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“Considero-me uma guerreira ou não tivesse Lança no nome”
Maria Antónia Lança

“Considero-me uma guerreira ou não tivesse Lança no nome”

Maria Antónia Lança - A varredora que fazia versos - Santarém. Maria Antónia Lança ficou popular em Santarém como a varredora de ruas simpática e comunicativa e também pelas quadras populares que saem da sua cabeça e que gosta de partilhar. Nascida no Alentejo, e irmã da cantora Linda de Suza, teve uma infância difícil e agradece a Deus as oportunidades que lhe deu ao longo da vida.

A irmã Teolinda, mais conhecida por Linda de Suza, tornou-se famosa no final dos anos 70 do século XX graças à sua “mala de cartão”, canção icónica da diáspora portuguesa em França, mas a vida de Maria Antónia Lança também dava uma boa história para ser musicada e cantada. Nascida em Beringel, concelho e distrito de Beja, em 28 de Agosto de 1950, no seio de uma família de trabalhadores rurais, viveu uma infância difícil e esteve durante alguns anos, tal como a irmã Teolinda, aos cuidados da Misericórdia de Beja e da Misericórdia de Lisboa devido à doença da mãe. Outras irmãs mais velhas estiveram internadas em asilos ou foram servir em casas de famílias abastadas.
Maria Antónia é uma figura conhecida em Santarém há muitos anos. Ficou popular por ser a simpática e comunicativa varredora de ruas mas também pelas quadras que vão saindo da sua imaginação e que gosta de partilhar. Há cerca de 10 anos foi transferida para o serviço de atendimento aos visitantes na monumental Igreja da Graça. “Gosto de conviver com as pessoas. Conhece-se gente de todo o mundo”. Actualmente está de baixa, lutando contra um cancro, e determinada a vencer a batalha. “Considero-me uma guerreira, ou não tivesse Lança no nome”, diz com humor durante a conversa no seu apartamento, um sexto andar do periférico Bairro do Girão, com vista privilegiada sobre a cidade.
A mãe de Maria Antónia teve 11 filhos, mas três morreram nos primeiros anos de vida. Eram tempos em que a mortalidade infantil tinha uma dimensão assustadora. O pai queria um rapaz e só à sétima tentativa conseguiu: nasceu Manuel e com ele a irmã gémea que viria a chamar-se Maria Antónia. Ainda pequena, foi para Lisboa com a família. Só aos nove anos entrou na escola primária e nas férias aprendeu a manusear um tear com a irmã Teolinda. Mais tarde viria a ser tecedeira na Venda Nova, Amadora, zona onde residiu durante vários anos antes de vir para o Ribatejo. Foi aí que começou a trabalhar nos jardins, como funcionária da Câmara da Amadora.

“Nunca me senti amada pelos meus pais”
Maria Antónia recorda os pais como pessoas que souberam transmitir valores e princípios, mas também pouco dadas a grandes manifestações de afecto. “Nunca me senti amada pelos meus pais, mas antigamente as coisas eram assim, as pessoas não manifestavam os seus sentimentos”. Hoje diz que já ultrapassou isso e que os valores que lhe incutiram foram transmitidos aos seus descendentes.
Casada por duas vezes (ambos os maridos já faleceram), Maria Antónia tem cinco filhos (três homens e duas mulheres) e cinco netos, não escondendo orgulho na descendência. Foi mãe pela primeira vez aos 19 anos. Só um dos filhos vive em Santarém, cidade para onde veio morar em 1991 com o segundo marido, que era da Póvoa da Isenta.
Não arranjou logo emprego e aproveitou para estudar à noite. Fez o 5º e 6º anos na Escola Alexandre Herculano. Quando já estava a trabalhar no Serviço de Higiene e Limpeza da Câmara de Santarém, fez o 9º ano no Centro de Formação Agrícola de Almeirim, na Herdade dos Gagos.
A oportunidade de trabalhar para a Câmara de Santarém como varredora foi agarrada com o mesmo entusiasmo com que desempenhou outras tarefas ao longo da sua vida. Porque é uma mulher que não vira a cara à luta. “Nunca tive problemas em trabalhar e aceitei de bom grado. Foi quando comecei a varrer que comecei a escrever poemas. Agradeço muito a Deus as oportunidades que me deu, como a entrada para o quadro da Câmara de Santarém”, sublinha.
À beira da reforma, Maria Antónia Lança concentra-se agora no combate contra a doença. As sessões de quimioterapia deixam mossa, mas ela é uma mulher de antes quebrar do que torcer: “Tenho Lança no nome, não me deixo derrotar. E um dia quando tiver que partir partirei sem medo, porque ninguém cá fica para semente”.
No final, pedimos-lhe uma quadra para assinalar o aniversário de O MIRANTE.
Maria Antónia enviou-a um dia depois: “Parabéns ao meu Jornal / leio-o sempre com agrado / A competência é fundamental / O empenho de todos está confirmado!”.

“Considero-me uma guerreira ou não tivesse Lança no nome”

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