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“Hoje a sede de conhecimento é pouca”

“Hoje a sede de conhecimento é pouca”

Maria Manuel Fernandes é a sub-directora do Agrupamento de Escolas Vale Aveiras

O sonho era ser advogada, mas a vida trocou-lhe as voltas e hoje já leva 34 anos de uma carreira plena de satisfação, 19 dos quais em Aveiras de Cima. Diz que os alunos não se concentram muito nas aulas porque acham que já sabem tudo. E confessa que começa a estar saturada da profissão por causa de alguns professores e pais que acham que só têm direitos.

Maria Manuel Fernandes, 61 anos, natural de Abrantes, é a sub-directora do Agrupamento de escolas Vale Aveiras. O seu plano inicial não era ser professora mas a vida trocou-lhe as voltas e hoje está grata por ter seguido a área que a leva todos os dias do Vale de Santarém, onde reside, até Aveiras de Cima (Azambuja), onde trabalha. “O carro já sabe o caminho e vale a pena. Tirei o curso quando vim de Angola, em 1980, em Santarém, na Escola Superior de Educação. Antes o meu objectivo era ser advogada. Em Angola não havia esse curso, vim para Lisboa, mas não me adaptei e regressei. Fui trabalhar para um banco, para o departamento que fazia os formulários. Aí aprendi, por exemplo, como fazer a grelha para os professores hoje, o que nos permite estar organizados. Deu-se o 25 de Abril e regressei. Colocou-se a hipótese de continuar cá no banco, mas seria no Algarve. Casei nessa altura, o meu marido estava a acabar engenharia no Porto e não quis ir para o Algarve”, explicou.Daí a ser professora acabou mesmo por ser uma questão de vocação. “Já havia um desejo. Fazia voluntariado na escola como professora nos bairros periféricos de Luanda. Sentia-me bem e satisfeita por acompanhar o crescimento de um indivíduo. Mantenho esse prazer ainda hoje. Tenho algumas aulas, introdução de programação no 1º ciclo, que é um projecto novo e estar com os miúdos faz-me falta. E estou a fazer coadjuvação em português e matemática ao 5º ano”, refere. Depois do curso concluído começou a carreira em Vila Nova de Famalicão e no ano seguinte seguiu para Vila Franca do Rosário, em Mafra. Só depois foi colocada em Vale do Brejo, Aveiras, onde está há 19 anos. “Acabei por ficar aqui, desenvolvi uma relação com as pessoas”, frisou.A satisfação com que aborda as funções nota-se nas palavras, tal como a forma frontal como encara cada desafio, mas confessa que ensinar está mais complicado. “Noto imensa diferença nos estudantes desde que comecei até agora. Antes era preciso dizer para se mexerem e falarem. Agora é o oposto. Apesar de aqui não termos indisciplina, temos uma forma de estar que não tem atitude, concentração. É um problema de sociedade. A sede de conhecimento é pouca, porque acham que já sabem tudo. O 25 de Abril trouxe muitas coisas boas, mas no ensino trouxe aquilo que as pessoas entendem como facilidade, que conduziu à desresponsabilização”, considera.Ao fim de 34 anos de serviço continua a afirmar que “o aluno é a principal prioridade”. No entanto, afirma-se já um pouco cansada. “Começo a estar saturada. Não dos alunos, mas sim dos professores e dos pais. Os professores hoje acham que só têm direitos e não deveres. O facto de sermos uma escola pública significa que não temos um patrão visível e como somos uma classe ainda corporativista, por vezes o interesse pessoal é o que prevalece. Os pais, até determinado momento não questionavam. A partir de determinada altura há os que se mantém assim, os que quando questionam têm razão e há outros que não têm outro conhecimento e acham que têm só direitos e que o que o professor diz hoje não presta”, lamenta.Casada, com duas filhas já com vida própria, Maria Manuel já pediu para se reformar, mas não só para ter tempo para as netas. “Quando me aposentar não será para parar, mas diminuir a intensidade, para ter o meu tempo de vida pessoal. Depois quero fazer voluntariado, gostava de o voltar a fazer no IPO, mas pode ser noutro local. Vou ter saudades”, admite.
“Hoje a sede de conhecimento é pouca”

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