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“Sem estimular a criatividade estamos a formar uma geração de robôs”
Dário Duarte é um apaixonado por banda desenhada que vive na Póvoa de Santa Iria e é natural de Alverca

“Sem estimular a criatividade estamos a formar uma geração de robôs”

Dário Duarte é de Alverca e uma das referências nacionais da banda desenhada

Nas ruas de Alverca e Póvoa de Santa Iria Dário Duarte passa despercebido. Mas no mundo da banda desenhada todos o conhecem pelo nome artístico: Derradé. É considerado um dos nomes grandes da BD nacional que tem subido a pulso num mercado editoral que ainda é menosprezado pelos grandes livreiros. O ano passado venceu com Mário Cavaco o troféu de melhor publicação de humor da Central Comics.

As escolas estão a ocupar demasiado os alunos com trabalhos e tarefas e pouco tempo a estimular a criatividade e a arte. A opinião é de Dário Duarte, um nome popular na banda desenhada (BD) nacional que é de Alverca e vive na Póvoa de Santa Iria.
Tem três filhas, duas delas a estudar na Fundação CEBI de Alverca, entidade que diz “dar o exemplo” de como estimular a criatividade artística dos mais pequenos. “Mas nem sempre é assim nas outras escolas. Faz muita falta introduzir mais arte nas escolas. Os miúdos precisam de dar asas à sua criatividade, não se ganha nada em formar uma geração de robôs. Se a arte fosse mais apoiada nas escolas e não tão reprimida ganhávamos todos”, defende.
Dário Duarte tem 46 anos, é licenciado em matemáticas aplicadas e é informático de profissão. É esse trabalho que lhe paga as contas. Mas a sua paixão é a BD, à qual está ligado desde adolescente. O seu jeito para o desenho e o humor acutilante que coloca nas suas obras, inspiradas por eventos da sua adolescência em Alverca, têm-lhe granjeado um estatuto de culto entre os fãs da BD nacional.
Dá pelo nome artístico de Derradé – as iniciais do seu nome – e tem contado com a colaboração de Mário Cavaco [que assina como “Geral”] em alguns argumentos. O ano passado a dupla venceu o troféu de melhor publicação de humor da Central Comics e alcançou o segundo lugar na categoria de melhor argumento, com o livro “A Demanda do G”.
Tem onze álbuns editados, oito deles pela editora Polvo. “Na banda desenhada quem quer viver tem de trabalhar noutros empregos”, confessa a O MIRANTE. Não é ainda uma forma literária de venda massiva no país. “Ao contrário do que muita gente pensa a banda desenhada não é só para miúdos. É preciso romper com esse estigma. Neste momento temos muita BD de qualidade editada em Portugal e nunca como agora se editou tanto. Curiosamente na BD infantil encontramos menos obras, já procurei por exemplo os ‘Estrunfes’ para oferecer às minhas filhas e não encontro, só em segunda mão”, revela.
É do seu apartamento na Póvoa que Dário dá asas às suas histórias. Confessa que não se vê a trabalhar num grande estúdio, como a Marvel, a desenhar homens-aranha todos os dias. “Nunca tive ilusões sobre conseguir emprego ou ganhar a vida só desta área. É muito complicado. Hoje não me via a trabalhar numa Marvel. A menos que tal me desse oportunidade de ter tempo para depois trabalhar nos meus projectos pessoais, que é o que gosto. Desenho porque adoro isto, não o faço para ganhar dinheiro. Tenho o luxo de poder desenhar o que gosto e o que acho piada”, conta.

De fotocópia em fotocópia
As revistas brasileiras “Chiclete com Banana”, de Angelie e Laerte, foram – e ainda são – as grandes inspirações para os seus trabalhos. “Era essa a BD que me interessava fazer. Satírica, underground, alternativa. Foi esse o estilo que quis desenvolver”, conta.
As primeiras histórias de Dário foram desenhadas em folhas de papel que eram fotocopiadas e agrafadas à mão para depois serem vendidas pelas ruas e cafés de Alverca.
Ainda vendeu umas centenas até um dia ter ido para a porta do festival internacional de banda desenhada da Amadora dar a conhecer o seu traço e ser logo desafiado para publicar. “No CartoonXira gostava também que se desse espaço à banda desenhada, era merecido. Curiosamente o cartoon e a BD apesar de serem parentes raramente se tocam”, confessa.
A sua última história, “A demanda do G”, fala da crise criativa do líder de uma banda que foge de casa, abandona toda a gente e vai para o sul de Espanha à procura de um objecto mítico que lhe dê inspiração para continuar a carreira. O seu próximo trabalho deverá chegar à estampa no próximo ano e será focado numa loja de banda desenhada em Alverca. “Gostava de ter uma loja de banda desenhada mas como não consigo vou inventar uma”, conta com um sorriso.

“Gostava de ver Alverca culturalmente mais activa”

Dário Duarte diz a brincar que Alverca não lhe dá vontade de rir mas que, “felizmente”, também já não dá para chorar. “Gostava de ver a cidade culturalmente mais activa, com mais espectáculos, mais bandas. A minha geração teve bandas de garagem às dezenas. Parece que depois disso as coisas morreram um bocado”, critica.
No primeiro ano em que deu autógrafos não esquece o estranho pedido de um leitor que, ao invés do seu nome, pediu para Dário desenhar um cavalo com óculos escuros. “Foi estranho mas lá desenhei e o rapaz foi embora contente”, recorda com um sorriso. Nos tempos livres adora ler biografias. Actualmente está a ler uma de John Bellucci, escrita por Bob Woodward.
“Quem não lê BD está a perder uma forma literária e gráfica única, das maiores já criadas no século XX. É a melhor arte de todas porque junta literatura com imagem para deixar que o leitor conjugue tudo na sua cabeça, numa linguagem que nem o cinema consegue adaptar”, conclui.

“Sem estimular a criatividade estamos a formar uma geração de robôs”

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