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Turismo de natureza

Há em Portugal um capital natural fabuloso e um mercado brutal à porta ávido do que só nós temos.

Para não variar o turismo continua na ordem do dia. Durante a semana passada decorreu a Bolsa de Turismo de Lisboa (BTL), o grande certame do setor em Portugal, e foi a oportunidade de sabermos mais sucessos desta galinha dos ovos de ouro. Claramente não embarco nesta euforia. Bem vistas as coisas, esta indústria de cada vez mais gente ir para mais longe, mais rapidamente e por menos, é um produto do nosso tempo com uma fatura de valor incalculável, inevitavelmente, a cobrar um dia, como sempre. Entretanto, andamos distraídos e contentes.
Também há poucos dias, na bonita e raiana terra do Alandroal, decorreu um encontro sobre turismo de natureza, segundo a própria organização realizado 20 anos depois do primeiro. Suspeito que a conversa terá sido muito semelhante. Todos os que por aqui vivemos neste interior o lamentamos mas, na verdade, mesmo que o presidente Ceia da Silva diga o contrário, não existe turismo de natureza estruturado em Portugal. É absurdo, mas é verdade. É absurdo, porque temos um potencial único na Europa e porque este é efetivamente o tipo de turismo que por todas as razões mais nos interessa - designadamente, porque é aquele que cria mais riqueza e é mais sustentável. As questões de base, eventualmente tocadas no Alandroal, estão longe de estarem resolvidas. Além disso, não existe uma opção estratégica do país nesta matéria. Se ouvirmos o “mais que todos” presidente do turismo do Tejo, Além e Riba, falar de turismo religioso, do sol e praia, golfe ou outra coisa qualquer, o discurso entusiasmado e enaltecedor é igual, apenas depende do palco e da hora do dia.
Não existe o produto “turismo de natureza” em Portugal. Pior, em Portugal na generalidade a natureza proíbe-se no literal sentido da expressão. Quando assim é, como pode haver turismo de natureza? Há, isso sim, iniciativas avulsas e pontuais que nada têm a ver com produto estruturado. Obviamente, como tudo em Portugal, salvo honrosas exceções. A natureza só faz sentido se for “exaustivamente” viva e vivida, mas em Portugal é problemático ter uma casa num parque natural e não se pode acampar na margem de um rio. Há em Portugal um capital natural fabuloso e um mercado brutal à porta ávido do que só nós temos (o mercado da Europa rica sem biodiversidade; como diz o nosso presidente do turismo, “igrejas e castelos todos têm e não é fator diferenciador”, digo eu: natureza não, temos nós). Todavia, andamos encantados com as hordas de turistas na Torre de Belém, Templo de Diana ou Portas do Sol que em 15 minutos despacham a coisa na melhor das hipóteses chupando um Olá. Como a moda está no andar a pé, no Alandroal falou-se do assunto comprovando o que afirmo. Na verdade, a apregoada “Grande Rota do Montado” é uma aberração que vai resultar em coisa nenhuma para além de gastar dinheiro. Ao contrário, ignoram-se os Caminhos de Santiago, a rota Vila Viçosa-Fátima (a ligação do santuário da padroeira de Portugal a Fátima) ou a rota da Romaria Moita-Viana do Alentejo, entre outras, onde tudo é óbvio e natural e nada necessita de ser (mal) inventado. Olhe-se aqui para o lado, Espanha, onde tudo é diferente para muito melhor com o exemplo, persistente de décadas, das Astúrias à cabeça. Por cá, há mais de dez anos, a Naturtejo, mostra como se faz.
Portugal igual a si próprio, pobre e contente.
Carlos Cupeto - Universidade de Évora

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