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Conservadores por estarem bem conservados e com a capacidade de se rirem de si próprios

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José Fidalgo, professor no ISEC, e Luís Valente, advogado e vice-provedor da Misericórdia de Santarém

Encontraram-se à porta de O MIRANTE, apresentaram-se um ao outro e quando entraram para a conversa da série Duetos Improvisados já pareciam amigos de longa data. José Fidalgo, ex-presidente da Junta de Freguesia de Vila Franca de Xira, quando soube que Luís Valente era o único vereador da oposição (PSD) na Câmara de Vila Nova da Barquinha, dispôs-se a assessorá-lo nas eleições deste ano, garantindo-lhe a vitória, mas o convite foi recusado entre risadas. A sintonia entre ambos assenta numa forma descomplexada de encarar a vida e de aceitar mudanças.

José Fidalgo foi presidente da Junta de Freguesia de Vila Franca de Xira e actualmente, para além de dar aulas no ISEC - Instituto Superior de Educação e Ciências, é assessor no Centro de Estudos e Sondagens de Opinião da Universidade Católica Portuguesa. Luís Valente, advogado e vice-provedor da Misericórdia de Santarém, é vereador eleito pelo PSD na Câmara Municipal de Vila Nova da Barquinha e pertence aos órgãos sociais de organizações tão diversas como Fundação Rotária Portuguesa, a Associação dos Prestamistas de Portugal, a Federação Nacional das Associações de Feirantes, o CNEMA ou a Associação de Futebol de Santarém.
Em termos desportivos, José Fidalgo, corredor de 400 e 800 metros no Ferroviário de Moçambique, agora na situação de atleta aposentado, é sportinguista mas confessa que gosta mais de atletismo do que de futebol. Quanto a Luís Valente, que pratica pesca desportiva no Clube Amadores de Pesca de Abrantes, é benfiquista e vive os jogos de futebol do seu clube com paixão e emoção, sem ligar muito a tácticas, técnicas e outros pormenores.
Uma das partes da conversa de uma hora que decorreu nas instalações de
O MIRANTE e que foi marcada pela estreia de novas cadeiras para os convidados, foi sobre algumas experiências pessoais vividas na área desportiva. Luís Valente preferiu falar de esqui (ver caixa) em vez dos peixes que apanha em competição. O professor Fidalgo contou algumas peripécias em que se viu envolvido.
“Numa altura em que a minha irmã vivia em Samora Correia fui visitá-la e como a casa dela ficava ao pé do campo de futebol levei o meu filho, que na altura tinha 7 anos, a ver um jogo. Se me perguntarem que jogo era, não faço a mínima ideia. Era o Samora e eram outros. Acontece que no final houve confusão e como eu não era de Samora alguns mais exaltados atacaram-me. Fui insultado, agredido, veio a GNR e passei a maior vergonha da minha vida. Ainda por cima com a criança ali”, conta José Fidalgo.
Luís Valente reprova aqueles comportamentos e diz que paixão não tem nada a ver com elementos das claques a correrem escadas abaixo a ver se alguém cai para os outros caírem todos por cima. “Gosto de gritar pelo clube. Por vezes chamo nomes aos árbitros no calor do momento, mas não percebo aquelas atitudes” .
A notícia de O MIRANTE sobre uma família de Tomar que não recorre à Segurança Social para os tratamentos de uma criança deficiente, devido a atraso nos apoios e a muitas exigências a nível de papelada, optando por depender da solidariedade dos cidadãos, mereceu uma reflexão. José Fidalgo fala em “burrocracia” e Luís Valente defende que tem que haver cuidados quando está em causa o dinheiro público.
“Pedir tantos papéis, atestados e orçamentos não é burocracia. É ‘burrocracia’. É um problema que já vem do passado mas que não desapareceu após o 25 de Abril. Não há simplex para essas situações e devia haver. Tem que haver bom senso. Isto acontece porque o Estado desconfia dos cidadãos. A lei refere que o cidadão não precisa de fazer mais nada do que declarar pela sua honra que é verdade. E o Estado deve cumprir com isso. A primeira coisa a fazer é resolver o problema porque a ajuda só é ajuda quando chega a tempo. Aumentem a vigilância e a fiscalização mas acreditem nas pessoas”, defende o professor e ex-autarca.
Luís Valente defende celeridade mas diz que tem que haver “parcimónia” na administração do dinheiro público. “Quando alguém recebe um subsídio, deve cumprir alguns objectivos mínimos. Nós podemos aligeirar tudo mas há exigências que têm que existir, sob pena de se estar a esbanjar”, explica.
Os dois convidados de O MIRANTE usam o novo acordo ortográfico mas o caminho que fizeram até chegar à actual situação foi diverso. José Fidalgo era contra mas acabou por se render quando um colega professor lhe pediu para dar aulas sobre o Novo Acordo Ortográfico. “Comecei a estudá-lo para poder corresponder ao que me era pedido e agora sou um fã. E percebo melhor quem resiste à sua aplicação”, diz.
O advogado Luís Valente diz que nunca resistiu e que avançou intrepidamente pelas novas regras, sem medo de errar. “Vou andando e aprendendo. É uma questão de inspiração. Cometo erros ortográficos mas não me estava a ver parado, até porque aceito que a língua tem que ser uma coisa dinâmica”, diz a rir.
E o que dizem os dois sobre as promessas que se fazem na entrada de um novo ano? Aparentemente nenhum acredita na frase “ano novo, vida nova”. Luís Valente confessa que é normal fazer uma reflexão sobre o ano anterior mas nada mais que isso. José Fidalgo ironiza. “O ano passado foi muito mau para mim. Pensei que talvez com a mudança para o ano novo tudo seria maravilhoso. O que posso dizer é que até agora ainda não senti nada!”.

