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Uma campeã nacional de judo na política autárquica

Uma campeã nacional de judo na política autárquica

Helena Neves é vice-presidente da Câmara de Salvaterra de Magos. Helena Neves entrou pela primeira vez para a política autárquica nas eleições de 2013. Começou como vereadora e subiu a vice presidente com a saída de João Oliveira, a meio do mandato. Na juventude conquistou o título de campeã nacional de Judo.

Falta-lhe apresentar o trabalho de estágio para ter o curso de Zootecnia concluído. A vida encaminhou-a para o ensino e mais tarde para trabalhar com crianças com necessidades educativas especiais. Foi dirigente associativa durante vários anos e é professora de yoga. Nunca tinha pensado ser membro de um executivo municipal mas está a adorar a experiência, apesar de admitir que os dois primeiros anos não foram fáceis.


Como chega a vereadora da Câmara Municipal de Salvaterra de Magos? Venho de uma família que cultiva a democracia e que sempre participou na vida política local. O meu pai foi membro da assembleia municipal, a minha mãe fez parte de um executivo da Junta de Freguesia de Marinhais. O meu pai chegou a ser regedor. Em casa sempre se falou muito de política e isso ajudou a que eu entrasse no movimento associativo, onde estive vários anos. Nunca tinha pensado ingressar pela política. Quando o actual presidente Hélder Esménio me convidou a primeira reacção foi recusar, que era algo que não tinha a ver com a minha vida. Mas ele apanhou-me numa fase de mudança e conseguiu convencer-me (risos). Achei que poderia ser um novo desafio na minha vida.
Hoje sente que tomou a decisão correcta? É uma grande mudança e uma grande responsabilidade mas acredito que tomei a opção certa. É muito trabalho mas já estou habituada a isso e não me faz confusão trabalhar muito. Fico sempre com a sensação que não estou a fazer tudo o que quero mas fazendo as coisas que achamos que são as certas, com a consciência que estamos a dar o nosso melhor, e querer o melhor para a população, leva-me a crer que estou no caminho certo.
O cargo ocupa-lhe muito tempo? Os primeiros dois anos de mandato foram complicados porque é todo um processo novo em que temos que nos inteirar de tudo. Nunca trabalhei nesta área e perdi mais tempo a perceber os mecanismos. Apesar de ter muito trabalho defendo que quanto mais ocupados somos mais tempo temos para os outros. Quando gostamos daquilo que fazemos arranjamos sempre tempo para aqueles que nos são mais próximos. Os meus amigos e família ressentiram-se nos primeiros tempos de mandato mas faço questão de ter sempre disponibilidade para eles.
Foi dirigente associativa. É cada vez mais difícil recrutar pessoas para o movimento associativo? No concelho de Salvaterra de Magos, felizmente, isso ainda não acontece. Somos um concelho muito dinâmico nessa área, onde as pessoas demonstram vontade para trabalhar para a comunidade, para os outros. Temos mais de 90 associações a funcionar e são centenas de pessoas que estão por trás. Agora, a nível nacional, talvez a realidade seja outra, sobretudo nas grandes cidades, as pessoas parecem não demonstrar tanta disponibilidade como antigamente.
É a única mulher no executivo municipal de Salvaterra de Magos. Gostava de ter outra mulher para lhe fazer companhia ou trabalha bem com homens? Gosto de trabalhar com homens mas não me importo nada de trabalhar com mulheres. Sempre lidei muito com rapazes desde a infância. As casas em Marinhais eram todas muito perto umas das outras e como a minha mãe trabalhava por conta própria estava em casa e tomava conta dos outros meninos cujos pais iam trabalhar. Eram todos rapazes e por isso sempre brinquei muito com eles. Mais tarde, no judo, também a maioria eram rapazes. Trabalho muito bem com homens. Quando dei aulas trabalhei com muitas mulheres e também me dou muito bem. Somos seres humanos independentemente do género e da raça.
Foi dirigente da Rádio Marinhais. O que acha do facto das rádios locais tenham entrado numa fase de pouco fulgor? Quero acreditar que as coisas possam mudar e melhorar com a melhoria da conjuntura económica… As rádios locais são muito importantes para as comunidades. São uma companhia para quem está só e aproxima as pessoas. Isso é muito importante. Tudo o que possa ser feito para melhorar as condições das rádios locais deve ser apoiado porque são meios de comunicação importantes. Estive dois mandatos enquanto dirigente da Rádio Marinhais e foi uma experiência muito interessante. Ainda tentaram que fosse locutora mas não aceitei porque acho que não tenho uma boa voz para rádio.
O concelho tem ligações fortes com a tauromaquia. É uma defensora dessa tradição? A festa brava é uma tradição da nossa sociedade e que deve ser respeitada. Não é um espectáculo que me atraia mas adoro ver o trabalho que é feito com os cavalos, por exemplo. É uma tradição do nosso país, em particular da nossa região, que deve ser respeitada e deve manter-se.
Como é que interpreta a crescente preocupação com os animais? Sempre protegi os animais mas em todas as áreas deve haver peso, conta e medida. Qualquer área da nossa vida deve ser feita com equilíbrio e se todos nós respeitarmos os nossos limites já estamos a respeitar os limites dos outros e dos animais. Sou incapaz de fazer sofrer um ser, seja humano ou animal. Os animais também merecem o nosso respeito.
Estudou na Raret. Como vê aquele espaço que já foi emblemático e que está ao abandono? A última vez que entrei naquele espaço já estava fechado. A sensação foi de muita nostalgia, saudade e alguma tristeza por ver aquele espaço sem vida. Foi ali que tivemos as nossas bases de educação. Só percebi a importância de estudar na Raret quando fui para a universidade. Coisas pequenas como saber o que era um laboratório, um computador, por exemplo, e que os meus colegas na universidade só conheceram quando chegaram ao ensino superior. Foi uma escola de vida muito importante na formação dos alunos que por lá passaram.

