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Refugiado sírio corta barba e cabelo em Almeirim para recomeçar a vida longe da guerra
TRABALHO. Ahmad Salem apara a barba ao responsável da ProAbraçar

Refugiado sírio corta barba e cabelo em Almeirim para recomeçar a vida longe da guerra

Associação ProAbraçar montou uma barbearia social para Ahmad contribuir para a comunidade que o tem ajudado há quase cinco meses

Ahmad Salem, 36 anos, sírio, pega numa navalha de barba e faz pontaria no pescoço de Nelson Feijão, responsável da associação ProAbraçar, para lhe acertar a barba. O dirigente mostra-se com uma tranquilidade imperturbável e Ahmad começa calmamente a cortar-lhe os pelos, com perícia. É sábado de manhã, 10 de Dezembro, na barbearia social que a associação criou na sua sede na zona norte de Almeirim, na esquina da Rua Vinha do Santíssimo com a Praceta do Chapin, para o refugiado sírio se manter ocupado. A barbearia de preços baixos é uma forma de a associação angariar fundos e ao mesmo tempo ajudar Ahmad a manter uma ocupação profissional que já não tinha desde que fugiu da guerra.
A família de Ahmad Salem chegou a Almeirim em 29 de Julho e ao fim de quase cinco meses está integrada na comunidade. Com o sol da manhã a aquecer-lhe o rosto por barbear, conta, esboçando um rápido e tímido sorriso, que o autocarro dos transportes urbanos da cidade (TUA) não arranca sem ele chegar. Às vezes o motorista chega a esperar 12 minutos que Ahmad consiga despachar os três filhos, um menino de três anos e duas raparigas de seis e sete anos, para os levar à escola. E os passageiros não reclamam, interrompe Nelson Feijão, para explicar que a família foi muito bem acolhida e que as pessoas têm consciência das dificuldades que a família passou.
Ahmad era barbeiro na Síria. Tinha duas barbearias e ainda explorava um supermercado em Palmira, a maior cidade histórica do país, Património da Humanidade, que tem sido destruída no conflito entre o regime de Assad, apoiado pelos curdos sírios, e as forças dos radicais do Daesh, que tentam controlar o país. O barbeiro foi apanhado no fogo cruzado do conflito quando ajudava conterrâneos a fugirem da guerra, transportando-os numa camioneta. Foi torturado durante meses e quando se viu em liberdade fugiu do país com a família e com muitas sequelas no corpo e na memória. Ficou com problemas na coluna vertebral. Tentou trabalhar na agricultura em Almeirim mas não aguentou as dores.
O acolhimento foi tão bom que o sírio quer reconstruir a sua vida em Almeirim, tendo recusado o convite de familiares para se juntar a eles no Canadá. “A minha filha mais velha veio traumatizada pelos bombardeamentos, pela guerra, mas agora em Almeirim já a vejo a brincar e a rir. Acredito que aqui ela vai ultrapassar os traumas”, diz Ahmad, num Inglês básico que aprendeu durante o tempo que esteve num campo de refugiados na Grécia.
A esposa de Ahmad usa as vestes do país, em que se destaca o hijabe, uma espécie de lenço que cobre a cabeça, deixando apenas o rosto à mostra. “As pessoas podiam ficar intimidadas mas não se incomodam e tratam-nos bem”, refere o barbeiro, acrescentando que gosta dos portugueses e de viver em Almeirim. Consegue encontrar nos supermercados os alimentos necessários para fazer as comidas típicas sírias mas também já tem provado alguns pratos portugueses. Ahmad diz que adora as sopas de legumes portuguesas. Conquistado pela barriga agora falta deixar-se conquistar pela língua que está a tentar aprender.

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