Atropelado por um esquiador que o abandonou na montanha sem lhe prestar assistência

Luís Valente estava a esquiar em Andorra e foi atropelado por um outro esquiador que descia a mesma encosta. O choque foi violento e quem ficou pior foi ele porque partiu uma perna ao bater numa zona rochosa. Quem o atropelou abandonou o local, deslizando pela neve a alta velocidade sem dizer uma palavra.
“Lembro-me que quando comecei a esquiar havia alguma ajuda. Se alguém caía as pessoas mais próximas prestavam-lhe assistência. Hoje é diferente. Muito diferente. Se alguém cai fica lá estatelado. Toda a gente passa e ninguém pára para ajudar. Nem sequer para perguntar se está tudo bem”, conta. “Devia ter-lhe tirado a matrícula mas não me ocorreu”, acrescenta a sorrir.
“O que passou comigo foi isso. Uma pessoa bateu-me e a minha perna rodou e partiu. A pessoa que me bateu não me ligou nenhuma. Ninguém bate em ninguém de propósito e aquela descida é muito íngreme e perigosa mas o mínimo que a pessoa poderia ter feito era perguntar-me se estava bem e se precisava de ajuda. Mas não. Levantou-se e foi-se embora sem uma palavra”.
Luís Valente já tinha feito aquela descida várias vezes e assim que tiver oportunidade vai voltar a fazê-la. “Vou regressar mas não é à procura de vingança. É para afastar o medo. Acho que a melhor forma de afastarmos os medos é conseguirmos de forma consciente enfrentá-los”, reflecte.

O aldrabão que falava “portuganhol” para um telefone que fazia pi...pi...pi...

Já lá vão mais de quarenta anos mas José Fidalgo ainda sente uma espécie de azia quando ouve pronunciar o nome Oliveira. “Foi um dos maiores aldrabões que encontrei. Lembro-me que usava um chapéu preto e um sobretudo da mesma cor cheio de caspa na gola. Era um solicitador à antiga que não estava registado como tal e que tratava de tudo. Ele apresentava-se como agente comercial”, lembra o ex-presidente da Junta de Freguesia de Vila Franca de Xira.
A história está relacionada com uma invenção como relata José Fidalgo. “Eu e os meus irmãos, numas brincadeiras lá na oficina, fizemos uns apoios para frigoríficos. O homem apareceu lá, disse que achava aquilo maravilhoso e predispôs-se a registar e comercializar o produto. Como não dominávamos aquelas burocracias aceitámos e eu fiquei de ir ao escritório dele para tratar dos pormenores.
Ele tinha escritório num terceiro andar nos Restauradores, em Lisboa. Cheguei lá e quando estava a acertar o negócio, toca o telefone. Ele atendeu e começou a falar espanhol com um alguém. Meu amigo Ramon para aqui, meu amigo Ramon para acolá, como se estivesse a falar da distribuição da nossa invenção em Espanha”.
Meio impressionado com aquilo, José Fidalgo ficou atento e ainda bem. “Eu tinha um ouvido muito apurado. Aproximei-me mais e descobri que ele estava a fazer de conta que falava com alguém mas que o telefone estava a dar sinal de chamada desligada. Uma aldrabice pegada. Disse-lhe o que tinha a dizer e fui-me embora. Felizmente ainda não lhe tínhamos pago nada.”

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