É no yoga que encontra o seu equilíbrio

Helena Neves tem 48 anos e é natural de Marinhais, vila onde ainda reside. Começou a praticar judo apenas aos 16 anos e por causa da sua irmã mais nova. Isabel pediu aos pais para praticar esse desporto mas os pais, confiantes que a irmã mais velha não aceitaria, disseram que só podia ir se Helena também fosse. Helena trocou as voltas aos pais e aceitou. Foi assim que começou um percurso vitorioso numa modalidade muito masculina nos anos 80 do século passado. “Tenho uns pais espantosos que nos permitiram fazer tudo o que queríamos. Só em adulta é que tive a percepção das pressões sociais que os meus pais enfrentaram por eu e a minha irmã andarmos no judo, sobretudo porque quando estávamos na selecção nacional saímos sempre com rapazes e isso fazia confusão a algumas pessoas”, afirma.
O ponto alto da sua carreira desportiva foi quando alcançou o título de campeã nacional da modalidade. Garante que tal só foi possível com muito trabalho, esforço, persistência e um excelente treinador, Júlio Marcelino, de quem ainda hoje é amiga. Quando entrou para a Universidade de Évora para se licenciar em Zootecnia começou a tornar-se mais complicado conciliar os treinos com os estudos. Helena tinha que se deslocar a Lisboa todas as semanas para treinar. “Naquela altura não havia a facilidade de transportes que existe actualmente e Lisboa ficava muito longe de Évora. Optei por me concentrar na minha vida profissional que iria começar e deixei o judo quando estava a concluir a universidade”, conta a O MIRANTE.
A actual vice-presidente da Câmara de Salvaterra de Magos recorda que falta-lhe apenas apresentar o trabalho de estágio para ter o curso concluído. Não o fez porque a sua vida a encaminhou para outra direcção. Foi convidada a concorrer ao ensino e deu aulas de Ciências, Biologia e Saúde durante cerca de dez anos. Um episódio com um dos seus alunos marcou-a e voltou a mudar o rumo da sua vida. “Quando fui directora de uma turma tive um aluno com muitos problemas de aprendizagem. Depois de trabalhar com ele algum tempo percebi, com a ajuda de outras pessoas, que o menino tinha um elevado nível de surdez que nunca ninguém tinha percebido. Foi uma situação que mexeu muito comigo e a partir daí começou a estar muito presente na minha vida que há crianças que precisam de apoio e nós não conseguimos dar”, explica.
Como a sua irmã também estava ligada à área do ensino especial começou a nascer em ambas o desejo de abrir um espaço ligado a essa área e arriscaram. Abriram um centro de terapias em Santarém que acompanha crianças com necessidades educativas especiais. Helena gosta de projectos que a façam sentir feliz, por isso também aceitou o desafio de fazer parte da equipa da Saúde à Esquina, uma parafarmácia que também é uma clínica de bem-estar.
Depois do judo experimentou vários desportos até que descobriu o yoga e encontrou o equilíbrio e paz interior que tanto gosta. Actualmente é professora de yoga e quando foi convidada pelo presidente Hélder Esménio para fazer parte do executivo municipal a “única” exigência que fez foi continuar a dar as suas aulas de yoga na Universidade Sénior às segundas-feiras de manhã como voluntária. “O yoga é uma forma de estar na vida, uma forma de manter o equilíbrio espiritual, mental e físico. O yoga permite-nos sermos melhores para os outros. Acredito que se seguíssemos os ensinamentos do yoga o mundo seria um local melhor”, refere.
Apesar de já não praticar judo continua apaixonada pela modalidade ou não vivesse numa família de judocas. No dia da prova da judoca Telma Monteiro, nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro [Brasil] só foram para as Festas de Marinhais no final da atleta ter conquistado a medalha de bronze.

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