais próximo de Vila Franca mas relaciona-se mais com os outros municípios da Lezíria. Não há vantagem em trabalhar em parceria com Vila Franca?Há um processo histórico de identificação com a Lezíria através da comunidade intermunicipal. Trata-se de uma visão mais regional. Não queremos apenas olhar para o nosso espaço, as fronteiras de cada concelho. Na relação com a grande área do distrito de Lisboa, em que se inclui Vila Franca, só temos possibilidades de vingar se nos afirmarmos pela diferença. Só temos a ganhar mantendo a nossa identidade, raízes e cultura que está virada para a Lezíria do Tejo.O autarca que começou a trabalhar aos 15 anosCarlos Coutinho, 50 anos, nasceu em Samora Correia no seio de uma família humilde, de trabalho, e com ligações ao PCP. Partido no qual o actual presidente da Câmara de Benavente se filiou no ano 2000, três anos depois de ter entrado para o executivo da câmara. Foi convidado pelo então presidente António José Ganhão para integrar a lista da CDU (coligação do PCP com “Os Verdes”) à câmara em 1997. Assumiu desde logo a vice-presidência até às eleições do ano passado em que foi o cabeça de lista da coligação uma vez que Ganhão não se podia recandidatar por ter atingido o limite de mandatos. Antes de entrar na vida autárquica era bancário e quando foi convidado para a política fazia parte dos órgãos da Sociedade Filarmónica União Samorense. A transição para o cargo de presidente foi tranquila porque Coutinho teve vários pelouros e uma relação muita próxima com o ex-presidente que lhe permitiu obter um conhecimento profundo da gestão autárquica e do concelho. “Nunca me preocupei se iria substituir António José Ganhão. Havia da minha parte uma preparação e um conhecimento profundo da câmara e do concelho. Mas nunca fez parte dos meus objectivos lutar para ser presidente de câmara”, confessa. Considera-se uma pessoa fascinada pelo trabalho autárquico. Salienta que em 16 anos de vice-presidente nunca teve qualquer problema de relacionamento com António José Ganhão. Considera que agora é necessário manter um rigor e um rumo que tinha sido iniciado pelo seu antecessor. Com o qual ainda troca impressões sobre situações da câmara, até pelo facto de Ganhão ser o presidente da assembleia municipal. Os dois costumam fora da política encontrar-se com um grupo de amigos para à volta da mesa e dos petiscos conversarem e conviverem. Já tem este ritual há anos e considera que é fundamental para aliviar a pressão do trabalho e recarregar baterias. Carlos Coutinho começou a trabalhar aos 15 anos. Foi a primeira vez que saiu do concelho para prosseguir a vida. Trabalhou nos serviços administrativos de uma firma de montagem de linhas eléctricas em Lisboa. A segunda vez que saiu de Samora Correia foi quando iniciou o serviço militar obrigatório. Ingressou na Marinha de guerra e esteve 18 meses nos Açores num posto de rádio naval. Lembra que, com os colegas, constituíam uma pequena comunidade de dez elementos onde aprendeu muita coisa, valores da vida, e criou grandes laços de amizade. Esta experiência, diz, foi muito importante na sua vida. Quando entrou para a câmara uma coisa que o irritava era ser chamado de vereador de Samora Correia, numa altura em que havia uma grande rivalidade entre esta freguesia e a sede de concelho. Agora, salienta, as pessoas já não o vêem dessa forma e as duas localidades estão mais próximas. Carlos Coutinho, casado, tem três filhas. Uma de 15 anos e duas gémeas de 12 anos.A necessidade da Águas do Ribatejo ter uma maior proximidade com as populaçõesA câmara tem feito várias críticas à Águas do Ribatejo da qual faz parte e tem a vice-presidência. Não consegue fazer-se ouvir na administração?Benavente esteve sempre na primeira linha da construção desta empresa de capitais unicamente públicos. Mas sou presidente de câmara e tenho de defender a população. E tenho a noção de que algumas questões não correram bem porque as populações estavam habituadas a um serviço que antes era gerido pela autarquia com grande proximidade. Em que os problemas eram colocados e rapidamente resolvidos. Está a dizer que se perdeu a proximidade com os consumidores?Um pouco. As questões estão identificadas. Tanto que os municípios determinaram para este mandato a necessidade de uma maior proximidade da empresa com as populações, na comunicação e como prestador de um serviço que tem de obter a satisfação dos consumidores. As pessoas queixam-se do preço da água mas a culpa também foi das câmaras. Anteriormente os municípios suportavam com o orçamento municipal os custos da água. Quando há a transição para a empresa intermunicipal há um aumento da água que coincidiu com um período em que as pessoas começaram a sentir dificuldades económicas. Mas a Águas do Ribatejo não soube cuidar da sua imagem porque as pessoas estavam habituadas, por exemplo, nas intervenções no espaço público a que os buracos fossem rapidamente tapados quando passou a demorar semanas e às vezes meses. E a qualidade da água?Quando o serviço era da câmara colocávamos muito menos cloro do que os valores mínimos impostos. As entidades que regulam o sector sempre nos comunicaram os incumprimentos. A nossa água não tinha sabor a cloro. Com a passagem para a empresa as questões técnicas não estão dependentes do poder político e os técnicos têm de cumprir as normas. Isto levou a uma reacção da população de alguma rejeição à Águas do Ribatejo porque a água sabe mais a cloro. Mas devo dizer que em relação a outros é o projecto que melhor serve as populações e com muita qualidade. PDM vai avançar sem medidas de restrição do aeroporto e o Governo que se responsabilizeAcredita que o novo aeroporto, previsto para uma área do concelho, seja construído nos próximos 20 anos?Se fosse na Ota como estava inicialmente previsto servia perfeitamente. O facto de ter sido deslocalizado para a zona do nosso concelho tem que ser aproveitado. O que não queremos é que seja outra Ota. E não queremos que nos penalize como em muitos municípios da zona da Ota. Há necessidade de um novo aeroporto e ele irá ser construído mais tarde ou mais cedo num horizonte de 10 a 20 anos. O município tem-se queixado das restrições impostas na área prevista para o aeroporto. Não é necessário que se evite a construção na zona como garantia da instalação do equipamento?Há uma questão fundamental que é os direitos adquiridos por alguns promotores imobiliários. Não pode ser a câmara a garantir o ressarcimento dos prejuízos aos donos dos terrenos. Em determinada altura tentaram criar esse caminho mas deve ser o Governo a assumir isso. Esta questão tem entravado a revisão do Plano Director Municipal. Quando é que fecham o processo?Este processo tem sido vergonhoso e exemplifica bem o que é este país. Andamos há muitos anos com a revisão do PDM. Já assumimos que vamos avançar sem a situação das restrições e das compensações pela quebra de expectativas estarem definidas. Falta apenas acertar pormenores com a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional. A parte dos documentos e plantas está concluída. Se há restrições impostas pelo poder central elas deviam estar no PDM.Isso significava que Benavente assumia as responsabilidades. O Governo que as assuma. Temos que andar para a frente, não há outra hipótese. Finalmente o processo aproxima-se da sua conclusão e gostaria muito de entregar o plano para discussão pública no mês de Março. Até porque há pessoas que querem construir habitações, por exemplo para os filhos, em zonas que o PDM agora vai permitir. E isso é também uma forma de animar um pouco a economia local. Além da ampliação das zonas de actividades económicas para nos prepararmos para quando sairmos da crise.

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